Depois de colecionar declarações que só aumentaram a resistência política a seus projetos, como a fala que comparou funcionários públicos a parasitas ou a desastrada máxima sobre as empregadas domésticas viajando para a Disneylândia, o ministro da Economia, Paulo Guedes foi afagado pelo presidente Jair Bolsonaro. O mandatário da República classificou as caneladas como ‘pequenos deslizes’, mas cravou a permanência de Guedes no governo até o último dia do mandato. “Se Paulo Guedes tem alguns problemas pontuais como todos nós temos, e ele sofre ataques, é muito mais pela sua competência do que [por] possíveis pequenos deslizes. E eu já cometi muitos, muitos no passado”, reconheceu Bolsonaro, em cerimônia no Palácio do Planalto nesta terça-feira, 18. “O Paulo Guedes não pediu para sair. Aliás, eu tenho certeza que, assim como ele é um dos poucos que eu conheci antes das eleições, ele vai continuar conosco até o nosso último dia”, completou o presidente.
Paulo Guedes, porém, está cansado — e os destemperos recentes provam isso. Vindo da iniciativa privada, o ministro não está acostumado com a série de pressões e conchavos políticos, muito menos com a repercussão de qualquer declaração dada por ele. A última frustração do ministro envolve a reforma administrativa. Sua equipe, capitaneada pelo secretário de Desburocratização, Paulo Uebel, já concluiu o texto e enviou para o Palácio do Planalto. Nesta segunda-feira, Bolsonaro disse que seria apresentado à versão final e tentou minimizar a reação do funcionalismo público, prevendo a resistência política de uma classe amplamente organizada e barulhenta. “Estamos na iminência de mandar a reforma administrativa. Não vai atingir os já servidores. Não vai ser mexido nada no tocante a eles. A reforma está ultimando, né? Sempre tem um pequeno acerto a mais para fazer. Amanhã, a previsão é, à tarde, eu ser apresentado à nova proposta”, afirmou o presidente. Segundo membros do governo, Bolsonaro espera o “melhor timing” para apresentar o texto ao Congresso. Segundo um dos assessores mais próximos do ministro, as reuniões sobre a reforma que Guedes teve com Bolsonaro na segunda, 17, e nesta terça, 18, foram “inconclusivas” — ou seja, não chegaram a lugar algum.
Mas o desgaste não é de hoje. O ministro vem frustrando-se, cada dia mais, com as dificuldades de avançar com sua agenda no Congresso. Antes do travar da reforma administrativa, outra dificuldade foi a de emplacar seu projeto de reforma tributária, sob a tutela do então secretário de Receita, Marcos Cintra. Como Cintra revelou em entrevista a VEJA, Guedes não desistiu e, segundo membros do alto escalão do ministério, não desistirá de instituir um novo imposto sobre movimentações financeiras, um simulacro da CPMF, extinta e rechaçada pelo Congresso. A solução encontrada pela equipe deixou Guedes ressabiado: o governo enviará uma proposta insossa por meio de emendas apresentadas na comissão mista que discute as alterações tributárias. As adições ao texto que tramita na Câmara preveem, apenas, a união do PIS e do Cofins. A criação de um “imposto do pecado”, também em pauta dentro do Ministério da Economia, já foi rebatida por Bolsonaro. A ideia envolvia criar uma taxa para produtos nocivos à saúde pública, como cigarros, bebidas alcoólicas e combustíveis.
Ainda no ano passado, sob a pressão de se aprovar a reforma da Previdência, Guedes mostrou insatisfação com as dificuldades de avançar nas negociações com a classe política. Em entrevista a VEJA em maio passado, ele disse que, se houvesse uma mudança muito radical na proposta original da reforma, se aprovassem uma espécie de remendo chamado jocosamente de “reforminha”, ele renunciaria ao cargo. “Pego um avião e vou morar lá fora”, avisou. “Já tenho idade para me aposentar”. A solução para driblar o Congresso foi apresentada meses depois. Em dezembro, a revista se debruçou em como Guedes evitava o Legislativo para implementar microrreformas e diminuir o tamanho do Estado, além de promover políticas para estimular contratações e digitalizar o poder público.
Grandes reformas, porém, precisam do Legislativo. A promoção de Rogério Marinho para o cargo de ministro do Desenvolvimento Regional envolve o périplo do governo Bolsonaro para melhorar suas relações com o Congresso — o então secretário de Previdência foi primordial para a aprovação das alterações previdenciárias serem aprovadas. Guedes é o norte técnico, mas tem falhado nesta função. Ao não conseguir se manter com esta aura de “fiador” de um governo atabalhoado, perde em muito sua eficácia. O ministro, que dá sinais inegáveis de esgotamento, precisa se reencontrar e aprender a dialogar com a classe política.
(Com Reuters)