Se o Banco Central é independente — e a política monetária adotada pela instituição, desvinculada ao Poder Executivo —, não cabe ao ministro Paulo Guedes comentar o câmbio. Ao comemorar as altas cotações do dólar e ironizar que “empregadas domésticas iam pra Disneylândia”, o ministro elevou o nervosismo do mercado financeiro, fazendo o real perder valor. “A festa”, como disse o ministro, passou a ser de especuladores que apostaram na derrocada da moeda brasileira.
Deu no que deu. O mercado acordou tensionado — ao contrário do que defendeu o ministro no palavrório — nesta quinta-feira, 13. Aliado ao cenário internacional, o lamentável posicionamento impulsionou as cotações do dólar para um novo recorde nominal, e a moeda americana atingiu o patamar de 4,38 reais. “As más notícias sobre o coronavírus na China de ontem, os resultados aquém do esperado da balança comercial em dezembro e o ministro falando besteira fizeram o mercado ficar nervoso”, avalia o diretor de câmbio da Ourominas, Mauriciano Cavalcanti.
Embora o ministro tenha minimizado a cotação do dólar e elencado que o cenário é o “novo normal”, o Banco Central parece não ter a mesma leitura. A instituição anunciou um leilão da moeda americana para esta quinta para controlar a alta. Momentaneamente, ajudou. A variação inverteu e a moeda americana passou a cair em relação ao real. Às 11h30, estava cotada a 4,31 reais.
Em novembro, VEJA vaticinou o novo cenário e explicou as intenções do governo ao manter o dólar valorizado. O plano de Guedes é manter o dólar mais caro e a Selic mais baixa por um período longo. Isso vai estimular investimentos em infraestrutura e dar fôlego às indústrias exportadoras. Com esse arranjo, o governo pretende que os especuladores internacionais que hoje operam no mercado deem lugar a investidores interessados em aplicar recursos em infraestrutura, produção de bens e no setor de serviços. Porém, acontece justamente o contrário quando Guedes envereda por falar sobre algo que não é de sua alçada, apesar de comandar a equipe econômica.
Sorte que está na gaveta do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o projeto que concede autonomia ao Banco Central. Apesar de falas — principalmente as infelizes — de autoridades sempre influenciarem o câmbio, a proposta que fixa mandatos temporais e descola a instituição do poder público promete arrefecer a ingerência de membros do governo na flutuação do câmbio. E, quem sabe, com maior liberdade, a instituição comandada por Roberto Campos Neto adote as políticas necessárias para que o país seja um ambiente fértil para investimentos e possibilite o crescimento robusto. Além de permitir, claro, como um país que se prevê rico e parte do clube de nações desenvolvidas, que quem quer que seja viaje para onde bem entender.