Um passe de mágica
'O Menino que Queria Ser Rei', uma aventura que compreende quão assustadora e fabulosa pode ser a infância
Alex (Louis Ashbourne Serkis) tem 12 anos mas já percebeu que adultos raramente são parte da solução dos problemas, e frequentemente constituem sua causa. Na escola (a caminho da qual, nas bancas de jornal, as manchetes anunciam que o mundo vai de mal a pior), ele e o amigo Bedders (Dean Chaumoo) enfrentam os abusos de duas crianças mais velhas. Com o rosto sangrando, Alex vai parar na sala da diretora, que aconselha resignação. Em casa, a mãe não entende que dar nome aos agressores é garantia de que eles redobrem a violência. Alex acredita que seu pai compreenderia essa regra. Não fosse o fato, claro, de ele ter dado no pé anos antes. Não existe mágica que resolva uma situação como essa. Ou existe? Quando Alex puxa uma velha espada de uma pedra numa construção abandonada, ele põe em marcha uma história antiga, e sempre nova: a de que alguma força, no universo, recompensa e também sobrecarrega os corações puros com uma missão especial.
O inglês Joe Cornish lançou-se em 2011 com o cult Ataque ao Prédio, sobre uma gangue adolescente que repele uma invasão alienígena no bairro londrino de Brixton. Agora, em O Menino que Queria Ser Rei (The Kid Who Would Be King, Inglaterra/Estados Unidos, 2019), que estreia no país nesta quinta-feira, ele reprisa sua alquimia original entre fantasia e realismo: Alex é o rei Arthur redivivo e, como ele, tem de unir inimigos e curar uma nação — ou um mundo, dada a globalização — em convulsão. Filho do ator Andy Serkis, Louis personifica a coragem leonina sob a doçura, e cumpre sua saga na companhia de um elenco ótimo — com realce para o delicioso Angus Imrie como o jovem mago Merlin. Acima de tudo, Cornish reconhece a aventura terrível, excitante e misteriosa que é a infância, tão oprimida pela regência inepta dos adultos e ainda assim tão plena de esperança.
Publicado em VEJA de 30 de janeiro de 2019, edição nº 2619