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Jorge Mautner, entre a crítica e a esperança com o Brasil

Músico carioca lançou nesta sexta-feira seu primeiro disco de inéditas desde 'Revirão', de 2006, com canções sobre Marielle Franco e Jesus de Nazaré

Por Erich Mafra
Atualizado em 12 ago 2019, 21h49 - Publicado em 12 abr 2019, 17h40

Após treze anos sem um disco de inéditas, o cantor e compositor Jorge Mautner, 78, lançou nesta sexta-feira, 12, Não Há Abismo em Que o Brasil Caiba, batizado com a frase do filósofo português Agostinho da Silva. As composições do trabalho colocam a multiplicidade do país em discussão em irreverentes letras de Mautner, autor de sucessos como Maracatu Atômico e O Vampiro. Cada música expõe um recorte do Brasil, tanto sob olhar crítico quanto esperançoso.

Na faixa que leva o nome de Marielle Franco, executada a tiros há um ano, Mautner fala sobre acabar com o “medonho cancro” que vitimou a vereadora carioca e Anderson Gomes, seu motorista. “Quando ouvi a notícia do assassinato de Marielle, estava com os músicos (da banda Tono, formada por Ana Cláudia Lomelino, Bem Gil, Bruno di Lullo e Rafael Rocha, com quem fez parceria para o novo álbum) e fiz imediatamente a música e a letra em um rompante de indignação. Foi uma comoção brutal”, diz em entrevista a VEJA.

Na música Bang Bang, Mautner trata daquilo que chama de sua “maior preocupação” com o país atualmente, a segunda abolição dos escravos, ideia preconizada por Joaquim Nabuco que defendia que as estruturas sociais foram criadas de acordo com o modelo da escravidão. “É tristeza em tom absoluto. Parece que ninguém se lembra de Joaquim Nabuco”, diz, na canção.

Mas Mautner também traz o amor como tônica em diversas faixas – amor à sua família e ao Brasil. Em Ruth Rainha Cigana, escrita para homenagear sua companheira de 50 anos, o músico canta apaixonadamente sobre o casamento, a filha do casal e a neta. Já a canção Ouro e Prata mostra um pouco do otimismo que tem no planeta. “E será de alegria… a chegada da arca da aliança. Quando todos se darão as mãos e serão irmãos e irmãs”, diz a letra. “Sempre me lembro da frase de São Paulo: mesmo quando não houver mais nem fé, nem esperança, o amor continuará a resplandecer no universo”, reflete.

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Nas faixas mais esperançosas, o disco aborda também os diferentes aspectos da cultura e religiosidade brasileiras – há referências ao Candomblé, o Judaísmo e o Cristianismo. “A intolerância religiosa está sempre aí”, afirma o músico. “Martin Heidegger, no início da década de 1950, disse: através da cibernética, viveremos num planeta em que todos serão controlados e controladores. Nelson Jacobina ria e dizia: que nada, vão ser descontrolados e descontroladores. Ele estava com a razão. Ódios que se limitavam a grupos, a indivíduos, agora são irradiados 25 horas por dia pela cibernética, pela internet, pelos celulares.”

Amigo e parceiro de trabalho de longa data de Mautner, Nelson Jacobina, a quem o músico dedica o novo álbum, morreu em 2012, em decorrência de um câncer no pulmão. “Quando comecei a trabalhar com Jacobina, ele tinha 16 anos e eu já tinha mais de 30. A arte entrelaça as gerações”, diz o cantor, que agora se une a Bem Gil, filho de Gilberto Gil, 44 anos mais novo do que ele e responsável pelo convite para um disco de inéditas. “Gilberto Gil é meu irmão desde 1968. Eu pertenço à família dele e ele à minha.”

Mautner se junta à banda Tono para os shows de lançamento de Não Há Abismo em Que o Brasil Caiba, marcados para o dia 23 de abril, no Rio de Janeiro, no NET Rio, e 1º e 2 de maio, em São Paulo, no Sesc 24 de maio. O álbum foi lançado em plataformas digitais, mas também será lançado em mídias físicas – vinil pela Noize Record Club e CD pela Deck.

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