Último mês: Veja por apenas 4,00/mês
Continua após publicidade

“É desafio viver de arte no Brasil”, diz ex-bombeiro que brilha em Veneza

Dalton Paula trocou o emprego pelos pincéis — e hoje é destaque na Bienal de Veneza

Por Mariana Carneiro Atualizado em 3 jun 2024, 16h38 - Publicado em 27 abr 2024, 08h00

Muitos artistas no nosso país precisam ter duas, três, quatro, cinco profissões para obter sustento, e isso mostra como é um desafio enorme viver disso no Brasil. Comigo não foi diferente. Trabalhei como bombeiro militar por quase uma década, época em que conciliei o emprego fixo com a pintura, minha verdadeira paixão. Com muito esforço, consegui vencer os obstáculos e hoje sou um dos convidados na Bienal de Arte de Veneza, uma mostra de grande prestígio internacional, onde exponho uma série de retratos. Mas o início não foi simples.

Nasci em Brasília, mas prefiro dizer que sou um artista goianiense. Mudei para a capital de Goiás com minha família ainda na infância, quando minha mãe, funcionária pública, passou em um concurso na cidade. E foi em Goiânia que me tornei artista. Eu adorava histórias em quadrinhos e copiava os desenhos de Os Cavaleiros do Zodíaco usando papel-carbono, para depois pintá-los com lápis de cor. Já que os gibis eram em preto e branco, a escolha das cores ficava totalmente em minhas mãos, brincadeira que eu adorava. Logo mais, na adolescência, tratei de iniciar meus estudos sobre pintura. A convite da mãe de um amigo, entrei aos 14 anos na Escola de Artes Visuais de Goiás, instituto público de formação que funcionava junto com o Museu de Arte Contemporânea da capital. Lá, além de me aprofundar na pintura, tive contato com a fotografia e a performance, técnicas que mexeram muito com a minha cabeça. Frequentar aquele espaço foi o que despertou minha ideia de viver da minha criatividade.

O próximo passo para realizar esse sonho foi cursar artes visuais na Universidade Federal de Goiás. Vendia minhas obras por preços baixos a quem se interessasse, para conseguir comprar mais material e continuar produzindo. Para custear as despesas e permanecer nos estudos, prestei um concurso público, e foi assim que me tornei bombeiro. Além de um segundo emprego, o quartel foi como uma segunda escola para mim. Eu frequentava a faculdade pela manhã e, no restante do dia, me dedicava ao resgate de vítimas de acidentes e incêndios. Aprendi muito sobre cuidar das pessoas no tempo em que passei em hospitais, e até hoje a experiência se reflete na minha arte. Lido muito com a questão da cautela e do respeito com os outros quando estou pintando. Penso sempre em como esses personagens gostariam de ser representados, quais roupas gostariam de vestir e em qual contexto social eles estão inseridos. Nas minhas telas, busco evidenciar as pessoas negras, que são maioria no Brasil, mas quase não aparecem nos museus.

Em 2016, enquanto ainda equilibrava a profissão de artista com a de bombeiro, fui convidado para expor na Bienal de Arte de São Paulo. Naquele momento, uma voz ecoou na minha cabeça: “Do que mais você precisa para acreditar que a arte é seu caminho?”. O país estava numa crise política, e eu sabia que o desafio de viver de arte era uma constante. Então, eu me arrisquei. Foi um baita gesto de coragem largar o Corpo de Bombeiros e abraçar de vez a outra carreira. Me agarrei ao pensamento de que, se eu dedicasse toda minha energia àquilo, as portas iriam se abrir. E, por sorte, elas realmente se abriram. A venda dos meus trabalhos na Bienal foi um sucesso, e desde então eu posso dizer que, sim, vivo de arte.

Continua após a publicidade

Para chegar aonde estou, fui muito ajudado. Uma pessoa que me acolheu foi a Rosana Paulino, minha madrinha na arte. Ela sempre dizia: “Quando você tiver condições, vai passar essa história adiante”. E é o que busco fazer. Fundei o Sertão Negro, ateliê e escola de artes em Goiânia, com o objetivo de apoiar novos talentos. Ser artista vai além de pintar: é preciso deixar contribuições para o mundo.

Dalton Paula em depoimento dado a Mariana Carneiro

Publicado em VEJA de 26 de abril de 2024, edição nº 2890

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Veja e Vote.

A síntese sempre atualizada de tudo que acontece nas Eleições 2024.

OFERTA
VEJA E VOTE

Digital Veja e Vote
Digital Veja e Vote

Acesso ilimitado aos sites, apps, edições digitais e acervos de todas as marcas Abril

1 Mês por 4,00

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 12,50 por revista)

a partir de 49,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.