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Diretor de ‘Fogo no Mar’ vai ao Oriente Médio em novo documentário

Após concorrer ao Oscar com produção sobre refugiados na Itália, cineasta passou três anos em zonas de guerra para registrar origem da crise

Por Lucas Almeida, de Veneza
Atualizado em 11 set 2020, 11h40 - Publicado em 11 set 2020, 11h36
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  • O cineasta italiano Gianfranco Rosi passou o ano de 2016 viajando pelo mundo para promover Fogo No Mar. O elogiado documentário, que mostrava a vida dos moradores de Lampedusa, ilha italiana que virou porta de entrada para refugiados, chegou a concorrer ao Oscar no ano seguinte. O diretor descreve como “natural” os seus passos seguintes: Rosi passou três anos viajando nos limites entre Líbia, Iraque, Curdistão e Síria para o que se tornaria o seu novo projeto, o documentário Notturno. “Queria atravessar a água e ver de onde a tragédia vinha”, ele explica a VEJA.

    O longa, que estreou no Festival de Cinema de Veneza com direito a dez minutos de aplausos, acompanha a vida cotidiana de moradores da região no Oriente Médio. “Filmes de guerra mostram as cenas violentas, mas a realidade é a vida do dia a dia de quem vive nessa fronteira entre a vida e a morte”, ele comenta.

    A produção não se preocupa em mostrar o país em que está cada personagem ou até mesmo o nome de todos eles. O cineasta decidiu por deixar um “senso de deslocamento na produção”, como ele mesmo descreve .Todas as oito histórias apresentadas foram gravadas em pontos de conflitos importantes, como Raqqa (na Síria) e Bagdá, a capital Iraquiana.

    Assim como Fogo no Mar, Notturno conta com poucos diálogos. Em grande parte dos cem minutos de filme, a câmera acompanha cada personagem em silêncio, fazendo as suas atividades comuns, como um homem que caça patos em um lago ou um jovem que se oferece para ajudar pescadores e caçadores, como principal forma de sustento da família.

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    Cena do documentário ‘Notturno’, do cineasta Gianfranco Rosi (//Divulgação)
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    Os silêncios são acompanhados de uma estética detalhista, com uma iluminação que valoriza as expressões de cada personagem, seja na casa de uma família ou em um lago durante à noite. “As pessoas falam que eu fico invisível quando estou gravando. É o contrário. Estou sempre com uma câmera imensa, microfone e outros equipamentos. E quando escolho um enquadramento, ainda tenho que esperar pela luz certa. Devo perder 90% de tudo o que eu vejo por esse processo”, o diretor comenta.

    O cineasta chegou para a entrevista com VEJA em um clube de tênis no Lido de Veneza usando um terno azul-marinho. “Essa é a parte mais difícil do meu trabalho. Mas me força a elaborar sobre o meu filme, tomar distância do que eu estava fazendo por três anos”, ele comentou enquanto sentava para a conversa, que interrompeu em dois momentos: para reclamar do barulho do clube e pedir para que um fotógrafo saísse, porque os cliques o distraíam.

    Apesar de orgulhoso do novo longa, Rosi diz estar cansado. “Talvez esse seja o meu último projeto. Esse filme me tirou muita energia. Meu colesterol está péssimo, porque eu só comi carne por três anos.”

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    O italiano ainda conta que passou por um momento de tensão, durante gravações em Bassora, no sul do Iraque. “Todos falaram que eu deveria ficar no máximo três dias lá, porque era uma região com muitos sequestradores. É claro que fiquei um mês”, ele explica bem-humorado. A equipe estava gravando em um lago durante à noite, quando um homem que os acompanhava avisou para desligarem as luzes e ficarem em silêncio.

    “Entendemos imediatamente e ficamos escondidos. Um barco de homens com máscara passou perguntando se tinham visto a embarcação com turistas”, ele relata. “Tivemos que deixar a nossa canoa e andar com a água no pescoço, até conseguirmos ligar para a polícia. Mas ficamos muito próximos de sermos sequestrados”

    O documentarista italiano Gianfranco Rossi, apresentou o filme 'Fuocoammare'
    Cena de ‘Fogo no Mar’, documentário do italiano Gianfranco Rossi indicado ao Oscar: a vida de uma comunidade italiana porto comum de refugiados (VEJA.com/Divulgação)
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    Para Notturno, o cineasta passou oito meses no Oriente Médio sem câmeras, apenas pesquisando lugares e conhecendo possíveis personagens. “Preciso desse tempo para que a pessoa que vou gravar aceite o fato de que, por um período, serei parte da vida dela”, o diretor explica.

    Mesmo assim, Rosi ainda define o processo de gravação como “doloroso”. “Odeio filmar! Não sei como a pessoa vai reagir quando eu coloco a câmera na frente dela. Fico sempre muito ansioso”, ele reclama em inglês com o seu sotaque italiano.

    No início, o diretor queria gravar todo o documentário durante a noite (daí surgiu o nome Notturno). “A escuridão esconde as coisas. Um graveto pode ser uma cobra. Mas aos poucos, a sua visão se adapta à pouca luz”, ele explica. Quando ele entendeu que teria que gravar durante o dia, para mostrar o cotidiano dos personagens, se limitou aos dias nublados, para fugir da retratação comum do clima quente e seco no Oriente Médio. “Tive que esperar por esses dias por muito tempo. Por mim, foi ótimo. Já disse que odeio filmar”, ele brinca.

     

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