Banksy zomba do mercado, da crítica e expõe a busca desenfreada pela novidade, onde os critérios se tornam elásticos, tanto quanto o valor das peças.
Publicidade
‘De assalto’ é uma boa expressão para resumir o modo como o britânico Banksy, 35, compõe/expõe o seu trabalho. Um dos mais produtivos artistas contemporâneos, cuja identidade é desconhecida, alçou a arte de rua ao patamar das concorridas galerias de artes americanas e europeias com talento, provocação política, senso de humor apurado e acima de tudo a capacidade de usar a mídia ao seu favor.
Usando técnicas de stencil, pichação e grafite nas suas intervenções, ele situa a própria arte de desconstrução ideologizada de ícones pop nalgum ponto entre Andy Warhol e a guerrilha. Uma paisagem fictícia no muro que separa Israel e a Palestina e a estátua de um prisioneiro da base militar de Guantánamo enforcado no meio de um parque da Disney são alguns exemplos dos limites que ele já ultrapassou.
Protestando com uma mão e arrecadando milhares de dólares com a venda de suas obras com a outra, Banksy se tornou um coringa moderno. Nada escapa ao seu olhar crítico, da mesma forma que é impossível se manter desatento ao trabalho que ele já realizou em quase vinte países, em quatro continentes.
Com o documentário Exit Trough The Gift Shop (algo como Saia Pela Loja de Souvenirs), Banksy dá um passo adiante ao manter a aura em torno de sua misteriosa identidade, zombar de artistas contemporâneos, do tênue limite entre o que é arte e o que é embuste, e demonstrar sem cerimônia o quão manipulável são a crítica e o mercado. É, como de costume, uma jogada de mestre.
A história de Exit começa com o videomaker francês Thierry Guetta que, radicado em Los Angeles, é viciado em filmar absolutamente tudo que se passa ao seu redor. Por intermédio de um primo, Guetta se infiltra no mundo dos artistas de rua e filmá-los enquanto trabalham passa a ser a sua grande obsessão.
Por um golpe desses que alguns creditam ao destino, mas com Banksy nunca se sabe tratar-se da verdade, em viagem de trabalho ao Estados Unidos ele precisou de ajuda logística e foi apresentado a Guetta, conhecedor dos melhores muros, becos e ruelas para serem grafitados. Deu-se a amizade e a idéia não muito lapidada de fazer um documentário sobre o britânico.
É pelas mãos de Banksy, um exímio manipulador, que o jogo vira. Guetta deixa de ser o diretor e se torna personagem. Estimulado, dedica-se a copiar a arte que vem acompanhando há aos nas ruas de Los Angeles. Do dia para a noite, hipotecando a própria casa e tomando empréstimos, Guetta abre um estúdio, contrata assistentes – uma crítica velada do britânico a artistas como Damien Hirst, que cercado de cupinchas sequer põem a mão na massa – e começa a pôr de pé uma megaexposição completamente desordenada, sem rumo nem identidade.
A sandice toma uma proporção assustadora quando dois e-mails, um do próprio Banksy e outro de Shepard Fairey, que ficou conhecido pelo retrato estilizado que foi mote da campanha de Barack Obama à presidência dos Estados Unidos, em 2008, chancelam o trabalho de Guetta.
Urge encerrar o relato a essa altura. Operando sua sagacidade na falta de limites, Banksy zomba do mercado, da crítica, de Guetta, agora conhecido pelo codinome de Mr. Brainwash (Sr. Lavagem Cerebral) e expõe a busca desenfreada pela novidade, onde os critérios se tornam elásticos, tanto quanto o valor das peças.
Exit é um sopro cínico no castelo de cartas do mundo das artes. Tudo vem abaixo e, como não poderia deixar de ser, é mais um instrumento usado por Banksy para valorizar o próprio trabalho, confundindo verdades e armações. Coisa de gênio, por mérito e muito por estar cercado de idiotas, os quais ele aponta um a um.
Saiba mais
– Banksy causou polêmica recentemente ao produzir a abertura de um episódio de Os Simpsons ao usar elementos que remetem ao trabalho escravo
– As obras dele estão à venda na galeria Lazarides, em Londres, Inglaterra
Assista ao trailer do filme abaixo