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‘A Filha Única’: obra de autora mexicana expõe mal-estar com tabu feminino

Livro faz aposta em um tema difícil e atualíssimo: as dificuldades da maternidade

Por Diego Braga Norte 24 abr 2022, 08h00

“Devo admitir que nunca me dei bem com crianças. Se elas se aproximam de mim, eu as evito e, quando preciso interagir com elas, não tenho a mínima ideia de como fazê-lo.” A confissão da narradora Laura está logo na abertura do livro A Filha Única, da mexicana Guadalupe Nettel. A protagonista é uma mulher independente que adora viajar e estuda na França. Aos 30 e poucos anos, está concluindo doutorado, e seu companheiro gostaria de ter um filho. Laura nem cogita a possibilidade: estima sua liberdade, seu corpo e, sem avisar seu namorado, faz uma laqueadura. O filho não vem, o relacionamento termina e Laura retorna ao México para concluir sua tese acadêmica.

A FILHA ÚNICA, de Guadalupe Nettel (tradução de Silvia Massimini Felix; Todavia; 216 páginas; 67,90 reais e 44,90 reais em e-book) -
A FILHA ÚNICA, de Guadalupe Nettel (tradução de Silvia Massimini Felix; Todavia; 216 páginas; 67,90 reais e 44,90 reais em e-book) – (./.)

O tema da maternidade perpassa todo o romance, tanto na decisão de Laura como na surpreendente gravidez de sua melhor amiga, Alina, outra mulher que não pensava em ter filhos para priorizar a carreira. Talvez sob impulso do sucesso global das obras da italiana Elena Ferrante, a literatura tem aberto espaço ao questionamento de um daqueles tabus que despertam paixões ferozes: o de que seria um dado inerente da condição feminina desejar ter filhos e cuidar deles. O êxito recente da adaptação cinematográfica de A Filha Perdida, com a ótima Olivia Colman no papel principal do livro de Ferrante, lembrou a sociedade que, sim, mulheres também podem abandonar sua prole em busca de um grande amor ou para crescer profissionalmente. O tema é inflamável — logo, bastante indicado para ser retratado em obras literárias.

A Filha Única

No caso de A Filha Única, a protagonista Laura tem traços biográficos em comum com a autora, que também estudou na França e decidiu não ter filhos. Já Alina é inspirada em Amelia Hinojosa, como a própria Guadalupe conta na dedicatória de seu livro, agradecendo a generosidade da amiga que deixou sua história ser publicada e concedendo à autora “a liberdade de inventar, quando necessário”. O livro dá uma guinada e ganha tração quando Alina e seu marido são avisados de que o cérebro da bebê não se desenvolveu como esperado e muito provavelmente ela morreria pouco após o nascimento. A mãe grávida e a bebê que carrega são submetidas a um teste para detectar a presença do zika, numa passagem que remete aos tristes e recentes episódios no Brasil, quando mais de 3 400 crianças nasceram com microcefalia devido ao vírus.

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O Corpo em que Nasci

Enquanto Alina e seu marido iniciam o périplo de exames, consultas médicas e preparação para a chegada de uma criança que nem sequer sabem se vai sobreviver, Laura engata uma jornada pessoal questionando sua posição como mulher, filha única e que decididamente não quer ter filhos. A relação com sua mãe é conflituosa. Há algo mais que o tradicional embate e a pressão da progenitora por uma gravidez da filha e um netinho — a mulher de 30 e poucos que nunca vivenciou isso que atire a primeira pedra. Mãe e filha se comparam e se provocam mutuamente, num jogo de forças que supera a diferença geracional.

A Filha Perdida

A decisão da protagonista de não ter filhos e a complicada gravidez de Alina compõem o painel sobre maternidade e feminilidade que a autora pinta em sua obra. Mas, ainda que esteja longe de ser um panfleto, o livro lida com esses assuntos de uma forma previsível. Pesando méritos e falhas, talvez o maior engenho da obra de Guadalupe Nettel seja sua atualidade, ao retratar os dilemas das mulheres em busca de autonomia completa para sua vida. É uma discussão delicada — mas necessária.

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Publicado em VEJA de 27 de abril de 2022, edição nº 2786

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A Filha Única
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O Corpo em que Nasci
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A Filha Perdida
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