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“Vou quebrar mais barreiras”

Manu Aguiar, de 29 anos, superou a paralisia cerebral para conquistar o diploma universitário

Por André Sollitto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 10 dez 2022, 08h00
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  • Manu Aguiar -
    Manu Aguiar – (./Arquivo pessoal)

    Quando a bolsa da minha mãe estourou, às 10 horas da manhã daquele janeiro de 1993, ela correu para um hospital público do Rio de Janeiro, onde morávamos. O parto, porém, só foi feito às 23 horas, porque não havia leitos disponíveis. E as consequências vieram. A falta de oxigenação afetou minha coordenação motora e minha fala, mas o diagnóstico mesmo só veio um ano mais tarde. Tínhamos nos mudado para Curitiba e, um dia, meu avô percebeu que meu corpinho era mole e que eu não sentava direito. Fui levada a um centro pediátrico de referência, e o médico constatou que eu apresentava paralisia cerebral. Ele logo disse a meus pais que não tivessem muita expectativa: eu não andaria e não falaria em nenhum momento da minha vida.

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    A partir daí, fui tratada por diversos especialistas: ortopedistas, neurologistas e muitos outros profissionais. Recebi incentivo para frequentar uma escola regular, mas a matrícula foi difícil. Duas instituições me recusaram, até que minha mãe conseguiu encontrar uma instituição. Com a ajuda da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), o colégio foi fazendo adaptações e, até o 3º ano, não encontrei barreiras. Mas, ao chegar à 4ª série, fui reprovada. Percebiam que eu sabia o conteúdo — o problema era que a professora não entendia a minha letra. Ao descobrirem isso, virei assistente da mesma professora. Foi com o tempo que a situação se complicou. Na adolescência, os alunos podem ser muito cruéis. Eu não conseguia correr como eles, nunca entrava na roda da paquera e me vi sozinha. No ensino médio, mudei de escola e passei a estudar com outros portadores de deficiência. Ainda assim, sofria ameaças e fui até derrubada por colegas.

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    Ao terminar o colégio, em 2011, parti atrás de um emprego. Não foi fácil achar uma vaga na cidade. Eu chegava para a entrevista e diziam que já tinham contratado alguém. Só consegui uma colocação em um município vizinho de Curitiba. No momento em que comecei a gerir minha vida financeira e a sair com os colegas do trabalho, reparei que não havia pessoas com deficiência nas ruas. Aquilo me incomodou profundamente. Desde então, comecei a estudar inclusão e acessibilidade e a cobrar vereadores por mudanças. A grande transformação para mim veio quando minha mãe me inscreveu no vestibular de geografia da Universidade Federal do Paraná Litoral. Eu fazia um curso técnico em RH e foi complexo conciliar tudo, mas passei na prova e engatei na faculdade, que era meu sonho. Foram muitas dificuldades, do elevador que quebrou dois dias após o início das aulas aos métodos que não levavam em conta meu ritmo. Apenas com a chegada de uma educadora especializada tudo mudou e me adaptei.

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    Recebi o incentivo para escrever um artigo para um congresso de educação inclusiva, que foi aceito e me despertou a paixão pela pesquisa. Agora, finalmente, peguei meu diploma, que tem um significado todo especial. Fui a primeira estudante com paralisia cerebral a me formar na UFPR Litoral e a segunda da instituição no estado, sendo que a estudante que veio antes se formou em 2003. Portanto, há um hiato de duas décadas entre ela e eu. O ambiente acadêmico tem cotas e leis, mas não vejo ali incentivo para que pessoas ocupem tais espaços. Enxergo na pesquisa que sigo fazendo uma forma de ajudar outros como eu a obter conquistas semelhantes. A sala de aula é o primeiro lugar de inclusão. A partir dela, podemos mirar o mercado de trabalho. Se hoje tantos espaços ainda não garantem a acessibilidade, como deveriam, é porque não foram pensados por gente com deficiência. Espero poder quebrar mais barreiras para que aqueles que vierem depois de mim não esbarrem com os mesmos obstáculos.

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    Manu Aguiar em depoimento dado a André Sollitto

    Publicado em VEJA de 14 de dezembro de 2022, edição nº 2819

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