Promoção do Ano: VEJA por apenas 4,00/mês
Continua após publicidade

Cresce entre casais a opção por tirar um ‘período sabático’ no casamento

Eles decidem ficar longe um do outro, sem perder o vínculo conjugal

Por Amanda Péchy Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h12 - Publicado em 25 nov 2022, 06h00

“Qualquer maneira de amor vale amar, qualquer maneira de amor vale a pena.” A canção Paula e Bebeto foi composta por Milton Nascimento nos idos dos anos 1970, a década do amor livre, e de lá para cá despontaram variados arranjos entre casais, do relacionamento aberto ao poliamor, e dezenas de tipos de sexualidade. Até a monogamia, quem diria, passou por certa renovação: o “sabático no casamento” — termo emprestado do período em que o profissional se afasta da carreira, sem perder o vínculo com ela — é opção cada vez mais adotada, principalmente em decorrência da intensa convivência forçada durante a pandemia. Trata-se de uma espécie de férias da relação, diferente do célebre “dar um tempo”, já que o casal se separa fisicamente, mas segue compartilhando problemas, decisões e providências da vida em comum. Piers Morgan, o polêmico apresentador britânico, e sua mulher, a também jornalista Celia Walden, são a mais recente dupla a continuar casada, mas a distância — e recomendam. “Quando um computador fica lento sem motivo claro, você desliga e reinicia. O sabático no casamento é isso”, resumiu Celia em sua coluna no The Telegraph.

O termo apareceu pela primeira vez no livro Sabático no Casamento: a Jornada para Casa, em tradução livre, da americana Cheryl Jarvis, que o escreveu depois de passar três meses longe do marido (o casamento vai bem, obrigada). “Este livro nasceu do conflito entre amar meu marido e mesmo assim querer deixá-lo”, escreveu Jarvis, explicando que a necessidade de separação nada tinha a ver com frustração com o parceiro ou com a dinâmica do relacionamento. “O casamento é uma prisão invisível. Com a desculpa da intimidade, você pode usar sua pior roupa, sua pior cara, seu pior humor, e isso deteriora uma relação”, observa Mirian Goldenberg, antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Uma pausa na rotina permite o reabastecimento de si para voltar ao amor da melhor forma possível, valorizando esse espaço”, completa Goldenberg, falando por experiência própria: em 2007, morou em Berlim por três meses e o marido ficou no Brasil. Ela afirma que as mulheres são mais propensas a propor o arranjo, que veem como um alívio para a dupla ou tripla jornada em casa.

Cada casal tem suas regras para tirar um sabático. Celia e Piers Morgan ficaram afastados por seis semanas e continuaram trocando mensagens (telefonemas, não) enquanto ele viajava pelo mundo produzindo uma série da Netflix e ela dedicava-se à escrita em Los Angeles. A atriz Emma Thompson, para quem “todos os casais deveriam ser obrigados a fazer uma pausa um do outro de vez em quando”, receita um ano ou mais. James Middleton, irmão de Kate, a futura rainha da Inglaterra, e sua mulher, Donna Air, experimentaram o casamento a distância quando ele foi morar em Hong Kong, a negócios, em 2016, mas não adiantou — separaram-se dois anos depois. A escritora Ruby Warrington, conhecida por advogar a sobriedade na sua geração de millennials, passou oito meses longe de Simon, após receber uma oferta de emprego em Ibiza. “O afastamento nos permitiu ser indivíduos novamente e ficou mais fácil lembrar por que escolhemos um ao outro”, reconhece.

PROGRAMAÇÃO DE FÉRIAS - Duas vezes por ano, Isabele Moreira passa dez dias sozinha, longe de casa. “Tenho necessidade de um tempo para mim”, diz. O marido, Gustavo, entende e não se importa de cuidar dos três filhos. -
PROGRAMAÇÃO DE FÉRIAS – Duas vezes por ano, Isabele Moreira passa dez dias sozinha, longe de casa. “Tenho necessidade de um tempo para mim”, diz. O marido, Gustavo, entende e não se importa de cuidar dos três filhos. – (./Arquivo pessoal)

Quando foi publicado, em 1999, o livro de Cheryl Jarvis era visto como uma ameaça aos valores familiares. Hoje em dia, ainda que perdure certa resistência a novos arranjos amorosos, a sociedade está mais aberta a experiências. “O sabático no casamento vem na esteira de outras tendências, como a escolha pelo relacionamento aberto, por atar o nó mais tarde na vida e até pela solteirice”, diz a antropóloga Goldenberg. “É um indício de que estamos caminhando para uma visão menos idealizada do casamento como fonte de toda felicidade.” O raciocínio se casa, com o perdão do trocadilho, com o refluxo do ideal do amor romântico. “Entre os anseios contemporâneos, preservar a individualidade começa a ser fundamental para a existência”, ensina a psicanalista Regina Navarro Lins. “A ideia básica de fusão do amor romântico deixa de ser atraente, por trilhar exatamente o caminho inverso.”

Não existe uma fórmula que garanta que férias do casamento fazem bem ao casal, mas as pesquisas apontam, sim, nessa direção. O americano Brian Ogolsky, professor de desenvolvimento humano na Universidade de Illinois, analisou cinquenta anos de estudos sobre “manutenção de relacionamentos” e identificou que cultivar um vínculo saudável requer reservar algum tempo para refletir sobre a relação. A consultora de negócios Isabele Moreira, 43 anos, e seu marido, Gustavo, separaram-se e voltaram, mas nessa segunda chance ela decidiu implementar intervalos regulares na convivência: duas vezes por ano, em fevereiro e em setembro, passa dez dias sozinha. O marido entende e não se incomoda de ficar com os três filhos. “Maternidade e casamento não são o centro da minha existência. Eu sou”, justifica Isabele, para quem o tempo só dela “ajuda direta e indiretamente” a relação. Em Casamento Indissolúvel ou Relação Sexual Duradoura, Wilhelm Reich, discípulo (bem mais radical) de Sigmund Freud, diz que uma união satisfatória dura, em média, quatro anos. Depois, é preciso achar opções. A conta pode não ser exata, mas, se e quando a insatisfação se instalar, talvez isso seja sinal de que a vida a dois precisa de férias.

Publicado em VEJA de 30 de novembro de 2022, edição nº 2817

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Veja e Vote.

A síntese sempre atualizada de tudo que acontece nas Eleições 2024.

OFERTA
VEJA E VOTE

Digital Veja e Vote
Digital Veja e Vote

Acesso ilimitado aos sites, apps, edições digitais e acervos de todas as marcas Abril

3 meses por 12,00
(equivalente a 4,00/mês)

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 12,50 por revista)

a partir de 49,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.