Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

A crescente ala masculina que encara o desafio de ser pai depois dos 50

Vivendo mais e melhor, eles encaram uma missão que envolve muito afeto e ajuda a rejuvenescer

Por Duda Monteiro de Barros Atualizado em 15 jun 2023, 14h26 - Publicado em 10 jun 2023, 08h00

Até bem pouco tempo atrás, a vida da maior parcela da humanidade seguia um roteiro mais ou menos previsível e desejável aos olhos da sociedade. As curvas demográficas estão aí para mostrar que, até o fim do século XX, outro dia ainda, era muito comum casar-se cedo e logo pôr de pé uma família, trilha incontornável baseada em arranjos que, aos poucos, foram sendo substituídos por uma variedade de outros. Nas últimas décadas, as mulheres fincaram os pés no mercado de trabalho, conquistaram direitos sexuais e reprodutivos e, sob o pano de fundo da liberdade de escolha, passaram a esticar a idade com que têm filhos — fenômeno naturalmente acompanhado pelos homens, que, ao contrário delas, podem se tornar pais em qualquer etapa, já que seguem férteis. Adicione-se o aumento da longevidade — hoje se vive mais e melhor, até tarde —, e eis que despontou no horizonte uma visível multiplicação de pais tardios, aquela turma que se vê trocando fralda para lá dos 50 anos de idade.

Recentemente, o ator Al Pacino ajudou a trazer o assunto à baila ao anunciar que, aos 83 anos, terá um filho com a namorada, de 29 — o quarto de sua prole, que vai de 22 anos (os gêmeos) aos 33. Uma semana antes, o amigo Robert De Niro, de 79 anos, já havia revelado a chegada de mais um rebento, Gia Virginia, que tem seis irmãos de todas as gerações, entre 11 e 51 anos. “Estou muito feliz, adorando”, declarou o ator, que contribui para elevar uma estatística que, do ponto de vista da demografia, aponta para uma mudança notável — no Brasil, a cada doze meses, a idade para ser pai vem subindo mais de um ano. A média, que era de 27 anos na década de 1970, pulou para 33 nos dias de hoje, segundo o Observatório Nacional da Família — e, como se vê, há quem extrapole, e muito, esse número. A tendência é universal. De acordo com a Universidade de Stanford, em meio século dobrou o contingente masculino nos Estados Unidos que estreia na paternidade depois dos 40 anos.

EMPOLGAÇÃO - Al Pacino e a namorada: anúncio de mais um filho aos 83 anos
EMPOLGAÇÃO - Al Pacino e a namorada: anúncio de mais um filho aos 83 anos (Reprodução/Instagram)

Como em todo assunto que afeta diretamente os indivíduos, a paternidade tardia não é tema trivial — ela envolve um recomeço numa fase da existência em que muita gente está desfrutando a vida adulta sem amarras. Mas, segundo o relato de homens que passam por isso, a experiência, que se desenrola no auge da maturidade, contém uma riqueza especial. “Consigo aconselhar melhor minha filha e ela me traz um olhar para o mundo diferente, me estimulando a ultrapassar meus próprios limites”, diz o empresário Luiz Rocha, que teve Maria Luiza, de 19 anos, aos 73 — a mais recente de sete filhos. Como tantos que apresentam tamanho abismo etário em relação à prole, ele alimenta seus temores. “Tenho medo de não poder presenciar acontecimentos da trajetória dela, como o casamento e o crescimento profissional”, afirma o empresário, que, com mais tempo livre, aproveita cada minuto. “Se a pessoa tiver realmente acumulado uma boa bagagem, poderá exercer uma paternidade mais presente do que alguém de 30 focado na carreira”, obser­va a psicóloga Lidia Aratangy.

Pouco se fala ainda sobre as questões fisiológicas da paternidade tardia, embora a ciência já tenha acumulado vasto conhecimento nesse campo. Diferentemente das mulheres, que passam pela menopausa por volta dos 50 anos, não há uma idade em que os homens perdem a capacidade de se reproduzir. Mas, a partir dos 40, vai crescendo a dificuldade de os espermatozoides alcançarem o óvulo, e a mulher demora mais para engravidar. Também os riscos de a criança apresentar distúrbios, como autismo e outros do escaninho dos males da mente, crescem, tal como ocorre com as mulheres, só que mais tarde, ao redor dos 45. “Não é só a idade cronológica que importa na hora de medir os riscos, mas também o fato de o homem, a certa altura, já ter se exposto a fatores como o consumo de álcool, cigarro, obesidade e sedentarismo”, explica Daniel Suslik Zylbersztejn, do Departamento de Sexualidade da Sociedade Brasileira de Urologia. Daí a necessidade de se redobrarem os cuidados.

Continua após a publicidade
INSPIRAÇÃO - Picasso com Maya, que ele pintou: diferença de 54 anos
INSPIRAÇÃO - Picasso com Maya, que ele pintou: diferença de 54 anos (Archives of American Art/Smithsonian Institution//)

Um aspecto que diversos pais tardios ressaltam é que, ao se debruçar sobre a criação de um novo ser, eles passam a olhar com mais zelo para a saúde e rejuvenescem, entre outras coisas, ao reaprender a brincar. “Decidi fazer uma operação de joelho para poder cuidar melhor do Isaac, que está com 8 meses”, conta o também empresário Luiz Rodrigues, 56 anos, pai de terceira viagem, que em breve será avô. A jornada do recomeço está sendo surpreendentemente fácil. “Os problemas ganham outra dimensão e, para completar, dinheiro deixou de ser preocupação, como era com minhas outras filhas”, diz o feliz papai, que só não quer que, futuramente, os amigos de Isaac o tomem por avô.

Ao longo da história, figuras geniais de diferentes áreas, como Charles Chaplin (1889-1977) e Pablo Picasso (1881-1973), também romperam com o caminho que lhes era esperado, tornando-se pais ao envelhecer. Três dos quatro filhos de Picasso nasceram quando o precursor do cubismo tinha entre 54 e 68 anos. Mesmo com uma relação conturbada com a prole, eles o inspiraram — Maya, eternizada nas telas, era conhecida por ser confidente do pai, a única que podia entrar em seu ateliê. Mesmo com toda a complexidade envolvida na missão, a paternidade tardia pode representar preciosa janela para uma vida nova.

Publicado em VEJA de 14 de Junho de 2023, edição nº 2845

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.