No livro Team of Rivals, a historiadora norte-americana Doris Goodwin descreve como Abraham Lincoln circunavegou as diferenças, conflitos e invejas de um ministério formado por três de seus adversários nas prévias da eleição de 1860, o procurador geral, o secretário do Tesouro e o secretário de Estado. Lincoln trouxe seus oponentes para perto de si numa coalização que, como mostra Goodwin, foi fundamental para depois obter a maioria Congressual para aprovar a abolição da escravatura e a guerra civil contra os estados rebeldes. Desde a publicação do livro em 2005, a fórmula do ‘time de rivais’ virou recorrente para explicar alianças largas como a Geringonça portuguesa, o Big Tent de Joe Biden e a Frente Ampla do segundo turno de Lula.
Neste terceiro mandato, Lula repete a fórmula flutuando acima das tensões dos ministros da Casa Civil, Rui Costa, e Fernando Haddad, da Fazenda. Nas últimos dias, Lula demitiu o presidente da Petrobras, afastou o ministro da Comunicação Social, comemorou internamente a dissidência na votação do Comitê de Política Econômica do Banco Central (Copom) e decidiu concentrar a agenda do governo na arriscada agenda de reconstrução do Rio Grande. Por trás dessas decisões há um evidente reforço na posição de Rui Costa.
A Petrobras será um feudo de Rui Costa, compartilhado com seu aliado, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Ambos articularam a troca na presidência da companhia depois de meses insistindo para que o plano de negócios da Petrobras acompanhasse o plano de obras do governo federal, o PAC. Haddad foi excluído da decisão, embora parte substancial da redução do déficit fiscal dependa da Petrobras. Magda Chambriard assume a Petrobras sabendo que responde à Casa Civil.
A reconstrução do Rio Grande é uma missão impossível para um país pobre. Em um mês, quando a cobertura intensiva da TV se reduzir, também vai se arrefecer a boa vontade dos outros Estados e do Congresso. Mesmo assim, está dada a decisão política de Lula de ter três anúncios por semana para o Estado, e a execução dessas promessas vai depender mais da articulação de Rui Costa em tirar os projetos do papel do que das capacidade de Haddad dizer não.
Como escreveu Bruno Boghossian, na Folha, “a consolidação do poder de Costa é um dos fenômenos deste segundo ano de governo. O ministro não só assumiu a confiança plena do presidente como expandiu sua influência”.
Nos dois primeiros mandatos, Lula incentivou a disputa entre ministros como José Dirceu, Dilma Rousseff e Guido Mantega em contraposição a, respectivamente, Antonio Palocci, Marina Silva e Henrique Meirelles. Dirceu perdeu para Palocci, que foi derrotado por Dilma, que obrigou a demissão de Marina e apoiou Mantega para isolar Meirelles. A lição é que embora o presidente possa arbitrar suas decisões hora para um lado, hora para outro, o pano de fundo dessas brigas ministeriais sempre será a sua sucessão.