Escolhido pelo próprio avô para assinar o remake de Pantanal na Globo, que exibiu o último capítulo da adaptação nesta sexta-feira, 7, Bruno Luperi manteve o roteiro originalmente escrito por Benedito Ruy Barbosa praticamente intacto, mas deixou sua marca ao inserir discursos críticos ao machismo, racismo e homofobia da novela das 9. A boa recepção do público prova que o texto da novela que chegou ao final na noite desta sexta-feira, 7, conseguiu atravessar gerações, passados 32 anos, com certo louvor. O dramaturgo evitou mudanças radicais, deixando de consertar até erros patentes de Barbosa em relação aos enredos exibidos pela primeira vez na Manchete em 1990 – porém, conseguiu provar que a aposta da emissora líder de audiência em adaptar uma trama tão marcante foi certeira.
Quando foi exibida pela primeira vez, Pantanal causou fascínio no público brasileiro, proporcionando uma audiência jamais antes vista fora da Globo, que sofreu reveses com bastante frequência para o folhetim da Manchete. Mais de três décadas depois, a curiosidade dos telespectadores jovens, somada à nostalgia dos mais velhos que ainda se lembravam da novela, fez com que uma parcela do público que perdeu o interesse por folhetins retomasse a vontade de acompanhar a TV no horário nobre, com o atrativo de hoje poder maratonar a trama no streaming do Globoplay. Se antes o termômetro dos autores para medir o sucesso de suas obras eram as ruas, agora é necessário mobilizar as redes sociais. Nelas, Pantanal viralizou com uma frequência constante, chegando ao topo dos assuntos mais comentados do Twitter quase todos os dias.
De fato, o neto preferiu respeitar a criação do dramaturgo ao manter a saída de personagens queridos como Madeleine (Karine Teles) e Trindade (Gabriel Sater) da história, ignorando o apelo do público atual e sem corrigir o passado, já que na versão original os atores haviam saído por motivos pessoais. No remake, a escolha de preservar o roteiro foi exclusivamente de Luperi, que no entanto mexeu em alguns detalhes relevantes: trocou a castração de Alcides (Juliano Cazarré) por estupro na vingança de Tenório (Murilo Benicio) e mudou a profissão do estuprador de Zuleica (Aline Borges) de um militar por um médico.
Em compensação, pregou discursos mais progressistas em relação ao conservadorismo do avô. Protagonistas como Jove (Jesuita Barbosa), José Lucas (Irandhir Santos) e Juma (Alanis Guillen) foram interpretados por atores LGBTQIA+. Um núcleo de atores negros, encabeçado por Zuleica, foi inserido na história. A mimada Guta (Julia Dalavia) militava pela juventude revolucionária, e o homossexual Zaqueu (Silvero Pereira) ensinou tolerância a peões homofóbicos como Alcides (Juliano Cazarré). A maior sacada do texto de Luperi foi transformar a Maria Bruaca (Isabel Teixeira) na verdadeira protagonista de Pantanal. A personagem vivida pro Isabel Teixeira se desenvolveu tão bem ao longo da trama que ofuscou até Juma, com uma grande história de superação dos abusos do marido violento, Tenório (Murilo Benício), e da subserviência à filha chata, para viver um grande amor proibido com Alcides e conquistar sua tão sonhada liberdade. Com sua determinação instintiva e urgente, ela se tornou um símbolo feminista infinitamente mais genuíno do que Guta, progressista de araque.
É positivo até o resultado dessa nova Pantanal em relação à audiência, repercussão e dramaturgia. Enquanto o remake obteve uma média de 30 pontos no Painel Nacional de Televisão (PNT), sua antecessora, Um Lugar ao Sol, terminou com 21. Bons atores, cenários naturais e enredos fugazes a histórias focadas nas capitais de Rio de Janeiro e São Paulo atestaram que ainda se clama por um novelão que retrate outros recantos do Brasil.