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Sobre Palavras Por Sérgio Rodrigues Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.
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(Des)acordo ortográfico: o Brasil piscou, e agora?

A Academia Brasileira de Letras divulgou na quarta-feira uma nota oficial em que lamenta o “retrocesso” do adiamento para 2016 da obrigatoriedade da vigência do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa no país. Afirma que estava pronta para dar início a uma campanha internacional destinada a tornar o português – enfim uma língua única – um […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 06h59 - Publicado em 26 jan 2013, 11h39
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  • A Academia Brasileira de Letras divulgou na quarta-feira uma nota oficial em que lamenta o “retrocesso” do adiamento para 2016 da obrigatoriedade da vigência do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa no país. Afirma que estava pronta para dar início a uma campanha internacional destinada a tornar o português – enfim uma língua única – um dos idiomas oficiais de trabalho da Organização das Nações Unidas (ONU).

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    Compreende-se a frustração. Decidido por decreto assinado pela presidente Dilma Rousseff no apagar das luzes do ano passado, dias antes do fim do prazo de adaptação previsto anteriormente, o adiamento é um estranho caso de tiro desferido no próprio pé pela diplomacia brasileira.

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    Esta vinha exercendo um papel consistente de liderança no trabalho de unificar uma língua de 260 milhões de falantes que, mesmo sendo uma só (variações nacionais e regionais são, mais que inevitáveis, bem-vindas), nunca soube se pôr de acordo sobre algo banal como a forma de grafar suas palavras. Internacionalmente, isso não é só um fator de confusão e constrangimento. É sinal de fraqueza. Se um aborígine australiano do último cafundó de Queensland escreve inglês com a mesma grafia de um nova-iorquino, qual é o sentido de nativos de Rio e Lisboa, cidades irmãs, divergirem em seu português?

    O trabalho foi difícil, lento, realizado sobre o solo pantanoso de orgulhos e desconfianças ancestrais – para não mencionar a má vontade natural da maioria do público com a ideia de virem esses sabichões mexer no que funciona. O texto do acordo data de 1990, mas só em 2008 foi aprovado pelo Parlamento português.

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    Sempre considerei o conteúdo do acordo decepcionante sob diversos aspectos. No entanto – fora arroubos de anarquismo que são tentadores para qualquer escritor, raça pouco afeita à deglutição de regras sobre seu instrumento de trabalho – nunca deixei de entender o argumento político de sua validade. Tentando me conformar com as absurdas regras do hífen e com palavras grotescas como “corréu”, eu pensava: foi o acordo possível, paciência. Negociações são assim, perde-se aqui para ganhar ali, vamos em frente. E parecia que íamos mesmo. Agora ninguém sabe se iremos.

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    O adiamento assinado pela presidente veio, estranhamente, num momento em que o trecho mais incerto e turbulento da jornada já tinha ficado para trás. A custosa adoção do acordo ia adiantada no Brasil, muito à frente dos demais países lusófonos. Pode-se mesmo dizer que era completa: sistema de ensino, imprensa e editoras, hoje todo mundo segue em nosso país a nova ortografia.

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    Em Portugal, onde o marco inicial da obrigatoriedade já estava fixado em 2016, as resistências eram e são bem maiores. Compreensível. A cultura portuguesa é informada por um sentimento de posse sobre a língua, o que alimenta mágoas diante da liderança brasileira no processo. O fato é que tudo ia caminhando, trancos e barrancos incluídos. O Brasil tinha se tornado um farol na epopeia da unificação.

    Agora o farol fraqueja e ameaça se apagar. Os adversários ativos do acordo – mais fortes fora do país, mas nada desprezíveis aqui dentro – podem soltar fogos, espalhar temores sobre o risco imaginário que ele oferece à “diversidade cultural” e protocolar os pedidos de vista do processo e demais recursos protelatórios que têm na manga. E a provável maioria silenciosa que sempre encarou com antipatia a decisão de mexer na língua talvez diga, concordando com aquele meu lado anarquista: “Bem feito”.

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    O decreto de Dilma tornou bastante concreta a possibilidade de que os setores público e privado do Brasil tenham investido uma fortuna para, em nome da unificação, implementar uma reforma ortográfica que jamais terá validade fora de nossas fronteiras.

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