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Um colégio, as saias, Rousseau pelo avesso e os autoritários

Ah, houve uma verdadeira invasão de “ai-ai-ais e ui-ui-uis” por causa do que escrevi sobre o chamado saiaço do Colégio Bandeirantes. A maioria que se manifestou no post apoia o que escrevi, mas há alguns indignados que se dizem alunos da escola e que deploram o meu suposto “conservadorismo” nessa questão, atribuindo, de resto, erroneamente, à […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 06h03 - Publicado em 10 jun 2013, 17h54

Ah, houve uma verdadeira invasão de “ai-ai-ais e ui-ui-uis” por causa do que escrevi sobre o chamado saiaço do Colégio Bandeirantes. A maioria que se manifestou no post apoia o que escrevi, mas há alguns indignados que se dizem alunos da escola e que deploram o meu suposto “conservadorismo” nessa questão, atribuindo, de resto, erroneamente, à VEJA opiniões que são minhas. De novo e pela enésima vez: sou o único responsável pela opiniões que emito aqui, sobre qualquer assunto: comida japonesa; Bolero de Ravel; a luta do “ser contra o não ser universal/ arcano impossível de ler”; Paulo, o Apóstolo; aborto; a melhor forma de comer biscoito recheado (se separando as duas partes ou não); pernas peludas de saia… Escolham aí. Assim, quando alguém quiser protestar contra algo publicado aqui, quem tem de ser invocado é o dono da opinião: eu mesmo. Quanto à coisa em si, vamos lá.

Eu, sim, escrevi um texto em defesa do Colégio Bandeirantes, ressaltando que nunca estive lá, que não conheço a direção da escola ou detalhes da rotina da instituição. Mas sei reconhecer quando alguém ou alguma instituição está sendo alvo de uma patrulha autoritária, como é o caso. Se notarem, no post que escrevi a respeito, não citei nomes de alunos, de professores, de diretores. Na verdade, lamento a espetacularização e a escandalização do nada que esse episódio revela. O que não passa de uma questão interna, de menor importância, ganhou repercussão porque, é evidente, estudantes apelaram às redes sociais — com o auxílio de alguns pais meio amostrados, parece-me — e acabaram criando um constrangimento para direção da escola.

Ressalvei, logo de cara, em meu primeiro texto, que o caso da saia não estava necessariamente ligado à sexualidade dos dois pivôs do episódio, que se declaram heterossexuais. A condição de cada um, nesse caso, é irrelevante. A patrulha que engolfou a escola, no entanto, é, sim, parte do patrulhismo gay, que vai assumindo tinturas a cada dia mais autoritárias.

Todas as reportagens que li sobre a reação da escola indicam que a direção expressou, sim, a sua inconformidade com as tais saias, mas não houve qualquer reação que pudesse ser tipificada como autoritária. Apenas se lembrou que a escola tem hábitos, costumes, valores, padrões, coisas que, em suma, constituem a sua cultura média — são, como chamei, as questões consuetudinárias. Nem tudo o que nos é permitido está estabelecido em leis, regimentos, normas. Nem tudo o que nos é vedado está igualmente proibido nesses mesmos textos. A vida em sociedade só é possível porque estabelecemos também pactos não escritos de convivência.

Alguns dos que se manifestaram contra o meu texto dizendo-se alunos ou ex-alunos do Bandeirantes — pouco me importa se são ou não — argumentam que a escola faz praça de seu, digamos, “liberalismo” no que concerne à indumentária. Logo, indagam, se é assim, por que não, então, a saia? Ora, por esse caminho, a gente poderia indagar: por que não assistir às aulas só de cueca e calcinha no verão — assentando-se, é evidente, por princípio, que rapazes e moças escolherão livremente uma peça ou outra para não caracterizar “patrulha de gênero”… Percebam o raciocínio perigoso subjacente: o Bandeirantes, nesse caso, estaria sendo punido, então, por ter ampliado o espaço das escolhas no que concerne à indumentária. Fosse mais restritivo, impusesse um uniforme (e escreverei a respeito), não teria enfrentado o “protesto”.

QUE FIQUE CLARO!
Gente muito ocupada em “militar” não tem tempo de ler direito os textos que lhe caem às mãos. No post que escrevi, não dirigi uma só crítica aos estudantes do Bandeirantes. Em certa medida, são também vítimas da patrulha politicamente correta. As minhas restrições se dirigiram todas à cobertura feita pela imprensa. E acusei também a “patrulha gay” organizada, especialmente nas redações, de submeter a escola a uma espécie de corredor polonês.

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Dois trechos de uma carta atribuída a alunos, que circula por aí, chamaram a minha atenção. O primeiro é este.

“Heteronormatividade” é linguagem militante, além de ser um cretinismo. Sugere a ideia estúpida de que os padrões determinados pela heterossexualidade são baseados em alguma arbitrariedade socialmente definida. E, como sabe a humanidade, isso não é verdade. Como se estima que mais de 90% das pessoas sejam heterossexuais, especioso seria se a) isso não gerasse norma nenhuma, ainda que não legal; b) a norma fosse ditada pela minoria. Assim, não existe uma “heternormatividade”, mas uma “heterorrealidade”, uma “heteromaioria”. Assegurar os direitos da minoria, numa democracia, é coisa distinta de instituir uma ditadura de minoria. E notem que só toco nesse assunto porque consta lá da carta.

O segundo trecho é este.

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Bem, não sei que diabos se disse sobre Rousseau aos alunos ou que diabo eles julgam ter aprendido. Mas a coisa está absolutamente desfocada. Se aplicadas, as ideias de Rousseau, elas sim — E NÃO A DIREÇÃO DO COLÉGIO BANDEIRANTES —, teriam banido da escola os alunos de saia, pretextando o triunfo da vontade geral sobre as vontades individuais. Quem quer que tenha orientado essa carta — ou que tenha se julgado instruído o bastante sobre Rousseau para fazê-lo — não sabe direito o alcance do pensamento que está sendo usado para endossar o protesto. O Bandeirantes deveria trabalhar com a hipótese de que enfrenta uma espécie de surda patrulha interna. Se procurar, vai achar.

Uniforme
Não conheço as peças publicitárias do Bandeirantes — logo, não sei se é verdade que a escola faz praça do fato de não exigir uniforme. As escolas particulares que o repudiam — falo de modo geral — cometem, a meu ver, um erro maior do que supõem. Há desdobramentos bastante deletérios decorrentes dessa decisão, a saber: a) formação ostensiva de “tribos” dentro da escola, com base em valores que nada têm a ver com a instituição; b) ditadura da moda (ou desfile de moda) no ambiente escolar, o que também não remete a questões de ordem intelectual; c) fetichização da individualidade, de sorte que se confunde o gosto pelo choque com a expressão de uma visão particular e eventualmente superior de mundo.

Excelentes escolas mundo afora adotam o uniforme. Longe de ser um fator de repressão, ele pode ser, isto sim, um exercício de liberdade, uma vez que não obriga os jovens — NUMA IDADE EM QUE PERTENCER A ALGUMA COISA OU A ALGUM GRUPO É IMPORTANTE — a escolher um estereótipo. Até porque, entendo, a escola deve se dedicar a duas tarefas básicas: a) ministrar da melhor maneira o conteúdo objetivo a ser ensinado; b) oferecer aos alunos as condições para que busquem autonomia intelectual. E A AUTONOMIA CAMINHA NO SENTIDO CONTRÁRIO AO DA FORMAÇÃO DE TRIBOS.

Podem chiar à vontade. Não dou a mínima. Escrevi, porque quis, um texto em defesa de uma instituição chamada “Colégio Bandeirantes”. Ademais, segundo as fotos que vi, só uma minoria de rapazes aderiu à saia no tal “protesto”. O que vi foi muita menina exibindo a veste. Por que uma mulher de saia longa é vista, hoje em dia, como um espécie de afronta e de afirmação de identidade, eis mais um dos mistérios do nosso tempo…

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