Leitores às pencas: “Assistiu ao Tropa de Elite? Não vai comentar”.
Vou. Mas não agora, porque ainda não vi o filme. Só entro em fila em caso de obrigação legal. E não vejo cópia pirata. A menos que descole uma legal, pode demorar um pouco. Mas é claro que já adorei. Mesmo sem ver. E a razão é simples, como vocês devem supor: jamais assisti a tamanho alinhamento da canalhice intelectual esquerdocínica contra uma obra. A VEJA é uma das exceções nessa patrulha abominável. Jerônimo Teixeira, como de hábito, escreveu um texto excelente a respeito nesta edição (assinante clica aqui). Segundo Teixeira, “Protagonista e narrador do filme, o capitão Nascimento, interpretado com uma convicção assustadora por Wagner Moura, espanca drogados, aterroriza moradores inocentes, tortura a mulher de um bandido e executa traficantes. Ele expõe suas razões com uma sinceridade fria. Tropa de Elite apresenta o ponto de vista de Nascimento, mas não o referenda. É um filme incômodo, o que talvez seja seu maior mérito.”
Não vi o filme, mas identifico o núcleo duro da resistência à obra — e, quem sabe?, a razão do seu espetacular sucesso no mundo da pirataria: sem ser lançado, já foi visto por 1,5 milhão de pessoas. E onde está esse núcleo? José Parilha, o diretor, cometeu o pecado (aos olhos “deles”) de chamar às falas o “progressismo do miolo mole”. Lembrou uma questão que é de fundo moral: quem consome drogas, ainda que consumidor eventual, está alimentando o narcotráfico e a violência que diz combater. E é isso o que os “bacanas” não suportam no filme — independentemente de quaisquer qualidades e defeitos que possa ter. Não estou entre aqueles que consideram que Cidade de Deus é leniente com o tráfico. Mas, naquele caso, tratava-se de um ajuste de contas “entre eles”. E não faltava violência, como sabem. Tropa de Elite lembra que “nós” temos algo a ver com aquilo.
Ora, enquanto a violência e o narcotráfico se perdem na cascata do “problema social”, da “má distribuição de renda”, das “desigualdades” — observem que são chaves e chavões do discurso de esquerda —, tudo parece bom e sem solução. E tome passeata com bata branca contra a violência. Quando se evidencia a conivência da classe média bem-pensante com o crime — se você enfia o nariz numa carreira de pó, é aliado objetivo do narcotráfico —, aí o mundo vem abaixo. Dia desses, li um troço em que o sujeito indagava: não fosse a venda de droga, que outra forma de crime eles praticariam? Respondo assim: primeiro os bacanas param de cheirar, depois eu respondo. Ou serei forçado a concluir que estão querendo se atribuir uma função social quando enrolam um cigarro de maconha ou consomem cocaína. Qual é?
Também se ataca o que seria a apologia da violência. Vou ver. Até onde sei, o capitão Nascimento não é exatamente o rapaz que escolheríamos para genro — ou as moças para namorado. Parece-me que há é um temor subjacente em certos espectadores de reconhecer na brutalidade uma forma eficaz de atuação. Como a canalhice política vem completa, o filme está sendo classificado como “de direita”. Que mimo! E qual seria a versão da esquerda? Ela tem autoridade moral e histórica para falar em não-violência?
O filme de Padilha assusta, parece, porque retirou da equação a explicação fácil e errada de que tudo é “problema social”. Não é. Ademais, contam-me — e Teixeira referenda —, trata-se da visão do policial, não de uma proposta universal. E verdade universal, com a modéstia de sempre, é coisa da esquerda.
A patrulha corre solta. Pressionados, atores e diretor começam a falar o que dá na telha. Wagner Moura defendeu a descriminação das drogas. Leitores me dizem que Padilha foi ao programa de Jô Soares e fez o mesmo, com o endosso do humorista. Trata-se, obviamente, de uma tontice. A questão importante: o mundo faria a mesma coisa, ou o Brasil seria uma ilha para a produção, a venda e o consumo? Tenta-se, a todo custo, arrancar das pessoas envolvidas com o filme alguma declaração que, uma vez mais, referende o ponto de vista dos que seqüestraram o Brasil com suas políticas compassivas e nos sufocam com sua baba amorosa. Em meio a balas perdidas e mortos.
Não vi Tropa de Elite. Mas estou vendo o pelotão de fuzilamento.