Leiam o que informa Gabriela Guerreiro na Folha Online. Volto em seguida:
Temer grava participação em TV Evangélica manifestando posição contrária ao aborto
O candidato a vice-presidente da República na chapa de Dilma Rousseff (PT), o deputado Michel Temer (PMDB), gravou nesta quinta-feira participação na TV Evangélica Gênesis, da Igreja Sara Nossa Terra, manifestando posição contrária ao aborto. Em meio à polêmica sobre o tema na corrida presidencial, Temer disse que, como o Estado brasileiro é laico (sem vínculo religioso), o presidente eleito no dia 31 de outubro deve governar para todos, sem divisões religiosas.
“Eu acho muito grave que se coloque a questão da fé com a questão do Estado. Que vença o melhor, mas o melhor para o país. A Dilma não vai ser presidente de evangélicos ou de católicos; vai ser presidente do Brasil. Portanto, de todas as confissões, de todos os setores sociais. Acho inadequado você misturar religião com Estado, até porque o Estado é laico.”
Temer gravou depoimento a pedido do deputado Rodovalho (PP-DF), que é bispo da Igreja Sara Nossa Terra. O bispo já declarou formalmente apoio à candidatura de Dilma, mesmo depois de críticas à candidata por setores evangélicos sobre a posição do PT favorável ao aborto.
O peemedebista disse que conversou por telefone com o ex-governador do Rio Anthony Garotinho (PR) – eleito no último deputado federal com quase 700 mil votos no Rio. A campanha de Dilma busca o apoio do novo deputado, evangélico, especialmente depois de sua expressiva votação.
“Eu acho que ele pode ajudar com os 700 mil votos que ele conquistou no Rio. Nem sei se eram evangélicos ou não. Mas foi uma votação significativa que pode ajudar na obtenção de votos”, disse Temer.
Sem bater no principal adversário de Dilma, José Serra (PSDB), o peemedebista disse acreditar que a oposição tenha iniciado a discussão sobre o aborto para tirar votos da petista. “É muito provável, não quero falar dos objetivos da oposição. Eu falo como brasileiro, como alguém que verifica a gravidade de confundir política com religião. Nos Estados em que isso acontece não é útil para o Estado. A Dilma já declarou, e eu declarei que sou contra. Acho que tem que manter o sistema legal vigente.”
Comento
Vejam que coisa esquisita. O comando do PT terceirizou o embate religioso. Ora manda o neolulista Gabriel Chalita, deputado eleito pelo PSB, dar entrevista, ora manda Michel Temer, o peemedebista candidato a vice… Nem mesmo um petista, ainda que não Dilma, parece ter autoridade para fazer esse embate. A candidata foge da questão como o diabo foge da cruz! Isso é só uma metáfora, hein? Os petralhas logo vão dizer que estou sugerindo associações com satanismo ou sei lá o quê! Até as metáforas estão hoje em dia sob forte policiamento.
Ontem, indagada a respeito da questão, Dilma virou as costas e não respondeu. Obedecia a instruções de Sérgio Cabral, governador reeleito do Rio, convertido em marqueteiro, que lhe soprava ao ouvido o que fazer e dizer.
Não entendi a intervenção de Temer — ou melhor, entendi, mas é esquisita. Não se trata de um embate entre várias religiões ou denominações cristãs, não! Não se trata de uma guerra entre católicos e evangélicos. O que aconteceu é que setores majoritários das várias igrejas cristãs demonstraram seu inconformismo com as opiniões de Dilma sobre o aborto, expressas de forma inequívoca em entrevistas, de viva-voz, sem ambigüidade. Até agora, ela também não disse: “Sou contra a descriminação do aborto e, se eleita, lutarei contra, ainda que alguém apresente a proposta ao Congresso”.
Como fazê-lo? O busílis é esse. Não há como. Porque há os testemunhos da própria candidata.
Quanto a Garotinho, parece que Temer, político experiente, deixou que percebêssemos mais do que estava determinado a mostrar. A forma como se refere ao deputado eleito — cuja eleição ainda está sub judice — deixa claro qual dos lados da disputa tem uma relação, digamos, meramente instrumental com a religião.
Temer também não precisa temer (ops!) pela laicismo do estado. Ninguém está propondo uma teocracia. O aborto é tema político em qualquer democracia do mundo. O jogo é o seguinte: os políticos falam o que pensam. E o eleitorado também. Quem, como Dilma, defendia até o ano passado a descriminação do aborto tem todo o direito de se manifestar e de tentar convencer os brasileiros. O que não pode — sem que tal postura seja denunciada — é atuar num sentido e afirmar ao leitor que atua no sentido contrário.
Parece que Temer tem andado meio longe das igrejas e dos assuntos de Deus. Que eu saiba, nenhuma delas quer ser estado, quer ditar as leis. Os cristãos se organizam para interferir no processo eleitoral, como fazem os sem-isso e sem-aquilo, os trabalhadores, os empresários, os movimentos sociais etc. Ou será que eles deveriam se calar? É o tipo de pensamento que a gente combate com água benta.