Pois é, pois é… Escrevi aqui no dia 19 um texto intitulado Por que não me entusiasmo com os “democratas” da Síria. Apanhei um tantinho, até de amigos meus que são mais otimistas com o que se passa por lá e no Oriente Médio de maneira geral. Todos trabalhamos, na verdade, com excesso de informações, muitas delas contraditórias etc e tal. Mais: sabemos menos do que seria necessário dos subterrâneos de regimes fechados, grupos terroristas etc. As escolhas e olhares são determinadas mais por visões gerais de mundo. O que é definidor no meu pessimismo? Lá vai: a região se torna a cada dia — ou a cada “revolução” — menos laica. E eu não vejo como se possa confundir democracia com religião na esfera do estado. Já usei esta imagem e volto a ela: acho que a Primavera árabe é prenúncio de um inverno e tanto…
Pois é… Já havia me referido aqui à presença de jihadistas na Síria. É evidente que um confronto como aquele não se cria do nada, especialmente quando se tem um estado policial. Parecia-me evidente que Bashar Al Assad não mentia quando apontava a presença de terroristas no país — que atuaram também na Líbia e atuam no Iraque. E ISSO PODE SER ESCRITO, COMO ESCREVI, SEM EXPRESSAR QUALQUER SIMPATIA PELO TIRANO CARNICEIRO. Se eu tivesse qualquer interesse particular na queda de Assad, seria o caso de escrever: nem todas as formas de derrubá-lo atendem ao meu interesse…
Pois é… Publico trecho de um texto do New York Times, que está na Folha de hoje. Leiam com atenção. Volto em seguida:
É o tipo de imagem que já virou comum na revolução síria: um vídeo mostrando homens mascarados que dizem ser do Exército Sírio Livre, brandindo AK-47s. Mas há uma diferença. No pano de fundo estão penduradas duas bandeiras da Al Qaeda. “Estamos formando células suicidas para travar a jihad [guerra santa] em nome de Deus”, disse uma voz no vídeo, usando o árabe clássico em que a Al Qaeda costuma se expressar. O vídeo é nova evidência de que a Al Qaeda e outros extremistas estão fazendo o melhor que podem para pegar carona na revolução, com um grau de sucesso crescente, embora ainda limitado.
Enquanto líderes da oposição política e militar síria continuam a negar qualquer participação dos extremistas, a Al Qaeda vem ajudando a mudar a natureza do conflito, injetando na batalha contra o ditador Bashar Assad a arma que ela aperfeiçoou no Iraque: explosões suicidas. A presença de jihadistas na Síria vem acelerando nos últimos dias, em parte devido a uma convergência com as tensões sectárias ao longo da longa fronteira que o país divide com o Iraque.
Autoridades iraquianas disseram que os extremistas que operam na Síria são, em muitos casos, os mesmíssimos militantes que estão atacando em todo seu país. Desde o início do levante o governo sírio vem procurando retratar a oposição como sendo dominada pela Al Qaeda e por aliados jihadistas, acusação que a oposição vem rejeitando e que observadores independentes disseram, à época, não ser verdade.
(…)
Voltei
A secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, admitiu que seu país está colaborando com os ditos insurgentes, mas não com armas… É um caso notável, então, em que temos o governo americano e a Al Qaeda atuando num mesmo lado do conflito, assim como a Otan se juntou aos jihadistas para depor Muamar Kadafi.
“Pouco importa, Reinaldo; o importante é derrubar Assad; o resto se vê depois”. Pois é. Não acho. Não é o meu modo de ver o mundo. Não é assim que entendo que as coisas devam ser, ainda que assim elas sejam. Eis aí. A presença da Al Qaeda na Síria não é mais um boato. É um fato. Moralmente falando — porque não podemos ir muito além disso, não é? —, me incluam fora dessa.