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Reinaldo Azevedo

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Confissão de José Mayer indica sobrevida de primitivismos morais

Ator admite assédio contra figurinista e se sai com tese esfarrapada. Sim, há um feminismo doidivanas, mas também há o necessário

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 4 abr 2017, 19h14 - Publicado em 4 abr 2017, 17h45
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  • O blog #AgoraÉqueSãoElas, da Folha, errou feio ao publicar o relato da figurista Susllem Meneguzzi, acusando o ator José Mayer de assédio — ou, a ser verdadeira a narrativa da vítima, que não foi contestada, houve bem mais do que isso. Qual foi o erro? Não ter tentado ouvir previamente o acusado. Contraria o Manual de Redação da Folha e, por óbvio, do bom jornalismo. Errou, mas, pelo visto, não mentiu.

    O jornal havia retirado do ar o testemunho de Susllem, que agora volta. Para ler, clique aqui.

    Sim, tenho considerações a fazer que dizem respeito ao nosso tempo e a tempos pelos quais anseio. Vamos lá.

    Li o relato de José Mayer, em que reconhece a culpa, com certo asco. Sim, pela coisa em si, que é deplorável, mas também porque ele busca, de algum modo, diluir suas responsabilidades pessoais nas de todos os homens.

    Lá está escrito:

    “Tristemente, sou, sim, fruto de uma geração que aprendeu, erradamente, que atitudes machistas, invasivas e abusivas podem ser disfarçadas de brincadeiras ou piadas. Não podem. Não são.”

    Vamos devagar aí!

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    “Quem nunca contou uma piada machista? Quem nunca contou uma piada contra gays? Quem nunca contou uma piada contra preto? Quem nunca contou uma piada contra aleijado?”

    Bem, a primeira coisa a responder nesse caso é a seguinte: nem todos contam. Eu, por exemplo, não conto. Mas também não conto piadas contra empresários, policiais ou direitistas só porque eles são empresários, policiais e direitistas, né? Faço essa observação para que Gregório Duvivier se acalme. Não estamos e jamais estaremos do mesmo lado.

    De resto, fuja do conforto do “quem nunca?”. Isso nada tem a ver com a polícia da linguagem instituída pelo politicamente correto — (“Ah, não se diz mais ‘aleijado’). Estamos falando de escolhas de civilização. Qual queremos?

    Machismo atávico?

    Escreve o ator:

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    “Tenho amigas, tenho mulher e filha, e asseguro que de forma alguma tenho a intenção de tratar qualquer mulher com desrespeito; não me sinto superior a ninguém, não sou.”

    Entendo. Por alguma razão, talvez sem onde focar o seu desejo, ele resolveu que com Susllem pudesse ser diferente, não é? Ora… O personagem “pegador” já contracenou com mulheres deslumbrantes. Não consta que tenha se excedido. Ainda que se quisesse evocar algum componente de ordem psíquica a justificar a sua conduta, parece que a hipótese sai bastante enfraquecida. Assediar a figurinista evidencia um mau uso das relações de poder. Eis a verdade.

    Infelizmente, é preciso admitir que, não fosse a publicação do relato, o ator estaria impune — ainda que a punição de agora seja apenas moral.

    Feminismos

    Sim, existe o feminismo necessário, e há o feminismo destrambelhado. Mas não sou mulher e não serei eu a dizer qual serve e qual não serve. Sou casado com mulher, tenho duas filhas e não reconheço, sob qualquer pretexto, uma, vamos dizer, determinação sociológica que imponha aos homens agir contra os direitos assegurados às mulheres (e aos homens) pela Constituição.

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    Aliás, repito aqui o que sempre disse às minhas filhas: não importa em que fase do processo você fique com vontade de dizer “Não”. O “não” quer dizer… NÃO!

    Sim, reconheço: poucas militâncias podem ser tão obscurantistas como o feminismo sectário. Hoje, há malucas e malucos proclamando por aí que toda transa heterossexual é “estupro”, porque, afinal, o “homem que penetra” e a “mulher que é penetrada” teriam se transformado em categorias simbólicas. Assim, a violência sexual estaria embutida mesmo nas práticas consensuais, amorosas, virtuosas. Não! Estaríamos diante de uma questão, digamos, ontológica. E a doçura de uma relação sexual só mascararia um histórico de violência.

    Que coisa, né? Por esse caminho, então, a gente poderia passar a mão na cabeça de José Mayer e livrá-lo da culpa. Afinal, cada homem no particular não poderia ser responsabilizado por uma violência inata, que não escolheu, da qual não pode se livrar.

    É claro que existe o feminismo doidivanas, que vaza, às vezes, para a legislação. A caracterização do “feminicídio” é uma dessas bobagens vendidas como “conquista das mulheres”. Não! É só exercício tosco do direito. Recentemente, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) resolveu voltar à Grécia antiga do século 4 a.C. e propor uma greve de sexo, como na peça Lisístrata, de Aristófanes. No caso, as mulheres protestavam contra a Guerra do Peloponeso. Proposta de Lisístrata, a líder: paz em troca de sexo. Ou sexo em troca de paz, sei lá.

    Bem, a guerra principal que há no Brasil, ora bem-feita, ora malfeita, é contra a safadeza, né, senadora? Contra aqueles que abusaram de suas prerrogativas para assaltar os cofres públicos. E, claro, fico tranquilo se souber que Gleisi ficará longe de “Édipo Rei”, de Sófocles; de “Electra”, de Eurípedes, e de “Medeia”, do mesmo autor. Vai que ela comece a ver virtudes redentoras, respectivamente, no parricídio, no matricídio e no filicídio…

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    Como vocês sabem, eu tenho muito receio da direita que não lê. Mas também é preciso tomar muito cuidado quando a esquerda lê.

    Caminhando para o fim

    Há um feminismo (ou feminismos) estúpido, anti-homem e, em muitos aspectos, anti-humanista. Basta ver a militância da maioria dessas correntes em favor da descriminação do aborto. A tese, em si, me parece — de novo a palavra — “humanamente” bárbara. Mas me incomoda menos essa enormidade do que outra: o não reconhecimento de que o feto é pessoa em potencial, sim.

    Assim como os protegidíssimos ovos de tartaruga são, afinal, tartarugas potenciais. Sem contar que a afirmação de que o feto é algo que só diz respeito ao que a mulher fará com o seu corpo elimina o homem da narrativa. Afinal, nesse caso, ele foi o quê? Um doador aleatório de semente? Voltamos a um período da Idade Média, quando se acreditava que as fêmeas de urubu eram inseminadas pelo esperma dos machos, que estes largavam literalmente ao vento?

    E olhem que esse caso dá pano pra manga porque logo se vai resgatar a tese estúpida da “cultura do estupro”. Bem, qualquer psicanalista sério atestaria que o comportamento do ator não é o do estuprador. Até porque parece que o excitava a prática furtiva, num ambiente quase público. Tudo indica que o constrangimento dela é que assanhava a sua sede. É outra psicologia do estuprador.

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    “Cultura do estupro” é uma invenção militante que não serve para o caso. O que se tem aí é machismo tosco, imposição do forte sobre o fraco e, claro!, certeza da impunidade.

    Ok. José Mayer pediu desculpas. Mas a sua carta evidencia que tem muito a aprender.

    Que as mulheres não deixem barato! E falo isso na minha condição mais básica, independentemente de escolhas políticas ou ideológicas: fala o filho de mulher, o marido de mulher, o irmão de mulher, o pai de mulheres.

     

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