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Caros Amigos lamenta o fim de Primeira Leitura?

Dentre todas as pessoas que lamentaram o fim da revista e do site Primeira Leitura, a mensagem mais condoída, sem dúvida, partiu de José Arbex, um dos mitos da esquerdista Caros Amigos. Vocês não precisam acreditar em mim. Se quiserem dar uma ajuda aos companheiros, comprem o exemplar deste mês e lá está o seu […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 23h26 - Publicado em 18 jul 2006, 21h25
Dentre todas as pessoas que lamentaram o fim da revista e do site Primeira Leitura, a mensagem mais condoída, sem dúvida, partiu de José Arbex, um dos mitos da esquerdista Caros Amigos. Vocês não precisam acreditar em mim. Se quiserem dar uma ajuda aos companheiros, comprem o exemplar deste mês e lá está o seu texto, intitulado: “Segunda leitura: de mercados e escorpiões”. Não sou leitor habitual da CA e fui alertado para o artigo por um internauta.

Desconsiderem o parágrafo inicial em que ele destila um pouco de ressentimento. Todo ressentimento é burro. O de Arbex não seria diferente. Faz ali uma chacota lembrando que Primeira Leitura deu uma capa com a seguinte formulação: “Os sem-terra não existem”. E aí ele tira a sua casquinha: a revista acabou, mas o MST continua firme, forte etc e tal. Huuummm… A revista disse que não existiam sem-terra, não um aparelho milionário chamado MST. Ele sabe a diferença. O resto do artigo é melhor, eu juro. Até propõe questões pertinentes, embora eu não tenha entendido as razões da sua perplexidade.

Segundo Arbex , a revista “pretendia-se (…) porta-voz do liberalismo ilustrado”. Há aí um tantinho de ironia. “Liberalismo ilustrado” talvez seja o duplo negativo da “esquerda festiva”. Mas, em seguida, ele concede: “Dada a mendicância intelectual da assim chamada elite brasileira, é apenas lamentável que uma tentativa como essa tenha fracassado”. Bem, não há contraste, mas certa relação de causa e efeito, certo, Arbex? Ele ensaia uma resposta: o punhado de famílias que domina a mídia brasileira não aceita partilhar o seu espólio nem com aliados ideológicos. Eu gostaria de concordar com ele porque, assim, teria em quem jogar a culpa. Infelizmente, não concordo.

E, por isso, ele passa um pito em mim e em Rui Nogueira: não se conforma que tenhamos fechado a revista sem acusar ninguém e assumido a inteira responsabilidade pelo conjunto da obra. Comenta o trecho da carta de despedida em que não exercermos nem mesmo aquele velho lamento: “Não fomos compreendidos”. Aí é Arbex que não compreendeu a ironia que, de tão sutil, pode ter desaparecido. Fomos bem compreendidos pelos liberais e fomos bem compreendidos pelos petistas, Arbex. Estes nos perseguiam; aqueles fugiam. A equação é simples. Descarte a hipótese da má gestão. Primeira Leitura tinha uma particularidade em relação aos chamados veículos alternativos: pagava bons salários e em dia. Ninguém trabalhava pela causa. Quando percebemos que tais condições estavam ameaçadas, fechamos as portas.

Culpa das “famílias”? Acho que não. A Folha, é verdade, nos meteu no meio de uma matéria suja, foi desmentida pela própria agência de publicidade, mas o desmentido não foi noticiado com igual destaque. Seria porque o jornal não me aceita como sócio do clube? Mas eu não quero fazer parte do clube em que vigora aquele tipo de jornalismo.

O articulista não se conforma que tenhamos fechado a revista e, ainda assim, reiterado a nossa adesão à economia de mercado. O que ele queria? Que eu tivesse cobrado, na saída, uma Imprensabras, para os desdentados de Lula financiarem o meu credo liberal? O que é isso, companheiro? Esse negócio de pôr a comunidade, a coletividade, para financiar idéias é coisa de comunista, hehe. E isso, você sabe, é tudo o que eu não sou. Também me sugeriram que montasse algum esquema para doação de recursos ou sei lá o quê… Não conseguiria. Ia me sentir um mendigo, um escravo, um dependente da boa vontade de estranhos.

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Entendo a surpresa que o fim de Primeira Leitura causou em seus leitores e até em alguns de seus adversários ideológicos. Arbex não é o primeiro esquerdista que lamenta o fato. Não havia indícios. Site e revista seguiram inteiros até o último dia, sem rebaixar um centímetro a qualidade do que faziam — do que conseguiam fazer com os recursos de que dispunham. Poderiam ter demitido um pouco, cortado páginas, rebaixado a qualidade do papel. Nada! Inteiros, até o fim. Donos de sua vida e de sua morte.

Fui comprar a Caros Amigos. Um único anúncio, na contracapa, do estatal Banco do Nordeste, uma facilidade que Arbex sabe que nunca tivemos. Publicamos, é verdade, anúncio da Nossa Caixa, mas a CA também — a Folha achou que só o de Primeira Leitura tinha cheiro de pecado. Por alguma razão, a “imprensa monopolista” preservou o veiculo de esquerda e desceu o pau naquela do “liberalismo ilustrado”.

Mas volto aos anúncios da CA. Conheço esse negócio: uma única página numa edição de 48, ao preço de R$ 7,90, é prejuízo na certa. Isso caso se paguem salários decentes e em dia, com férias, 13º, etc — a menos que os “companheiros” tenham renunciado a essas regalias getulistas… É verdade que esta edição que tenho em mãos é modesta no que respeita aos anúncios oficiais. Deve ser por causa da legislação eleitoral. Caros Amigos já circulou com encartes do governo do Paraná que me faziam babar de inveja. Mas o governo do Paraná jamais concederia tal benefício a uma publicação do “liberalismo ilustrado”.

Leio pouco Arbex. Quando isso acontece, não concordo quase nunca. Mas burro ele não é. Longe disso. Passado o período eleitoral e caso Lula vença, a sua revista volta a ficar cheia de anúncios oficiais, o que lhe permitirá continuar a gesta contra o capitalismo e as famílias monopolistas da mídia. Caso Alckmin seja o vitorioso, vai acontecer o mesmo: tucanos e pefelistas podem até ignorar aliados ideológicos, Arbex, mas jamais vão deixar um inimigo sem recursos. Eles têm medo de ser tachados de malvados ou de reacionários.

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Arbex não percebeu uma coisa. A esquerda perdeu a guerra da economia. Ele sabe que essa conversa de crise do neoliberalismo é delírio exultório do seu colega Emir Sader — acho que ele não dá bola para o que Sader escreve; ninguém dá… Mas ele sabe também que a esquerda venceu a batalha dos valores. Entre Caros Amigos e Primeira Leitura (se ainda existisse), muitos “monstros” capitalistas escolheriam CA. Vocês têm muito mais bondades e humanismos fáceis a oferecer do que nós tínhamos.

Fique tranqüilo, Arbex: Caros Amigos, passada a seca do período eleitoral, voltará a ter anúncios vistosos. Vença o PT ou vença o PSDB, a revista estará entre as prioridades. O capitalismo tem especial atração por seus detratores. O liberalismo, em nome dos seus princípios, faculta a seus inimigos prerrogativas que eles não lhe facultariam em nome dos deles.

Você nem precisa sair do campo da esquerda para entender. Leia Slavoj Zizek — não a versão censurada pelo Emir Sader: entre Caros Amigos e Primeira Leitura, o capitalismo globalizado não teria a menor dúvida em fazer a sua escolha por Caros Amigos. Vocês carregam aquele, se me permite o oxímoro, charme irresistível da resistência. Aliás, dê um toque aí no povo da Casa Amarela: basta procurar a Fundação Ford. É puro capim gordura em tempos de vacas magras.

Um abraço do
Reinaldo Azevedo

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