Atenção, coleguinhas! Cumpre não esquentar a notícia quando ela não é assim tão quente…
Olhem aqui… Longe de mim querer livrar a barra do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). Ele pode não ter dito exatamente o despropósito que quase unanimemente se atribuiu a ele, mas disse outros tantos, talvez de menos gravidade. Não economizou tolices. Mas não me parece, definitivamente, que tenha oferecido a Câmara como asilo aos […]
Olhem aqui… Longe de mim querer livrar a barra do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). Ele pode não ter dito exatamente o despropósito que quase unanimemente se atribuiu a ele, mas disse outros tantos, talvez de menos gravidade. Não economizou tolices. Mas não me parece, definitivamente, que tenha oferecido a Câmara como asilo aos deputados mensaleiros caso estes tenham a prisão preventiva decretada.
Curiosamente, aquela gente que está sendo paga para satanizar o Supremo — com dinheiro de estatais — adorou a distorção. Para esses caras, quanto mais quente estiver o ambiente, melhor; quanto mais conflagrado, mais eles se divertem e provam a sua suposta “utilidade”; podem, então, dizer ao PT e ao governo: “Se não formos nós, vocês ficam reféns da mídia conservadora e golpista; para fazer o nosso trabalho, precisamos dos anúncios das estatais, dos empregos públicos, essas coisas…”. E acabam levando. Por intermédio dessas bocas de aluguel — que não reconhecem limites de qualquer natureza —, setores do governo e do petismo se vingam dos “inimigos”, a saber: imprensa independente, Procuradoria-Geral da República, oposição e alguns ministros do Supremo. A bola da vez é Joaquim Barbosa. Não faz tempo, era Gilmar Mendes. Em passado mais remoto, era Marco Aurélio Mello. A artilharia já mirou em Cezar Peluso, Ayres Britto, Celso de Mello, Luiz Fux… Juristas de verdade por ali, eles veem apenas dois: Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli — e este com alguma reserva porque condenou José Genoino por corrupção ativa. Mas avancei na digressão. Quero voltar ao ponto.
Marco Maia defendia a sua tese, segundo a qual o Supremo exorbitou de suas funções, avançou em prerrogativas da Câmara etc. Tomado de uma espantosa tolice, voltou a falar que Celso se Mello só afirmou ser impensável que alguém descumpra decisão do Supremo porque estava doente… Mello parece um juiz experiente o bastante para não deixar que vírus e bactérias, nem os de fato, lhe contaminem as ideias.
Os jornalistas é que perguntaram a Marco Maia o que ele faria se os deputados fossem buscar refúgio na Câmara para não ser presos. Ele deu uma de duas respostas possíveis. Sendo quem é, escolheu a pior, mas, entendo, não fez o que lhe atribuíram. A melhor resposta seria algo assim: “Eu não creio que a situação chegará a tanto e prefiro não me entregar a essas especulações; a nossa função é buscar a harmonia entre os Poderes etc. e tal…”. A outra resposta possível é a ruim: “As portas da Câmara estão abertas…”. Foi o que ele disse. Tendo evitado a resposta prudente, restou a tola. Inconcebível seria que ele dissesse que fecharia as portas da Casa para impedir o acesso dos três…
É preciso tomar cuidado com essas coisas que rendem título e manchete, mas que não são fatos. FHC está nesta quinta nos jornais defendendo o julgamento do “mensalão mineiro”. Ora, uma coisa é se lançar de forma militante nessa defesa — e esse, convenham, é um papel político do PT hoje em dia. Outra, distinta, é aquilo que de fato aconteceu. Indagaram ao ex-presidente o que ele achava que deveria acontecer. Nesse caso, ele nem tinha duas alternativas, como Maia, mas apenas uma, quando se é homem decente: afirmou que o processo tem de ser julgado.
Imaginem algo diferente disso: “Vejam bem, no caso do PSDB, acho que se deve proceder de forma diferente…”. E lá viria o título: “FHC diz que mensalão de Minas merece tratamento diferenciado”. Alguém tem dúvida de que seria assim? Se ele não diz, digo eu: não são coisas iguais, não. Há crimes também nesse caso, mas outros. Mas não é o aspecto relevante do meu texto. Estou é chamando a atenção para essa mania de esquentar respostas que são óbvias, emprestando-lhes uma temperatura que não têm.
Se alguém nos indagar se acreditamos ou não na lei da gravidade, há uma de duas respostas. A boa: “Isso é uma bobagem; não sabia que havia dúvida possível a respeito”. A outra é óbvia e tola: “Sim, eu acredito”. Não ocorrerá a alguém manchetar: “Fulano diz acreditar na Lei da Gravidade”.
Volto a Maia. Ele é, já deu para notar, dessas almas que costumam ter soluções simples e erradas para problemas difíceis, para lembrar Mencken. No vídeo de nosso debate, que está na home, aparece sugerindo que as coisas funcionam assim: nem a Câmara se mete com o Supremo nem o Supremo se mete com a Câmara. Ele ignora que é o tribunal que detém a guarda da Constituição, redigida e votada pelo Congresso (portanto, pelo povo), dando aquela precisa atribuição à corte suprema do país… Assim, não lhe faltam considerações esdrúxulas sobre uma porção de coisas. Mas não me parece que tenha oferecido asilo aos deputados. Atenção! Isso não quer dizer que ele não possa fazê-lo, se é que me entendem…
Sim, é preciso atentar para o sentido das palavras e para o seu sentido no discurso. Jornalismo sem contexto vira ditadura do presente eterno — e, se querem saber, até da mentira.
Joaquim Barbosa deve decidir nesta sexta se mensaleiros terão ou não prisão decretada já. Qualquer que seja a decisão, há a possibilidade de conceder uma entrevista. Digamos que escolha o caminho que vai gerar mais barulho. Imagino uma pergunta e uma resposta:
— Ministro, o senhor não achou a decisão um exagero?
— Se decidi, é porque não achei, e é a mim que cabe essa decisão.
Seria o casamento da tautologia com a obviedade. Imaginem esta manchete encimando uma foto de Barbosa com ar bem severo: “Quem decide sou eu”. Ficaria parecendo que ele se vê como o Luís XIV da Corte. Ocorre que quem decide é ele por força da Constituição, do Regimento Interno do STF e da ordem dos fatos. Ainda que alguns tentem sugerir o contrário, Barbosa não conta com os tanques ou com divisões armadas. Num regime democrático, tem como instrumento as leis.
O ambiente já está bastante quente e conflagrado. Não é preciso elevar a chama da notícia.