Ainda que o texto fique como está, Lava Jato não corre risco nenhum
Procuradores fazem mal ao acenar com esse clima de fim de mundo; isso corresponde a querer convencer pelo medo e pela desesperança
Caros, não há pressão que me faça abrir mão de princípios que considero fundantes de um regime democrático. Fazer o quê? Até havia dois dias, os senhores procuradores diziam que a anistia aos políticos é que poria um fim à Lava Jato. Anistia não veio porque nunca foi possível.
Agora, segundo a nova entrevista coletiva concedida por Deltan Dallagnol e Carlos Fernando, é a possibilidade de juízes e membros do MP serem processados por crime de responsabilidade que põe fim à Lava Jato. Em suma, põem fim à Lava Jato as coisas de que eles não gostam e a fortalecem as coisas de que eles gostam.
Sei que a pergunta é incômoda, mas a função de um jornalista é fazê-la: ainda que o item polêmico seja mantido no texto, por que a Lava Jato estaria ferida de morte? Em que isso prejudicaria as investigações em curso? Em que isso prejudicaria as apurações havidas? Em que isso prejudicaria as penas já aplicadas e as por aplicar?
Então se vota um conjunto de medidas — sim, bem diferente do que pretendia o Ministério Público — que torna mais severo o combate à corrupção, e se sustenta que a operação está correndo risco, mais uma vez?
E que se note: dada a forma do texto, acho difícil que a coisa passe pelo Supremo. Há aspectos ali que me parecem inconstitucionais. É evidente que os procuradores cometem um erro gravíssimo ao demonizar os políticos, apelando a essa retórica do fim do mundo.
Atores políticos precisam atuar lembrando que há sempre um depois. Não faz sentido entrar numa luta contra o Congresso porque… haverá sempre um Congresso!!! A menos que o país caminhe para uma ditadura. Ou, ainda, hipótese mais remota, que uma guerra civil ou uma revolução se encarregue de liquidar todos os atuais detentores de mandato, substituindo-os por pessoas eleitas em comitês ou sovietes.
Sim, é verdade que a baixa política e os maus políticos contribuíram enormemente para esse estado de coisas. Mas poucos se dão conta de que foi o desrespeito às leis e às instituições que nos conduziram a esse estado de coisas.
Foi o processo de desinstitucionalização do país, levado a afeito pelo PT, com a mistura nefasta de interesses de governo, do partido, de milícias, de lobbies, o diabo a quatro, que levou a uma jornada de vale-tudo, que deu à luz os salvadores da pátria.
Os procuradores surgiram, inicialmente, falando em nome da lei e da ordem, do respeito à Constituição. Aos poucos, foram assumindo uma entonação política que consiste justamente na negação da política e dos próprios políticos. Ou estes votam de acordo com o que querem os procuradores, ou, então, estariam alimentando a corrupção. É claro que as coisas não podem se dar dessa maneira.
Não é possível que alguém se proponha a fazer um projeto de lei e que só considere legítimo um resultado. Quem disputa a arena política precisa estar preparado para ganhar ou para perder.
Estamos indo por caminhos muito perigosos, podem apostar nisso.