A Parte e O Todo – “Nunca fui de esquerda”, diz Lula. E a imagem da semana
“O Mágico”, de Bosch: reparem na pinta do picareta, embora a elite esteja de coluna dobrada Marilena Chaui e Emir Sader, a esta hora, ou estão encharcados de lágrimas, sentindo-se traídos pelo Tiranete de Siracusa, ou estão comemorando o que consideram mais um truque do Babalorixá de Banânia. Em entrevista à Agência Reuters, Lula não […]
Ele nunca foi mesmo de esquerda porque isso requer certa complexidade mental, que ele não tem. O que não quer dizer que tal complexidade seja sinônimo de coisa boa. Lula é muito preguiçoso e indisciplinado para ser comunista. Também lhe falta aquele sentido de lealdade à causa. Podem ver: é só a chapa ficar quente, ele vai se livrando dos “companheiros”. Uma boa prova de seu êxito no mundo do individualismo é seu patrimônio — sonho de todo “operário” do ABC, que é o que ele ainda se diz.
Imagine Lula lendo aqueles textos intermináveis de Lênin. Cai no ronco antes da terceira linha. Não consigo vê-lo de posse dos discursos mais complexos de Trotsky, juntando variáveis culturais à luta política cotidiana. No terceiro paradoxo, começa a ter coceira no dedão e se distrai. Gramsci, então, Jesus! Tudo muito assistemático, às vezes quase cifrado. As análises políticas de dona Marisa Letícia, como ele já confessou outro dia, são muito mais eficientes. “Lula, tem muito buraco na estrada”. E ele manda tapar.
Lula não deve entender por que tantos se angustiam por bobagem. Seu mundo é simples. Diogo Mainardi revelou na sua coluna da Veja desta semana como ele foi escolhido para integrar a chapa do sindicato. Teve um psicodrama. Eles teriam de representar o que entendiam da luta. O seu concorrente montou nas costas de um colega. Era uma alegoria do capital e do trabalho. Lula fez uma roda, com todo mundo de mãos dadas. Lênin ou Trotsky o teriam fuzilado ali mesmo. Stálin talvez não. Sempre poderia ser útil para a causa. O cara do SNI que estava presente deve ter pensado: “achei”.
O Babalorixá não é de esquerda, é certo. Mas o PT é. E não vou agora fazer aqui a genealogia do partido. Do bolchevismo, herdou os métodos, o pensamento, o desprezo pela democracia, pela pluralidade. Ele não é um mero instrumento do partido. Ele sabe muito bem o nome do que pratica. Mas, com efeito, vem de uma outra vertente: representa a nova classe social que se foi incrustando na máquina do Estado da redemocratização a esta data. Trata-se de uma casta sindical, em busca de privilégios, que se espalha por todos os cantos. A velha gesta esquerdista é feita pelo partido nas políticas que os sindicalistas consideram periféricas: educação, cultura e assistência social.
No essencial, como Lula repete à Reuters, ele, com efeito, não quer papo com a esquerda e diz que vai manter a política econômica, que tanto encanta os mercados. Nem por isso é menos doloso para o país. Para que Lula mantenha essa disjuntiva — economia ortodoxa com populismo esquerdopático —, é preciso agredir firmemente as instituições. E isso ele também faz sem receio. Lula não é de esquerda, mas parte de seu governo é. De todo modo, a questão mais geral é outra: nem tudo o que não é de esquerda é bom para o Brasil. Lula é, antes de tudo, um ilusioniosta. Do ponto de vista da teoria política, é só um trapaceiro.