Lançada no último domingo, a nova versão do site www.bolsonaro.com.br foi criação do filósofo curitibano Gabriel Baggio Thomaz, de 29 anos, que comprou o domínio em janeiro deste ano. Em entrevista exclusiva ao Radar, ele explicou como se tornou o dono da página e por que a transformou em uma “galeria de arte digital e acervo jornalístico” com pesadas críticas ao presidente Jair Bolsonaro e sua família.
Quem entra hoje no endereço logo vê uma ilustração de Bolsonaro, no meio do gado, vestido com uniforme nazista, com uma faixa presidencial e bigode de Hitler. A frase “Ameaça ao Brasil” anuncia a “exposição”. Até meados do ano passado, o site era dedicado a publicar conteúdo favorável ao clã e ao governo Bolsonaro.
Gabriel conta que, em 2021, em busca de oportunidades, começou a fuçar domínios disponíveis no Registro.br — responsável pelas atividades de registro e manutenção de páginas com “.br” — e encontrou o que leva o nome de Bolsonaro em meio a outros milhares.
“Eu nem acreditei, mas estava lá”, comenta.
Ele então foi atrás de mais informações e encontrou uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo sobre o domínio, que foi criado em 2002 e pertencia a uma empresa do Distrito Federal, mas era utilizado pelos Bolsonaro por meio de um ex-chefe de gabinete do ex-deputado federal — o já falecido pai do hoje ministro do TCU Jorge Oliveira.
Como o domínio estava inativo, o Registro.br avisou aos interessados e abriu um processo competitivo, uma espécie de leilão, com lance inicial de 40 reais. Segundo o filósofo, que não quis revelar o valor que pagou pela página, cerca de 20 pessoas participaram. Gabriel não levou na primeira rodada, mas, como o vencedor não pagou o que prometeu, outro processo competitivo foi aberto em janeiro deste ano — quando ele fez a maior oferta.
Questionado se já sabia o que faria com a página, o curitibano diz que viu apenas um “potencial de comunicação grande” e que se sentiu obrigado a tentar, mas achou que o valor seria muito mais alto do que foi e que não seria capaz de pagar. O que Gabriel sabia é que não gostava “do cara” — no caso, de Bolsonaro.
Ele afirma que esperava que pelo menos algum representante do clã fosse falar com ele no período em que o site estava no seu nome, mas ainda inativo, porém ninguém entrou em contato. Garante que não venderia para eles, apesar de ter sido aconselhado por conhecidos a fazer isso.
O filósofo, inclusive, não tem redes sociais, mas registrou o seu e-mail ao comprar o domínio. Foi dessa forma que o Radar entrou em contato com ele, na manhã desta quarta, 31. “Nenhum político falou comigo e eu nem procurei nenhum político”, afirmou.
A ideia de lançar um site com críticas ao presidente surgiu há pouco tempo, segundo Gabriel. Ele comenta que, até pela formação em filosofia, tem problema de delimitar a própria ideologia, mas que tem uma coisa clara: é anti-Bolsonaro.
A grande repercussão da página — principalmente por causa do “vacilo” que vem sendo atribuído nas redes sociais a Carlos Bolsonaro, o filho do presidente que cuida das suas publicações digitais — já levou a campanha a informar que tomará “todas as providências legais” na Justiça criminal e no TSE.
Há pouco, o ministro da Justiça, Anderson Torres, anunciou que pediu ao diretor-geral da PF a instauração imediata de inquérito policial para apurar o “ataque direto e grosseiro ao presidente Jair Bolsonaro, por meio de um site”.
Ciente das possíveis repercussões legais, Gabriel se diz “atordoado”, mas diz que não fez nada de errado.
“Eu estou exercendo a minha liberdade de expressão e fazendo uso da minha propriedade privada”, declara, apontando que o presidente e seus seguidores dizem defender tanto a liberdade de expressão, mas na verdade cooptam o liberalismo.
Desde a terça 30, quando o “novo” site passou a ficar nacionalmente conhecido, ele conta que já recebeu ameaças e que, por se tratar de uma crítica ao chefe do governo, sabe que seus dados podem ser facilmente acessados pelas autoridades. Mas explica por que decidiu seguir em frente:
“Muita gente me disse que eu tinha tudo a perder. Eles têm essa estratégia do medo, mas é importante a sociedade civil se manifestar. Não podemos tolerar nenhum tipo de golpismo. A mensagem era muito importante, tinha de ser dita. A gente não pode ficar quieto”.