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Por Renato Meirelles
Renato Meirelles é pai da Helena, acredita que a Terra é redonda, está à frente do Instituto Locomotiva e, neste espaço, interpreta os números muito além da planilha Excel
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À beira do apagão de dados

Imbróglios envolvendo o Censo 2023 acendem o alerta sobre a importância de se ter dados confiáveis sobre a situação socioeconômica da população

Por Renato Meirelles 1 fev 2023, 17h42

Recentemente o Brasil se viu vítima de um ataque sem precedentes à uma instituição fundamental para o funcionamento do país. Não, não estou falando dos atos golpistas do dia 8 de janeiro, mas de uma tentativa do governo federal nos últimos anos de minguar a realização do Censo a ponto de colocar o país à beira de um verdadeiro apagão de dados. O que a princípio pode parecer uma preocupação restrita a quem trabalha com pesquisas de mercado ou a acadêmicos, na verdade tem o potencial de prejudicar políticas públicas essenciais para milhares de brasileiros, e também de trazer prejuízos inestimáveis para o setor privado.

A atual edição do levantamento, que deveria ter sido feita em 2020, começou em agosto do ano passado e deve ficar pronta em fevereiro deste ano. Além do atraso, o Censo acumula uma série de polêmicas e questionamentos inéditos que vão do corte de mais de R$ 1,1 bilhão para a pesquisa, passando por trocas na diretoria do IBGE, quadro reduzido de recenseadores e até atrasos no pagamento de quem foi escalado para fazer a pesquisa em campo. Some-se a isso o fato de que, pela primeira vez, os dados de 20% da população brasileira foram estimados. Normalmente o Censo estima dados para 2% da população somente, uma vez que o IBGE não consegue checar in loco a situação de 100% da população.

Dessa vez, porém, estamos falando de uma porcentagem dez vezes maior de pessoas que não tiveram suas reais condições socioeconômicas e demográficas checadas. Não por menos, em entrevista recente, o ex-presidente do IBGE, Roberto Olinto, classificou a edição atual do levantamento como uma “tragédia absoluta” e defendeu uma auditoria dos dados deste Censo. As consequências dessa tragédia já começaram a aparecer e, se nada for feito, milhares de brasileiros podem ser prejudicados. Do número de vagas em escolas e creches à definição de onde construir hospitais e fazer obras de infraestrutura, tudo passa em alguma medida por dados confiáveis que o Censo deixa à disposição dos gestores públicos.

Por isso, os primeiros que acenderam o alerta foram os prefeitos, que viram a população “estimada” de suas cidades diminuir nos dados preliminares e recorreram à Justiça. O fato por sí só não seria problema, não fosse a população dos municípios o critério utilizado pelo governo federal para distribuir as verbas do Fundo de Participação dos Municípios, um fundo bilionário formado com uma parcela da arrecadação de impostos federais que deve ser transferida às prefeituras em todo o país.

Para 2023, o Tribunal de Contas da União, que define os coeficientes de população utilizados para calcular o repasse do FPM para cada municípios, estabeleceu que já poderiam ser utilizados os dados preliminares (e incompletos) do Censo em andamento. O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal e o ministro Ricardo Lewandowski decidiu que, para este ano, os repasses serão feitos com base nas projeções populacionais do IBGE de 2018.

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A situação surreal não ocorre somente no poder público. Se o uso de dados minimamente detalhados é essencial para administrar e definir políticas públicas até na menor das cidades, na era da economia da informação é simplesmente impensável para empresas competitivas lançarem um produto ou serviço sem ter informações confiáveis sobre o público-alvo de um país ou região. Mais ainda, as empresas de grande porte trabalham frequentemente com pesquisas de mercado para mapear os potenciais públicos de interesse, amostras segmentadas e perfis de consumo.

Para estes levantamentos é crucial ter a base de dados detalhada que só uma pesquisa do porte do Censo, quando bem feita, pode oferecer. Basta imaginar um executivo de uma multinacional pensando em que país vai lançar o produto: naquele que ele sabe quem é o público potencial e suas condições financeiras, ou em um país que 20% dos dados da população são simplesmente estimados.

Em outras palavras, o apagão de dados que parece ter sido pensado pelo governo Bolsonaro nos últimos anos não beneficia ninguém e só joga o país e suas empresas no atraso. Que o país consiga encontrar uma luz, nem que para isso tenha que auditar o seu Censo 2023.

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