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O Brasil precisa deixar de ser um país de corruptos e herdeiros

O filósofo Eduardo Wolf e o historiador Leandro Karnal escreveram sobre a recente polêmica envolvendo um dia temático de alunos de escolas no RS

Por Da redação
Atualizado em 4 jun 2024, 22h02 - Publicado em 6 jun 2017, 18h19
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  • Nesta semana, alunos da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo (IENH), no Rio Grande do Sul, foram assunto no país inteiro após se fantasiarem para um dia temático chamado “se nada der certo”. Os estudantes, que se preparam para prestar o vestibular, foram para a escola vestidos de vendedores ambulantes, balconistas do McDonald’s, empregadas e garis. Após a repercussão, outros colégios também tiveram imagens parecidas compartilhadas.

    O filósofo Eduardo Wolf e o historiador Leandro Karnal escreveram sobre o assunto:

    *********************************************************************
    Se nada der certo, se tudo der errado, surgirá o Brasil (Leandro Karnal)

    Duas escolas do Rio Grande do Sul criaram, em ocasiões diferentes, uma atividade curiosa. Os alunos do terceiro ano do ensino médio se fantasiaram dentro do desafio: e se os meus planos de vestibular e de vida falharem? Desafio dado e surgiram garis, faxineiras, vendedoras, presidiários etc. As fotos circulam pela internet. Qual o problema da atividade?

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    01) Estabelece de forma clara que trabalhos mecânicos/ braçais são inferiores e podem ser ridicularizados, reforçando nossa tradição escravista;

    02) Associa baixa renda e salários pequenos a fracasso pessoal e reforça uma ideia preconceituosa;

    03) Não cria o contraditório para estimular o pensamento: dar errado é produzir algo concreto como o gari que trabalha com um produto que ninguém duvida que seja útil (limpeza) ou dar certo é ser alguém que aplica na bolsa? A vendedora da loja ganha, em alguns momentos, mais do que os professores da escola, quem deu certo? Qual seria o trabalho que dá certo e a vida que dá errado? O debate é importante. A escola deve estimular o pensamento e evitar o monolítico, especialmente no campo que desperta o preconceito.

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    04) Vestir meninas de faxineiras com saias curtas associa trabalho doméstico com disponibilidade de corpos e chance de assédio;

    05) Colocar na mesma escala um presidiário e uma vendedora do Boticário mostra que não existe leitura ética nem de valor na concepção dos alunos e promotores do evento. Não ser rico seria dar errado sempre. Curioso é não considerar uma grande categoria nova: o milionário presidiário;

    06) Toda atividade pedagógica deve estimular o pensamento crítico e nunca reforçar o sentimento de “Casa Grande”;

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    07) A melhor atividade para alunos de classe média e classe alta seria fazerem um estágio de uma semana pegando dois ônibus, ficando de pé um dia todo numa lanchonete e ganhando pouco, atendendo clientes arrogantes e, ao fim do dia, com sorte, conseguirem estar em uma escola pública até 22h30 da noite para após tudo isto, voltarem para casa com mais dois ônibus. Tenho certeza de que uma semana nesta rotina mudaria muita coisa na concepção destes alunos sobre o mundo, seus valores e seus preconceitos. O aluno que estava fantasiado de “fracassado” teve sua roupa lavada e passada, sua comida feita, seu transporte garantido e tudo mais porque existem “fracassados” que trabalham para ele.

    Queria tranquilizar a tanta gente que se preocupa se os professores de humanas transformaram os alunos em militantes de esquerda. Observem as fotos na internet e durmam tranquilos. Nenhuma mudança social deriva de um projeto escolar que, depois de doze anos de ensino médio e fundamental, consegue ter essa ideia ruim. E se tudo der errado no Brasil? Teremos o Brasil como ele é…

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    * Textos originalmente publicados pelo filósofo Eduardo Wolf e pelo historiador Leandro Karnal, no Facebook.

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