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O Som e a Fúria

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A sofrência pop de Jão, novo ídolo da geração Z

O cantor paulista vem arrebanhando multidões com sua música descolada que flerta, sem pudores, com o sertanejo

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h45 - Publicado em 10 jun 2022, 06h00

O cantor Jão se preparava para pisar no palco de um show em Fortaleza, no Ceará, no início deste ano, quando um fuzuê tomou a portaria. Duas mulheres com crachás da equipe do artista reclamavam da falta de organização, já que seus nomes não constavam na lista das pessoas autorizadas a entrar. A situação estranha levou o assessor do cantor até a portaria para resolver o imbróglio. Qual não foi a surpresa da equipe ao descobrir que ambas eram fãs destemidas (e um tanto trambiqueiras) que, sem conseguir comprar ingressos, tentavam entrar de qualquer jeito no teatro. A tática para burlar a segurança de um show e até do camarim é velha conhecida dos veteranos da música, mas até então era inédita para João Vitor Romania Balbino, nome completo de Jão, o jovem cantor de 27 anos que virou fenômeno da música pop brasileira. Se a equipe entendeu naquele momento que o rapaz de Américo Brasiliense, no interior paulista, estava a caminho de ser uma estrela de quinta grandeza, o próprio só se convenceu do sucesso há três meses, quando arrastou uma multidão para a sua apresentação no festival Lollapalooza. “Achei que não fosse ter ninguém”, disse ele, modesto, a VEJA.

O mar de gente continua crescendo desde então. Com cinco shows no Espaço Unimed, em São Paulo — giro que começou em março e ainda tem duas apresentações marcadas para agosto —, Jão vai cantar, no total, para 40 000 pessoas. “É a população da minha cidade”, brincou. Em um momento prolífico para o pop brasileiro, em que aspirantes a cantores brotam em redes sociais dia sim, no outro também, Jão conseguiu se sobressair com uma combinação de galã romântico e sensível, letras honestas e o borogodó reservado aos que são bonitos e charmosos — mas não sabem disso, ou fingem não saber. Jão ainda conversa diretamente com a chamada geração Z — os jovens nascidos a partir de 1995 —, trupe que encara a sexualidade de modo fluido: o cantor, desejado por meninas e meninos, já assumiu ser bissexual. “Pelo sucesso que atingi, eu preciso ser o mais honesto possível com os meus fãs”, afirma.

Jão – Lobos

Jão segue o passo de outros românticos incorrigíveis da música nacional, como Lulu Santos e Cazuza, com baladas envolvidas por batidas eletrônicas e guitarras distorcidas. No fundo, no fundo, o cantor descoladinho admite ter um pé (e meio) no sertanejo. Faixas como Não Te Amo ou Idiota, do disco Pirata, lançado em outubro, poderiam facilmente ser embaladas por uma sanfona ou uma viola caipira. “Até hoje acho difícil explicar que tipo de música eu faço. Estou nesse limbo de não ser nem pop nem sertanejo.” Não por acaso, sua música vem sendo chamada de “sofrência pop”.

APOTEOSE - Jão nos braços do público: sucesso no Lollapalooza -
APOTEOSE - Jão nos braços do público: sucesso no Lollapalooza – (@jao/Instagram)

Com um ritmo de trabalho puxado e uma turnê com mais de trinta apresentações lotadas até o fim do ano, a vida do cantor mudou completamente desde quando ele se mudou, aos 17, para a capital paulista para estudar publicidade na Universidade de São Paulo. Entre apresentações em barzinhos e vídeos de covers postados no YouTube, ele foi ganhando notoriedade. Em 2018, lançou seu primeiro álbum, Lobos, e logo no ano seguinte veio o segundo, Anti-Herói. Mas foi somente com Pirata, seu terceiro disco, que a fama bateu de forma avassaladora. O cachê também aumentou. Há quatro anos era 90 000 reais. Hoje, segundo fontes do setor, a apresentação não sai por menos de 200 000 reais.

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Jão – Anti-Heroi

No fim de maio, a reportagem de VEJA acompanhou um desses shows em São Paulo. Após ensaiar a música que cantaria com a dupla Anavitória, convidadas especiais da noite, Jão recebeu cinquenta fãs que pagaram 150 reais cada para tirar uma foto e conversar com ele por alguns minutos. Apaixonado por animais — ele tem três gatinhos, o Vicente, a Chicória e o Santiago —, o músico prometeu doar todos os valores arrecadados nesses encontros (em 18 shows realizados até o momento já foram doados cerca de 58 000 reais) para a ONG de proteção dos animais Casa do Vira Lata. Simpático, ele atendeu aos pedidos mais esdrúxulos para fotos, como se ajoelhar e pedir o fã em casamento ou até mesmo fazer passos de balé.

Admirador de Cazuza (1958-1990), Jão conheceu a mãe do cantor, Lucinha Araújo, que lhe sugeriu gravar uma das letras inéditas deixadas pelo filho. “Ainda não me atrevi a pedir nada para ela”, desconversa. Enquanto isso, ele corteja parcerias com medalhões como Ivete Sangalo e Nando Reis, e se prepara para estrear no Rock in Rio. Como se vê, as portas se abriram para o último romântico.

Publicado em VEJA de 15 de junho de 2022, edição nº 2793

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