George Bernard Shaw começa um de seus artigos assim:
— Gênios não existem! Sei disso porque sou genial!
Shaw tem razão em ridicularizar essa coisa de “ser gênio”, uma das maiores furadas da nossa história cultural.
Vejamos o caso de Machado de Assis. Faz décadas que a palavra “gênio” passou a fazer parte do seu nome. Ouvimos isso na TV, na boca dos professores, nos eventos literários, na imprensa e até em artigos e livros acadêmicos.
No dicionário, “gênio” é um substantivo que serve para designar a “pessoa que possui aptidão natural para algo; dom”. Aí é que está o problema. “Dom” e “aptidão natural” são conceitos que difundem a ideia de que Machado e outros ícones já nasceram prontos.
“Quem é bom vem do ovo”, diz a sabedoria popular, e no entanto não encontramos nada mais falso e desestimulante.
Comparados ao que se escrevia na época, os textos iniciais de Machado eram bem ruinzinhos. A Palmeira, um dos primeiros poemas que publicou, é de uma trivialidade que beira o constrangimento.
Como é linda e verdejante
Machado de Assis
Esta palmeira gigante
Que se eleva sobre o monte!
Como seus galhos frondosos
Se elevam tão majestosos
Quase a tocar no horizonte!
Poucos apostariam que aquele garoto que plagiava Gonçalves Dias para se inserir no clima patrioteiro do Romantismo seria capaz, anos mais tarde, de escrever romances como Quincas Borba e Dom Casmurro. Ao contrário do que supõem os que acreditam em genialidades e afins, a literatura de Machado amadureceu aos poucos, com tempo, estudo e paciência.
Se é verdade que possuía uma inclinação para a palavra escrita, não é menos verdadeiro que, com muito esforço, fez essa inclinação evoluir a níveis até então inatingíveis. Esse é o maior legado de Machado aos estudantes brasileiros. Sua arte e sua história nos mostram que tudo é possível, apesar das adversidades pessoais e do clima cultural pouco frutífero em que vivia/vive o nosso país.