A Petrobras, por mais que o mercado não queira e custe a admitir, sempre foi usada para fazer política. E isso não é necessariamente ruim. O que importa é chegar a uma equação que atenda tanto à população quanto à empresa e seus acionistas. É nesse contexto que se deve ler a troca de comando da petrolífera.
O objetivo do governo é assumir políticas públicas corretas que garantam o bem-estar da população. O do Conselho da Petrobras, maximizar o ganho para os acionistas. No meio desse cabo de guerra está o cidadão comum, para quem a política de preços dos combustíveis é pouco transparente e, principalmente, pouco previsível.
A carga tributária é elevada, com diferentes impostos estaduais e federais, e ainda há as oscilações do petróleo e do dólar. Quem deve pagar a conta por tanta volatilidade: caminhoneiros e motoristas, a Petrobras ou o governo federal e os estados? A solução provavelmente está no meio termo entre a função da política – o bem-estar dos cidadãos – e o que quer o mercado – deixar os preços flutuarem livremente sem qualquer interferência.
O dilema dos combustíveis não é novo. Governo após o governo, o Brasil vem se deparando com o mesmo problema. Na gestão Temer, enfrentamos o caos que uma greve de caminhoneiros pode produzir em um país excessivamente dependente de um único modal de transporte, o rodoviário. Custou-nos um trimestre de paralisação do PIB, bilhões de reais em prejuízo para empresas, comércio e indústria, além da convulsão política e social.
A raiz do problema é antiga e as soluções mais efetivas, de longo prazo. Investir em transporte marítimo, cabotagem, ferrovias, energia renovável. Aumentar a competitividade e produtividade do setor com a venda de refinarias da Petrobras e abertura do mercado de distribuição. Atrair atores externos, estimular a concorrência saudável pelo menor preço. Romper com o passado de uma empresa pública corporativa leva tempo. Enquanto isso, o preço na bomba sobe com o inverno rigoroso no hemisfério norte e a pressão sobre a demanda. Os caminhoneiros sofrem. O frete fica inviável, não cobre os custos da viagem.
O governo reagiu reduzindo PIS-Cofins sobre o óleo diesel por dois meses. É preciso ficar claro de onde virá a compensação, sob risco de infringir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Engenharias assim precisam ser transparentes. A pior sinalização possível para o mercado é a ingerência na Petrobras. Esse tipo de fórmula mostrou-se um fracasso no governo Dilma. Sangrou os cofres da estatal, que arcou com US$40 bilhões em prejuízo para subsidiar os combustíveis. O Planalto deve evitar o populismo fiscal irresponsável que pode colocar em xeque a saúde das contas públicas.
Em 2018, como ministro de Minas e Energia, formei um grupo de trabalho para discutir possíveis saídas para a volatilidade dos preços. Nada disso é novo. Pode ser aproveitado pelo atual governo. A ideia é formar um colchão para evitar a disparada dos preços. Em tempos de preço menor, aumenta-se a tributação e forma-se uma espécie de poupança. Quando o valor do combustível subir, usa-se essa poupança para reduzir a tributação. É uma forma de evitar a flutuação e dar mais previsibilidade aos caminhoneiros e motoristas.
Além disso, o Projeto de Lei com mudanças na cobrança de ICMS que o governo enviou ao Congresso é outra forma de conferir um horizonte maior aos preços. A variação de alíquotas entre estados e o reajuste a cada 15 dias tornam a política de preços dos combustíveis um verdadeiro pandemônio. É preciso discutir a questão dos impostos estaduais no escopo da Reforma Tributária mais ampla em tramitação no Congresso.
A política deve construir pontes para mediar o diálogo entre os entes federativos e o mercado, oferecer soluções. Nenhuma delas é fácil ou imediata. Normalmente a resposta aparentemente mais simples – como interferir na política de preços da Petrobras para não repassar aumentos – é também a pior e mais onerosa no longo prazo. O melhor remédio é rediscutir impostos e abrir o mercado de refino e distribuição para aumentar a concorrência. Nada como chamar todos os envolvidos para uma boa conversa.
Wellington Moreira Franco foi ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência