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A dieta de um governo viciado em leite condensado

Enquanto isso, o Programa Carro-Pipa...

Por Ricardo Noblat
Atualizado em 27 jan 2021, 08h18 - Publicado em 27 jan 2021, 08h00
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  • Ex-usuário de cloroquina, droga que até hoje prescreve para quem queira se curar da Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro nunca escondeu sua dependência do leite condensado, engolido a seco ou na companhia de um pedaço de pão. Já correu atrás de uma ema com uma caixa de cloroquina na mão. Costuma fartar-se de leite condensado durante encontros com os filhos.

    Os gastos com a cloroquina foram jogados na sua conta e ele não reclamou. Pelo contrário: assumiu a paternidade dos milhões de doses produzidas às carreiras pelo Exército e distribuídos em todo o país. Quanto aos gastos com leite condensado, que segundo o site Metrópoles ultrapassaram no ano passado a casa dos R$ 15 milhões, Bolsonaro preferiu jogar na conta das Forças Armadas.

    É a lei da compensação. Há mais de 3 mil militares em posições de destaque no governo. Nem na época da ditadura de 64 foram tantos. Em compensação… São obrigados a socorrer o presidente da República sempre que ele se vê em apuros. Foi o que fez o general Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa: matou no peito e chutou a bola para fora da grande área.

    Com base no Painel de Compras do Ministério da Economia, Metrópoles mostrou que em 2020 todos os órgãos do governo pagaram, juntos, mais de R$ 1, bilhão em alimentos, um aumento de 20% em relação a 2019. Fora o arroz, feijão, carne, batata frita e salada, houve espaço no carrinho para geleia de mocotó, pão de queijo, pizza, vinho, bombom, chantilly, sagu e até chiclete.

    Os valores chamam a atenção. Só em goma de mascar, foram R$ 2.203.681. Sem contar a compra de molho shoyo, molho inglês e molho de pimenta que, juntos, somam mais de R$ 14 milhões do montante pago. Pizza e refrigerante custaram R$ 32,7 milhões. Mais R$ 5 milhões na compra de fruta desidratada. Os frutos do mar não poderiam ficar de fora (R$ 6,1 milhões).

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    E muito menos peixes in natura e conserva (R$ 35,5 milhões), bacon defumado (R$ 7,1 milhões) e embutidos (R$ 45,2 milhões). Para as sobremesas, muito açúcar: sorvete, picolé, fruta em calda, doce em tablete, cristalizado, para cobertura, granulado ou confeitado. Ao gosto do cliente, por R$ 123,2 milhões. A maior parte das compras está ligada ao Ministério da Defesa. Só em vinhos, R$ 2.512.073.

    Daí porque sobrou para o general Azevedo e Silva se explicar, uma vez que Bolsonaro, em dia de conversão a todo tipo de vacina e aos princípios do liberalismo aplicados à economia, não quis falar sobre coisas incômodas. Segundo o general, o ministério tem a responsabilidade de promover a saúde do seu efetivo – composto de 370 mil pessoas – “por meio de uma dieta balanceada diária”.

    A administração militar, diz a nota do general, “deve esforçar-se para assegurar a excelência da alimentação militar, quer nas Organizações Militares de Terra, quer nos navios”. Uma vez que “a defesa do país e a segurança das fronteiras marítima, terrestre e aérea, bem como o treinamento e o preparo, são obviamente essenciais, não podem ser interrompidas”.

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    Taokey. Mas governar é estabelecer prioridades. Bolsonaro cortou 68,9% da cota de importação de equipamentos e insumos destinados à pesquisa científica. A medida afeta principalmente as ações desenvolvidas pelo Instituto Butantan e pela Fundação Oswaldo Cruz no combate à pandemia. Em 2020, o valor foi de R$ 1,6 bilhão. Para este ano, R$ 499,6 milhões.

    Uma dieta balanceada poderia passar sem goma de mascar, molho shoyo, molho inglês e molho de pimenta. Sem pizza e refrigerante, por que não? Sem fruta desidratada, bacon defumado e embutidos. Não daria para ter reduzido à metade os gastos com sobremesas? Só com tudo isso se teria economizado cerca de R$ 122 milhões. Seria menor o corte na área de pesquisa científica.

    O valor gasto com leite condensado (R$ 15 milhões) é cinco vezes superior ao que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais recebeu para fazer o monitoramento por satélite de toda a Amazônia, Pantanal e demais regiões do país – R$ 3,2 milhões no mesmo período. O Programa Carro-Pipa fornece água potável a dois milhões de pessoas na região semiárida do Nordeste.

    Existe há 20 anos e cobre 626 municípios. Para sua alimentação e higiene pessoal, uma pessoa precisa de 20 litros de água por dia. Neste momento, o orçamento do programa é de R$ 89,7 milhões para este ano. O Ministério do Desenvolvimento Regional calcula que serão necessários para que o programa não pare R$ 672 milhões. Menos leite condensado, por favor! Menos chicletes!

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