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Propaganda russa: ‘Hitler era judeu’, ‘Tsunami de 500 metros’

Estas são algumas das barbaridades proferidas nos últimos dias, entre constantes ameaças nucleares - e bico calado sobre as perdas na Ucrânia

Por Vilma Gryzinski 3 Maio 2022, 07h27

Ninguém mais poderia se espantar com o cinismo repugnante de Sergei Lavrov. Mas o ministro das Relações Exteriores da Rússia provou que sempre tem espaço para piorar.

“Que eu saiba, Hitler também tinha sangue judeu, então isso não significa nada”, disse ele, em palavras cuja infâmia correu o mundo, em entrevista a um programa de televisão da Itália, para “desmentir” que a Ucrânia, tendo um presidente judeu como Volodimir Zelenski, não pode ser neonazista, a mais enlouquecida afirmação da Rússia para justificar uma guerra absurda.

E ainda acrescentou: “Há muito tempo, temos visto pessoas judias sábias dizendo que os maiores antissemitas são os próprios judeus”.

Lavrov é escoladíssimo e não falou essa abominação por acaso. A tática da propaganda russa é justamente provocar barulho com argumentos estapafúrdios, falando mais para o público interno, mal informado sobre as dimensões das perdas russas na Ucrânia.

“É um comentário indesculpável e escandaloso, um erro histórico terrível. Os judeus não assassinaram a si mesmos no holocausto. A forma mais baixa de racismo contra os judeus é culpar os próprios judeus pelo antissemitismo”, reagiu o ministro das Relações Exteriores de Israel, Yair Lapid, sabendo muito bem no que vão dar os protestos oficias: em nada.

Lavrov faz escola. As cortinas de fumaça erguidas com declarações violentíssimas tornaram-se prática comum na televisão russa, inteiramente dominada por putinistas arrebatados.

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Os ataques mais agressivos, curiosamente, são dirigidos contra a Grã-Bretanha. Londres já foi um lugar privilegiado para os oligarcas estacionar seus dinheiro e um dos parques de diversões preferidos pelas elites russas, antes das sanções.

A rejeição dos que não podem mais mandar os filhos estudar nas escolas de elite de onde saem com o cobiçado sotaque britânico e a posição avançada do governo de Boris Johnson no envio de armas e apoio político à Ucrânia tem deixado comentaristas da televisão russa em surto. É possível apostar que os ataques redobrarão depois que o primeiro-ministro fizer um discurso inédito, à distância, ao Parlamento ucraniano.

Também circula uma desinformação pesada, a que Boris teria ameaçado recorrer ao arsenal britânico – quatro submarinos com mísseis nucleares que compõem o sistema Trident -, sem coordenação ou autorização da Otan.

É mentira, mas foi o pretexto para um apresentador como Dmitri Kiseliov, conhecido como “a voz de Putin”, dizer que as ilhas britânicas podem ser varridas do mapa por “um tsunami de 500 metros” desencadeado pela explosão, no Atlântico Norte, de um drone submarino do tipo Poseidon.

O drone tem “capacidade de levar uma ogiva de 100 megatons”, animou-se Kiseiiov, falando sobre um armamento ainda experimental.

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Uma explosão nessa escala levantaria “uma onda gigante com doses extremamente altas de radiação”.

“O que quer que venha a sobrar da Grã-Bretanha será transformado num deserto radiativo. Gostaram dessa perspectiva?”, animou-se o apresentador.

Kiseliov também ameaçou os britânicos com outro míssil experimental, o hipersônico  Sarmat, chamado pelos especialistas de Satã II. 

O teste com o míssil, capaz de levar dez ou mais ogivas nucleares, foi assistido por Vladimir Putin e impulsionou a percepcão de que a Rússia tem uma arma sem igual.

“Um Sarmat e as ilhas britânicas deixam de existir”, comemorou no programa 60 Minutos – título copiado dos americanos – o político ultranacionalista Alexei Zhuravliov.. 

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A produção ajudou com um gráfico simulando o lançamento do míssil do exclave de Kaliningrado, o território russo no Mar Báltico, vizinho à Polônia.

O gráfico mostra quanto tempo o míssil levaria para chegar às principais capitais europeias. Berlim,  106 segundos; Paris, 200; Londres, 202.

O 60 Minutos é comandado pelo casal – real – de apresentadores Olga Skabaieva e Evgeni Popov. Ela tem o simpático apelido de “boneca de ferro da TV de Putin”.

Popov argumentou com Zhuravliov que ninguém sobreviveria a uma guerra nuclear, mas o político deu contra-argumento: “Começaríamos da estaca zero”.

Olga Skabaieva , com seus maxilares eslavos bem pronunciados, diz coisas do gênero: “A Ucrânia está desabando diante de nossos olhos. Tudo o que os aliados ocidentais dizem, as histórias de como vão ganhar a guerra, é uma tentativa completamente patética de apoiar o exército ucraniano”.

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Ela se iguala, em fúria, ao mais veterano apresentador da televisão russa, Vladimir Soloviov. Quando a guerra começou e ele, sancionado, perdeu o acesso a suas duas casas de veraneio às caríssimas margens do Lago de Como, teve um ataque de fúria ao vivo, reclamando que seus direitos humanos estavam sendo transgredidos.

Soloviov fala em guerra nuclear com a tranquilidade de que está antecipando o resultado de um jogo de futebol importante.

Mostrar uma Rússia forte para o público interno e assustar o público externo faz parte da tática. Mas o inglês Francis Scarr, um especialista em russo que acompanha profissionalmente os canais russos, como monitor da BBC, notou num artigo para o Telegraph que o tom está mudando.

“Quanto mais a ‘operação militar de Putin’ se arrasta, mais ouço pretextos. A blitzkrieg que deveria durar dias está no terceiro mês”, escreveu ele.

Um exemplo: Viacheslav Nikonov, deputado pelo partido de Putin, disse que a “operação” demora mais porque os russos tomam cuidado para poupar a população civil, o que soa como uma piada sinistra diante dos crimes documentados em lugares ucranianos liberados da ocupação inimiga.

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Segundo o deputado, que é neto do “chanceler de Stálin”, Viacheslav Molotov, os ocidentais não entendem o conceito de “nobreza” demonstrado pelos russos.

“Como eu me sinto no fim do dia depois de acompanhar tanto veneno? É um martírio ouvir falar em guerra nuclear quase todo dia”, disse Scarr. 

“Quando eu me afasto da tela, enfrento o horror do sofrimento na Ucrânia”, acrescentou, lembrando que traduz entrevistas de ucranianos presos na guerra. Numa delas, um fotógrafo de casamento contou como escapou de Mariupol, onde viu crianças bebendo água de poças na rua e corpos apodrecendo ao relento, sob bombardeio incessante.

Sergei Lavrov já foi considerado “o melhor ministro das Relações Exteriores” do mundo. Hoje, qualquer pessoa decente tem um sentimento de vergonha alheia quando o ouve. O chanceler cobriu não apenas a si mesmo de vergonha com as declarações sobre o “Hitler judeu”, como aos russos que têm discernimento para ver a afronta. Quanto aos que gostam desse tipo de abominação, já perderam a vergonha há muito tempo.

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