Não é só Israel que corre contra o relógio: Joe Biden também tem prazo
Cai o apoio dos americanos a Israel e também à forma como o presidente está conduzindo a posição dos Estados Unidos em relação à guerra

As imagens constantes de bombardeios em Gaza estão funcionando para solapar o apoio da opinião pública americana a Israel, uma sustentação vital: somente os Estados Unidos, com uma participação menor do Reino Unido, garantem que o estado judeu não será lançado no isolamento global. A abstenção americana na votação do Conselho de Segurança propondo uma pausa humanitária foi uma amostra do que pode ser esse isolamento.
Apenas 32% dos consultados numa pesquisa Reuters/Ipsos disseram que os Estados Unidos deveriam apoiar Israel – uma queda pronunciada. Logo depois do ataque em massa do Hamas em 7 de outubro, com seu cortejo de horrores, o índice era de 41%.
A proporção dos que acham que “os Estados Unidos deveriam ser um mediador neutro” subiu de 27% para 39%. O que não mudou: 4% acham que o país deveria apoiar os palestinos – provavelmente todos nas universidades de elite – e 15% que não deveria se envolver.
O apoio a Israel caiu entre democratas e republicanos, um sinal de que uma parte da direita, sensível à influência de nomes como Tucker Carlson. O apresentador não tem mais a plataforma da Fox – o único canal de televisão que dá apoio total a Israel -, mas continua a influenciar um público enorme via X. Sem a mesma intensidade ferina com que ataca o apoio à Ucrânia, ele se colocou, com o habitual – embora convincente – cinismo, como defensor do não intervencionismo.
É uma posição isolacionista que tem seu apelo desde sempre, uma tendência que aumenta quando os cidadãos consideram que as dificuldades econômicas estão aumentando e não querem bancar o preço inevitável de ser uma superpotência. O pedido de ajuda adicional a Israel, de 14 bilhões de dólares, é quase irrelevante num país que tem um orçamento anual de 6,4 trilhões de dólares, mas a má vontade com gastos extras é mais conceitual do que conectada com a realidade.
Esta má vontade também aumenta devido à impopularidade do presidente. Apenas 40% dos americanos apoiam as posições que Biden assumiu em relação a Israel, num sinal de que a janela de oportunidade também vai se estreitando para ele.
Nada menos que 67% dos americanos querem que seja proclamado um cessar-fogo, uma decisão que Biden eventualmente vai forçar Israel a tomar, embora saiba muito bem que é do interesse dos Estados Unidos, bem como de seus aliados no Oriente Médio, que o Hamas seja obliterado.
Qual o ponto de equilíbrio essa obliteração e o momento em que a pressão da opinião pública se torna inescapável? Principalmente para um presidente que busca a reeleição dentro de apenas um ano e está longe do melhor dos mundos – ao contrário, aparece em empate técnico e até poucos pontos atrás de Donald Trump em cinco de seis estados-chave que definem a eleição?.
A rapidez com que as Forças de Defesa de Israel estão eliminando as estruturas de poder do Hamas pode dar algum alento a Biden – estamos falando, evidentemente, das estruturas físicas. Debaixo da terra, em sua vasta rede de túneis, o Hamas sobrevive. Sabe que Israel não dará a opção de uma retirada, como aconteceu com os remanescentes do Estado Islâmico depois que sua derradeira base, na cidade iraquiana de Mossul foi aniquilada.
Para onde poderão ir?
“Por que eles não vão para o. Inferno e se escondem lá? Por que estão escondidos entre nós?”, bradou um palestino desesperado, entrevistado no hospital Al-Shifa por um repórter da Al Jazira que imediatamente cortou a entrevista – a emissora do Catar só transmite o que é positivo para o Hamas e não quer saber de pessoas comuns exasperadas com a tática de uso de instalações civis como fachada.
Israel tomou o hospital ontem e mostrou armas que comprovariam o uso ilegítimo, inclusive uma submetralhadora escondida num aparelho de tomografia. Não foram exatamente provas contundentes. De qualquer maneira, muda pouco a posição da opinião pública americana. A guerra vai se tornando um ruído incômodo, esvai-se a empolgação que envolveu Biden por suas posições iniciais tão firmes e convincentes sobre Israel e é impossível explicar para o grande público que um cessar-fogo pode adiar em vez de abreviar uma futura acomodação. E Trump, mesmo com a chuva de processos nas costas, vai se tornando não tão inviável assim.
O relógio corre para todo mundo. O ministro das Relações Exteriores, Eli Cohen, disse há dias que Israel tem “de duas a três semanas” para completar a obliteração do Hamas, antes que um cessar-fogo seja imposto. Foi sincero demais, embora realista.