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Mundialista

Por Vilma Gryzinski
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Má hora de Putin: Bakhmut resiste, Finlândia na OTAN, assassinato político

Os astros estão alinhados contra o tirano e até mulheres bonitas levando presentes viram um perigo para russos alinhados com o regime

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 4 abr 2023, 07h33 - Publicado em 4 abr 2023, 07h21

Vladimir Putin começou a semana com dois pés esquerdos e quem lhe trouxe alívio em meio à da rajada de más notícias foi Mohammed Bin Salman, o príncipe regente da Arábia Saudita, ao liderar o corte de produção que colocará o petróleo perto dos 100 dólares.

Primeiro, no plano geral, nada da vitória repetidamente prometida em Bakhmut, a pequena cidade ucraniana cuja conquista virou ponto de honra para os russos. Prometer e não cumprir é a pior coisa que pode acontecer, fora uma derrota que colocaria os russos batendo em retirada. 

Seria uma humilhação monumental, algo no mesmo nível do recuo das forças que não conseguiram tomar Kiev logo no início da guerra, em fevereiro do ano passado. E o tiro no pé foi autoinfligido: nada em Bakhmut exigia que ganhasse a projeção que alcançou, graças, entre outras coisas, ao falastrão Evgueni Prigozhin, o fundador do Grupo Wagner, que passou os últimos meses garantindo que suas forças paralelas, com criminosos indultados na linha de frente, estavam a um passo do grande feito.

Alguns analistas suspeitam até que o alto comando russo, alvo de desbocadas críticas de Prigozhin, não está tão infeliz assim com o fracasso de Prigozhin.

Críticas desbocadas aos comandantes militares nos levam ao atentado que matou um blogueiro alinhado com essa corrente, o ex-assaltante de banco Vladlen Tatarski, nome de guerra de Maxim Fomin, um ucraniano que se declarava russo e dizia que quem não fizesse a mesma coisa sofria de doença mental.

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O atentado de domingo contra ele foi coisa de filme de espionagem. Uma mulher bonita, Daria Trepova, de 26 anos, foi ao Street Café, de São Petersburgo, levando um presente a Tatarski, que faria uma palestra, promovida por um grupo radicalmente defensor da guerra contra a Ucrânia.

Os seguranças brincaram que poderia haver uma bomba dentro da embalagem de papelão onde Daria levava um busto de Tatarski.

Quem ganhou? A mulher bonita, claro. Tatarski recebeu o presente e a bomba colocada no interior da escultura explodiu, matando-o na hora. 

Em menos de 24 horas, Daria estava presa, confessando ter levado o “presente”, algemada à tubulação de calefação de um lugar não identificado e logo colocado no Telegram, num movimento incrivelmente parecido com um serviço de inteligência tentando limpar a barra depois de ser humilhado pelo atentado no coração da “cidade de Putin”. 

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Tatarski foi combatente com as forças pró-Rússia da região separatista de Donestk, recebendo um indulto na cadeia onde cumpria pena por assalto a banco. Com a invasão da Ucrânia, virou blogueiro militar, uma categoria que abrange vários tipos de atividade, poucas delas com algo parecido com jornalismo. Tinha mais de 550 mil seguidores que se identificavam com as críticas ao comando militar e ao próprio Putin por não usarem a força total contra a Ucrânia.

Num de seus vídeos mais conhecidos, dizia: “Vamos derrotar todo mundo, matar todo mundo, roubar todo mundo que for preciso. Tudo vai ser feito do jeito que a gente gosta”.

Um atentado praticado em plena São Petersburgo é o tipo de coisa que cria insegurança e chacoalha a sensação de que a cúpula está blindada — sendo a garantia de proteção total um dos sustentáculos que amparam o poder absoluto de Putin.

Rachaduras nessa cúpula foram surpreendentemente mostradas numa conversa vazada, na semana passada, entre o bilionário Farkhad Akhmedov, e o produtor musical Iosif Prigozhin (que tem o mesmo sobrenome judaico do criador do Wagner, mas nenhum parentesco com ele).

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Na conversa, Putin é chamado de “anão”, “frouxo” e “Satã”, uma praga que ferrou com o país inteiro, “com nossos filhos e o futuro deles”. A palavra usada não é exatamente ferrou.

“São criminosos do pior tipo possível. Ele acabou com o país. Não existe futuro para nós”. Diz Akhmedov, nascido no Azerbaijão, quando ainda era parte da União Soviética, e com fortuna feita no ramo do gás e do petróleo.

“Ele enterrou a nação russa. Como vamos nos livrar disso? É uma guerra entre irmãos. Vai acabar em fascismo lá, é isso que vamos conseguir, uma ditadura militar”.

Akhmedov disse que a conversa vazada é fruto de uma montagem, mas foi unânime a reação de que ele não deveria nunca mais entrar em prédios altos nem passar perto de janelas, sendo a defenestração disfarçada de acidente uma causa mortis comum entre oligarcas caídos em desgraça.

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As notícias ruins de uma semana que mal começou culminaram com o anúncio de que hoje a Finlândia entrará oficialmente para a OTAN, encerrando o longo ciclo de “neutralidade” — uma submissão implícita desde a época stalinista, quando o país foi obrigado a entregar uma faixa de seu território e o compromisso de não se alinhar com os americanos, como a Europa Ocidental, em troca de manter a independência.

Entrar para a aliança ocidental faz parte de uma política de Estado, amplamente apoiada pela opinião pública. Não depende de quem está no governo, tanto que a jovem, bela e baladeira primeira-ministra Sanna Marin perdeu a eleição de domingo, mas o processo de adesão ao bloco ocidental seguiu da mesma maneira.

A ironia suprema é que foi Putin quem embalou, fez um laço e colocou a Finlândia de presente no colo da OTAN. Sem a invasão da Ucrânia, e o pavor que causou entre os vizinhos mais fracos da Rússia, isso não teria acontecido.

Ironia adicional: Putin e seus simpatizantes, à esquerda e à direita, alegam que foi a expansão da OTAN na antiga esfera de influência russa o motivo “real” da invasão da Ucrânia. É uma cretinice de má fé, mas tem a vantagem de dar uma explicação, mesmo que falsa, para uma dúvida existencial: por que Vladimir Putin “ferrou” seu próprio país, na expressão de Akhmedov, desfechando uma guerra inteiramente sem motivo, contra um vizinho muito menor e mais fraco que nunca, jamais poderia ser uma ameaça para um gigante nuclear como a Rússia?

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Vamos continuar a nos fazer essa pergunta por muito tempo. Mas uma coisa já parece estar clara: em vez de garantir um lugar entre os grandes vultos da nação, czares e líderes que contribuíram para a grandeza da Rússia, Vladimir Putin, o salvador da pátria que o desastroso fim do comunismo tinha catastroficamente arruinado, desmanchou seu próprio legado com uma aventura movida à arrogância proporcionada por muito poder. 

A história está cheia de personagens assim.

“Depois de ter visto isso, espero que o presidente da Rússia passe o resto de seus dias num porão usando um balde como vaso sanitário”, disse Volodymyr Zelensky depois de visitar, com o vice-primeiro-ministro alemão, Robert Yabeck, a cidadezinha de Iagdine.

Logo no começo da guerra, os invasores russos obrigaram todos os 367 moradores que não haviam fugido a ficar trancados no porão de uma escola, de 200 metros quadrados, sem banheiro. Os civis passaram 27 dias nessas condições atrozes. Onze dos mais velhos morreram por falta de oxigênio para tanta gente. Seus nomes foram escritos nas paredes do porão.

Putin pode estar aliviado com o aumento do preço do petróleo e até relativamente satisfeito com uma guerra que os ucranianos não perdem, mas também não ganham. Mas quem tem sequer uma gota de sede de justiça no coração não pode deixar de desejar para ele o destino almejado por Zelensky.

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