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Por Vilma Gryzinski
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É Trump uma vítima da justiça politizada? Muitos indícios apontam que sim

À véspera de um acontecimento transcendental como um ex-presidente americano tornado réu, até adversários reconhecem que o caso contra ele é fraco

Por Vilma Gryzinski 3 abr 2023, 07h17

Às 2,15 horas da tarde de amanhã, Donald Trump se apresentará a uma autoridade judicial de Nova York, entregará seus pertences, depois vai tirar as impressões digitais — “tocar piano”, na gíria policial —, e ser fotografado com aquele visual de criminoso. Perante o juiz do caso, ouvirá as acusações que o levam ao banco dos réus. Com toda certeza, se declarará inocente de todas elas. É e provável ouvir uma ordem que o proíbe de falar a respeito do processo, o pior de todos os castigos para um homem como ele.

Durante todos esses procedimentos, será acompanhado pelos agentes do Serviço Secreto que não podem se afastar de um ex-presidente sob sua guarda em momento algum.

As algemas a que ele até gostaria de ser submetido, para completar a imagem de mártir de uma perseguição política que chegou ao poder judiciário — lawfare, lembram-se de quando a esquerda recorria ao termo em inglês para produzir seus perseguidos? —, não serão usadas.

Mesmo quem não suporta o ex-presidente e tem engulhos ao divisar a cabeleira tingida de loiro, ouvir a voz insolente e ver as mãos com os dedos encolhidos, imitando canhestramente o clássico punho fechado, tem a obrigação, se quiser seguir os fundamentos de honestidade intelectual, de reconhecer que ele não estaria nessa posição se não se chamasse Donald Trump. Ser o mais provável candidato pelo Partido Republicano a tentar de novo a Casa Branca complica mais ainda a coisa.

“É muito triste que muitas pessoas estejam pensando que o estado de direito não funciona do jeito que deveria”, disse Joe Machin, o senador dissidente do Partido Democrata. “Ninguém deve estar acima da lei, mas a lei também não deve perseguir ninguém”.

Até o Washinton Post, que fez de sua razão de existir derrubar Trump, tendo conseguido o objetivo com a derrota eleitoral de 2020, reconheceu em termos excepcionalmente claros que o caso apresentado contra ele pelo promotor distrital Alvin Bragg é inconsistente e arriscado.

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Bragg, resumidamente, está usando como sustentáculo jurídico o pagamento, em 2016,  de 130 mil dólares a uma atriz do ramo pornográfico, Stormy Daniels, para comprar seu silêncio sobre um encontro sexual com Trump. Quer transformar a transação, um delito eleitoral prescrito — o de uso de dinheiro das empresas Trump, não declarado como gasto de campanha, para reembolsar o advogado trambiqueiro Michael Cohen, o intermediário do dinheiro —, num crime cuja alçada é da justiça federal.

Ninguém sabe ainda quantas balas na agulha tem o promotor, um cargo eleito por voto direto em Nova York. Foram suficientes para convencer um grande júri, um órgão formado por 16 a 23 cidadãos comuns, de que o acusado deveria ser levado a julgamento (uma característica da justiça americana; no Brasil, é uma atribuição do juiz; o corpo de jurados que decide sobre a culpa ou inocência de um acusado é “petit”, pequeno em francês, com seis a doze integrantes).

Existe algum consenso entre especialistas de que o promotor, da turma dos juristas ativistas, beneficiado com doações da família Soros em sua campanha eleitoral, quer fazer uma gambiarra, transformar um caso duvidoso, envolvendo uma mulher que vive do sexo pago e um advogado cumprindo pena de cadeia, num julgamento escandaloso que destrua Trump.

“É uma estratégia nova e as os tribunais podem encará-la com ceticismo. Mais ainda, a acusação envolvendo potencialmente o financiamento de campanha é movediça”, escreveu o corpo editorial do Post. 

“A não ser que vocês sejam grandes jogadores de pôquer, não entendem o que estamos fazendo”, provocou Bragg em entrevista no ano passado ao New York Times.

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Contra Trump, pesam numerosas investigações e ações judiciais, a imagem de que como empresário fazia truques escusos e como presidente foi mais adiante ainda. O caso mais complicado é a investigação feita pelo Departamento de Justiça sobre potenciais crimes ao incitar a multidão de apoiadores a tomar de assalto o Capitólio, sede do poder legislativo, em 6 de janeiro de 2020. A dureza, e até exagero, da justiça nesse caso pode ser o motivo das manifestações pequenas a favor de Trump, pelo menos até agora.

Outra investigação que ressurgiu: a dos documentos sigilosos levados por Trump da Casa Branca e encontrados, com grande alarde, no palacete onde mora agora na Flórida.

Obviamente, imagem e inquéritos em andamento significam nada num processo em que a promotoria tem que provar a culpa do acusado num crime grave (e não este comprovar sua inocência, como disse, absurdamente, a ex-presidente da Câmara, Nancy Pelosi).

A favor de Trump, alinha-se a formidável coleção de acusações a que o ex-presidente, submetido a dois processos de impeachment, não só sobreviveu como viveu para ver serem impressionantemente desmentidas. A começar pelo infame dossiê “secreto” que o apontava como alvo de chantagem da Rússia, via casos como a mitológica “chuva dourada” produzida por prostitutas russas num quarto de hotel de Moscou, ou até um colaborador voluntário de Vladimir Putin.

Tudo mentira. Aliás, teria bastado ler o dossiê, com olhos imparciais, para ver que era absurdo. Em vez de fazerem isso, grandes órgãos da mídia se empenharam em fazê-lo passar por autêntico e foram até premiados por isso. Mais de cinquenta nomões do alto escalão das agências de informações, pessoas que deveriam saber tudo, inclusive o que não poderia chegar ao público comum, simplesmente mentiram ao garantir que Trump estava jogando sujo com Joe Biden no caso do computador encontrado com informações comprometedores de seu filho Hunter. Era contrainformação russa, alegaram equivocadamente os honrados chefões.

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O imposto de renda que ele brigou tanto para não ser divulgado? Deu em nada.

A acusação que levou ao primeiro impeachment, de que estava forçando um presidente Volodymyr Zelensky, ainda não transformado por Putin em herói nacional, a apresentar informações comprometedoras contra Joe Biden e seu filho Hunter? Nada.

Pior: os bons negócios fechados por Hunter Biden usando a influência do nome do pai quando ele era vice-presidente ficaram comprovados com a exposição do conteúdo do computador que os antitrumpistas garantiram ter sido inventado.

Trump é um vilão para os que acreditaram em tudo isso porque já achavam mesmo que ele era o fim da picada, uma vergonha para os Estados Unidos. E um herói para os partidários que o veem como um improvável inimigo do establishment, um milionário e apresentador de reality show que ousou expor “os de sempre” no controle dos mecanismos do poder.

Serão estes, mais uma vez, confirmados em sua crença de que existe um grande complô de forças poderosas para destruir Trump ou seus inimigos conquistarão finalmente a vitória na justiça que os eludiu até agora?

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Estamos diante de um herói com cara de vilão ou de um vilão mesmo? Ou uma mistura das duas coisas, como costuma ser mais frequente quando estão envolvidos seres humanos aos quais o destino aloca grandes quantidades de poder?

Elon Musk já disse, com a autoridade de megabilionário visionário, que Trump será reeleito por causa do processo de Alvin Bragg, um promotor tão à esquerda que já rebaixou a gravidade de 52% dos crimes comuns que passaram por sua caneta.

Ele é tão condescendente com criminosos que o senador Lindsay Graham fez piada, inconveniente, mas com um toque de verdade: se Trump quisesse se livrar do processo, a caminho do tribunal deveria “quebrar umas vitrines, roubar umas lojas e esmurrar um policial” — todos casos que o promotor ativista seria, potencialmente, inclinado a arquivar.

O fato de que tantas outras acusações contra Trump deram em nada não significa que dessa vez ele não se estrepe. Ainda mais numa cidade onde os bonés vermelhos são quase raridades e a votação no Partido Democrata é esmagadora.

O caso é, obviamente, monumental e abre mais dúvidas ainda sobre a eleição presidencial do ano que vem. As pesquisas ainda estão embaçadas. Nas mais positivas para Joe Biden, o presidente tem 48% dos votos (38% nas mais negativas). Trump oscila quase que exatamente na mesma proporção.

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Uma atriz pornô que está comemorando o aumento da compra de souvenirs no seu site por causa da ação judicial e agora é ouvida como comentarista política; um advogado que prometia levar um tiro em lugar do chefe, mas se tornou seu delator; um promotor negro que quer sangue; um ex-presidente que desafia todas as normas de comportamento consensuado e um presidente em exercício que vive deixando escapar mostras de senilidade formam um conjunto de personagens como nunca se viu na história.

Only in America, costumam dizer os americanos quando alguma coisa muito absurda, boa ou ruim, acontece.

Só mesmo nos Estados Unidos. 

Embora existem países que tentam fazer uma boa imitação.

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