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China tentou manipular Brasil contra Estados Unidos, diz acadêmico

Numa palestra de 2016, o professor Jin Canrong deu detalhes do plano, depois abandonado, para criar um quarto adversário da potência americana

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 29 mar 2021, 09h17 - Publicado em 29 mar 2021, 07h08
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  • Xi Jinping cumprimenta Jair Bolsonaro
    Xi Jinping em visita: “Se os Estados Unidos tiverem quatro inimigos, perdem o rumo”, avaliou professor - (Mikhail Svetlov/Getty Images)

    A China está manifestando de forma cada vez mais agressiva a animosidade em relação aos Estados Unidos, parte de um plano estratégico de disputa pela hegemonia mundial.

    E poucos porta-vozes dessa política confrontacionista são mais conhecidos no Ocidente do que o professor Jin Canrong, diretor do Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Renmin, em Pequim.

    Em inglês fluente, o professor fala de forma explícita aquilo que a ofensiva política de Estado promove por trás de um discurso cor-de-rosa que fala em cooperação e resolução pacífica de conflitos.

    Numa palestra de 2016, só agora divulgada no Ocidente, ele discorreu amplamente sobre os métodos usados pelo regime chinês para sobrepujar os Estados Unidos.

    O projeto tem dois fundamentos: enfraquecer os Estados Unidos internamente e através de desafios externos e aumentar o poder econômico, militar e diplomático da China.

    Na parte que mais nos interessa, envolvendo o Brasil: faz parte da “missão estratégica” do Partido Comunista Chinês garantir que os Estados Unidos tenham pelo menos quatro grandes adversários externos.

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    “Se os Estados Unidos tiveram quatro inimigos, perdem o rumo”, resumiu ele, em tom excepcionalmente franco.

    “O terrorismo é definitivamente um inimigo dos Estados Unidos. A Rússia parece ser outro. Definitivamente, os Estados Unidos nos veem como um competidor. Mas não basta.”

    Entra aí o papel que o regime chinês via para o Brasil. Segundo o professor, durante alguns anos, o regime chinês tentou transformar o Brasil no quarto adversário dos Estados Unidos.

    Para ter o apoio do Brasil em fóruns internacionais, disse ele, a China decidiu fazer grandes investimentos em infraestrutura, inclusive na ferrovia ligando portos brasileiros ao Peru – todo mundo sabe de que governo era esse projeto.

    A primeira visita de Xi Jinping ao Brasil foi ligada à grande estratégia de cooptação do Brasil. Mais interessante ainda, segundo Jin Canrong: o regime chinês desistiu “porque o Brasil não quer ser melhorado”.

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    A criação de um quarto adversário é uma das quatro partes do plano de enfraquecimento dos Estados Unidos e sua substituição pela China como potência hegemônica, uma disputa que Jin Canrong compara à de uma empresa.

    Os Estados Unidos, nessa analogia, são o presidente da empresa, e a China é o vice. “Um homem de meia idade, de boa aparência, com altas capacidades e apoio dos funcionários”.

    Para ser substituído, “primeiro, precisamos criar as condições para facilitar que os Estados Unidos cometam erros. Segundo, precisamos torná-lo tão ocupado que se sinta deprimido e queira cair fora. Terceiro, precisamos nos tornar tão interligados com os Estados Unidos que eles não possam nos atacar”.

    Além da criação do quarto elemento de oposição aos Estados Unidos, temporariamente suspensa depois que os chineses desistiram de colocar o Brasil nesse papel, outros métodos incluem a interferência no processo eleitoral; o progressivo controle do mercado americano – “mais aberto do que o japonês e os europeus” – e a criação de problemas em frentes internacionais que suguem recursos e desviem a atenção da China.

    Como exemplo de problemas formidáveis, “completamente sem valor estratégico, Jin Canrong mencionou as intervenções no Afeganistão e no Iraque, que custaram “6 trilhões de dólares e 10 mil vidas”.

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    A palestra recuperada do acadêmico, que é consultor da direção do Partido Comunista Chinês, ganha atualidade diante dos movimentos recentes da China para eliminar qualquer anseio democrático em Hong Kong e apertar os parafusos em relação a Taiwan.

    Detalhe:  o professor Jin Canrong previu que 2021 seria um ano decisivo para a questão de Taiwan, a ilha onde buscaram refúgio as forças nacionalistas derrotadas em 1950 na guerra civil contra os comunistas.

    A nova agressividade da China ficou estrondosamente clara no encontro no Alaska em que o enviado chinês, Yang Jiechi, fez picadinho do novo secretário de Estado americano, Tony Blinken, um experiente assessor íntimo de Joe Biden.

    Entre outras coisas, ele disse que americanos negros estavam sendo chacinados – uma mentira absurda, embora existam até americanos que acreditam nela.

    Blinken deveria ter se levantado e saído, mas continuou diplomaticamente a ouvir o esculacho, numa demonstração de autocontrole que, do ponto de vista chinês, só pode ser interpretada como sinal de fraqueza.

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    Intervalo para descontrair: a intérprete de Blinken tinha cabelo pintado de roxo, o que foi considerado pelo campo anti-Biden como um caso ridículo de inadequação à função.

    Em compensação, a intérprete chinesa chamou a atenção pela beleza e virou meme. Várias frases de Yang Jiechi também correram as redes sociais e acabaram em camisetas, numa celebração nacionalista.

    O nacionalismo insuflado oficialmente também provocou a retirada em massa de cantores e atores contratados para fazer campanha por grandes multinacionais como Nike, Adidas e a rede de lojas H&M.

    Numa verdadeira manobra de guerra de propaganda, o regime chinês desencavou declarações dessas empresas comprometendo-se a não usar algodão proveniente Xinjiang, a província onde a minoria étnica uigur sofre uma feroz repressão.

    Prisioneiros nos campos de reeducação fazem trabalhos forçados.

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    A questão uigur é complexa. Como muçulmanos, alguns foram suscetíveis à radicalização fundamentalista que se propagou em tantos outros lugares e houve episódios sucessivos de ataques a facadas contra chineses han, a etnia dominante.

    Além de perder seus garotos propaganda, as empresas envolvidas também foram removidas das plataformas de venda, o que equivale a um boicote letal.

    “A H&M pode continuar a ganhar dinheiro no mercado chinês? Não mais”, explicitou Xu Guixiang, porta-voz do governo regional. Com o exagero que agora caracteriza as antes cautelosas manifestações oficiais, ele disse que as denúncias de abusos e trabalhos forçados em Xinjiang são “as acusações mais falsas da história da humanidade”.

    Ataques táticos como esse fazem parte da grande estratégia chinesa, assim resumida pelo sempre sincero professor Jin Canrong: “Nós queremos ser o líder mundial”.

    Se os chineses desistiram de transformar o Brasil no quarto foco de atrito para os Estados Unidos, com toda certeza continuam a ter muitos planos para o país na ordem mundial que estão rearranjando segundo seus interesses.

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