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Aliyev: muçulmano aliado de Israel exalta petróleo em cúpula ecológica

O presidente do Azerbaijão é o homem das alianças que parecem impossíveis e trata reservas fósseis como 'bênção de Deus'

Por Vilma Gryzinski 14 nov 2024, 08h09

Imaginem uma reunião de cúpula para tratar da transição ecológica e o homem menos habilitado do mundo para ser o anfitrião. Foi o que aconteceu na COP29 no Azerbaijão. Ilham Alyev não é exatamente o tipo que tenta se passar por ecologicamente correto. Ao contrário, exaltou como “bênçãos de Deus” as reservas de gás e de petróleo que fizeram a fortuna de seu país – e de sua família também. E aproveitou para mandar um recado sem o menor disfarce aos “hipócritas” que compram seus combustíveis fósseis e querem dar lição de moral ao país.

“Infelizmente, o duplo padrão, o hábito de passar sermão em outros países e a hipocrisia política tornaram-se o modus operandi de determinados políticos, ONGs controladas por estados e a mídia fake news em alguns países ocidentais”, disse ele a um público estarrecido.

Também aproveitou para espetar a França, acusando-a de degradação ambiental pelos testes nucleares do passado em territórios do Pacífico e o “regime” de Emmanuel Macron de ferir e matar cidadãos que protestavam na Nova Caledônia. A representantes francesa sumiu do mapa desde então.

Aliyev bate duro e ao mesmo tempo explora uma incrível capacidade para fazer alianças aparentemente impossíveis, incluindo uma cooperação próxima com a União Europeia, a Rússia, Israel, a Organização da Cooperação Islâmica e outros atores políticos aparentemente incompatíveis.

Aliyev é a própria encarnação do conceito de que países não têm amigos, têm interesses. Ou, na frase mais elaborada de Lorde Palmerton, duas vezes primeiro-ministro no século XIX, no auge do império britânico, quando elaborou: “Não temos aliados eternos nem inimigos perpétuos. Nossos interesses são eternos e perpétuos, e nosso dever é perseguir esses interesses”.

“FOI IDEIA DELES”

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O presidente do Azerbaijão pode ser acusado de muita coisa, inclusive de ter o poder eterno e perpétuo, mas não de não perseguir uma visão clara dos interesses de seu país, com suas grandes reservas de petróleo e gás.

“Os países não deveriam ser acusados por tê-los e por trazer esses recursos ao mercado porque o mercado precisa deles. As pessoas precisam deles”, disse no discurso excepcionalmente franco.

Ele estava particularmente injuriado com os países europeus que correram para fechar acordos de compra de gás, sob o risco de grave paralisação depois da ruptura dos laços – e dos contratos – com a Rússia, por causa da invasão da Ucrânia.

“Não foi uma ideia nossa. Foi uma proposta da Comissão Europeia”.

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“Precisavam de nosso gás devido à mudança na situação geopolítica e pediram nossa ajuda”.

GUARDA FEMININA

Aliyev conhece seu público. Tem experiência na distribuição de recursos entre políticos de entidades europeias para promover os interesses do Azerbaijão. O método ganhou até um nome revelador, “Diplomacia do Caviar”. Envolve mais do que latas das raras e caras ovas de esturjão vindas do Mar Cáspio.

A engenhosidade, digamos, é de família: ele é filho de Heydar Aliyev, que integrava a KGB e foi o líder do Partido Comunista na época em que o país era uma das repúblicas soviéticas, posições que aproveitou para se tornar o todo-poderoso local depois do desmanche do comunismo e de um conveniente golpe de estado.

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Nem é preciso dizer que métodos usou – entre os quais, uma guarda feminina de “voluntárias” que prestavam serviços não exatamente de segurança – e a mão de ferro exercida para legar o poder ao filho.

A cooperação com Israel vem dessa visão, digamos, pragmática, baseada essencialmente em interesses de segurança. Por causa deles, uma parte não fala da outra quase nunca. Pelo menos, publicamente, Em particular, vazamentos da diplomacia americana mostraram que Aliyev comparou o relacionamento com Israel a um iceberg: “Noventa por cento estão abaixo da superfície”.

CARTAS FORTES

O maior choque internacional do Azerbaijão é com a Armênia por causa do território de Nagorno-Karabakh. Toda a população armênia teve que deixar o enclave em território do Azerbaijão, uma das grandes injustiças que acontecem em lugares praticamente ignorados pelo resto do mundo. A Rússia, tradicional protetora da Armênia cristã, preferiu se entender com o Azerbaijão, com quem tem uma aliança mais forte.

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Aliyev saiu por cima e lá pretende continuar enquanto durarem as reservas de petróleo que dão cartas fortes a um país fraco como o Azerbaijão no jogo geopolítico – e elas são calculadas em sete bilhões de barris, o que dá um bocado de dinheiro para um lugar se saída para o mar aberto com apenas dez milhões de habitantes.

O presidente eterno exaltou que representantes de 196 países participaram da COP29, incluindo “oitenta presidentes, vice-presidentes e primeiros-ministros”.

“Como presidente da COP29 é claro que seremos fortes defensores da transição ecológica. Mas ao mesmo tempo temos que ser realistas”, discursou aos visitantes o presidente conhecido pelo bigodão e o cabelo arruivado – indício de origem curda, especula-se.

Botem realismo nisso.

A próxima cúpula climática é no Brasil e Antonio Guterres, o cada vez mais descompensado secretário-geral da ONU, avisou todas as empresas, entidades financeiras, cidades e regiões do mundo para terem um plano de transição ecológica até lá. Enquanto isso, o vice-ministro da Energia do Azerbaijão, Elnur Soltanov, promovia contratos de venda de gás e petróleo.

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