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Paula Hawkins, a autora de ‘Garota no Trem’: nada de mulherzinha

Escritora com mais de 20 milhões de exemplares vendidos, a britânica fala como lida com as sombras quando cria e da presença feminina na literatura hoje

Por Maria Carolina Maia Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 set 2017, 09h15 - Publicado em 9 set 2017, 07h13

Paula Hawkins usa do bom humor inglês – nascida há 45 anos no Zimbábue, antiga colônia britânica, ela estudou em Oxford e acabou por se instalar na Inglaterra, onde mora até hoje – para falar de seus livros e da sua relação com a literatura. Mesmo a comparação de seu best-seller A Garota no Trem, que vendeu mais de 20 milhões de exemplares pelo mundo, 250 000 só no Brasil, e ganhou uma adaptação para o cinema com Emily Blunt à frente do elenco, com o fenômeno Garota Exemplar, da americana Gillian Flinn, não chega a irritá-la, embora não a agrade. Mas é só parar de falar e Paula fica séria, como se não desejasse estar ali. E na verdade não deseja mesmo – entrevistas eram, para ela, a pior parte de ser jornalista, profissão que exerceu por quinze anos, e são hoje a pior parte de lançar um livro.

Paula gosta mesmo é de escrever. Mesmo que isso signifique desenvolver histórias de crime, traição, dor e trauma. Ao escrever, entra em contato com temas que adora acessar desde que era criança e consumia contos de fada, e também consigo mesma. Em conversa com fãs na Bienal do Livro do Rio, evento em que divulgou seu segundo romance, o thriller Em Águas Sombrias (Record), reconheceu que Rachel, a protagonista perdida e alcoólatra que testemunha um desaparecimento em A Garota no Trem, tem algo dela mesma. “Você quer saber se eu bebo demais? Bem, às vezes”, disse, brincando, diante da pergunta sobre a inspiração para a personagem. “Mas posso dizer que Rachel é quem eu teria sido se a minha vida não tivesse tomado o rumo que tomou”, disse. “Todos conhecemos alguém como ela.”

A VEJA, Paula Hawkins fala de seus livros, de sua relação com a literatura e de como enxerga uma presença maior das mulheres no meio literário hoje.

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Antes do sucesso de A Garota no Trem, você escreveu quatro livros românticos com o pseudônimo de Amy Silver. Por que resolveu mudar de gênero? Eu fui contratada para escrever um livro por editores que já tinham a story line desenhada e as ideias para as personagens. Como já estava tudo traçado, eu escrevi rápido, coisa de oito semanas. Foi interessante a experiência, mas não eram minhas ideias e meus personagens, então achei melhor assinar com outro nome. Depois, vieram outras encomendas, acabaram sendo quatro livros, e nos outros eu pude criar mais, mas nunca me senti confortável nesse gênero. Não sou leitora de comédia romântica. Sou mais de suspense, do sombrio, da infelicidade, das histórias assustadoras. O quarto livro foi muito mal recebido e então eu decidi que aquilo não fazia mais sentido para mim e que era hora de escrever as histórias que eu queria contar. Eu já tinha algumas ideias e escolhi uma delas, que era a de A Garota no Trem. Então passei a assinar com meu nome verdadeiro.

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Escrever esses livros teve alguma serventia para o que você faria depois? Com certeza. Sentar diante de um computador e escrever um romance inteiro é uma coisa muito difícil. Antes desses livros, eu comecei outros que abandonei. Com esses quatros, aprendi a traçar uma story line, compor cenários e personagens. Sem isso, talvez nunca tivesse escrito A Garota no Trem.

Como é sua rotina hoje? Sou bastante disciplinada. Acordo cedo, escrevo pela manhã e à tarde leio, faço pesquisa. Para escrever A Garota no Trem, levei um ano, mas foi um trabalho sem interrupções, no início eu estava obcecada pela história e passava longos dias apenas escrevendo. Hoje, preciso fazer turnês de divulgação, viajar, dar entrevistas, trabalhar na adaptação para o cinema, e isso torna o processo mais moroso, não consigo escrever todo dia. Em Águas Sombrias levei três anos para terminar. Para escrever, preciso de paz e de solidão.

O que a interessa nas histórias de suspense, a psicologia do crime? Bem, não sou dessas escritoras que descrevem extensamente atos de violência e tortura, estou mais interessada em saber por que as pessoas se comportam de maneira violenta e como se recuperam – ou não – de uma experiência traumática. Quero investigar os efeitos de um trauma e entender por que pessoas que levam uma vida completamente normal de repente cometem um crime. Tenho uma imaginação sombria, um pendor por tramas apavorantes que vem da infância, quando ouvia histórias de fantasmas ou contos de fadas em que aconteciam coisas horríveis.

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Como ficar imune à carga pesada dos livros? Escrever e me colocar no lugar das personagens me ajuda a me conhecer melhor, é um processo de autoconhecimento também, portanto. Nesse sentido, embora eu nunca tenha feito terapia, acredito que seja terapêutico. Talvez seja assim que eu me mantenha normal (risos).

Por que trabalha com múltiplos narradores? Nos dois livros, esse me pareceu o melhor jeito de contar a história que eu queria escrever. Eu não começo com o narrador ou os narradores, penso primeiro na história que quero contar e então na melhor maneira de fazê-lo. Em Águas Sombrias tem onze narradores, o que não era a minha intenção inicial, eu pensei em trabalhar com dois ou três. Mas, à medida que eu escrevia, percebi que precisava de mais vozes para compor a trama. Era também uma forma de colocar o leitor no meio do caos que se forma na cidade com o desaparecimento da Nel, e deixar que ele decida quem está falando a verdade. Não é algo que eu necessariamente vou continuar fazendo, até porque dá um trabalho enorme.

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A Garota no Trem é muito comparado a Garota Exemplar, de Gillian Flynn. Você leu Garota Exemplar antes de escrever o best-seller? Eu não havia lido Garota Exemplar antes de começar A Garota no Trem. Mas li em algum momento, enquanto escrevia. Fui uma das primeiras leitoras do livro, que se tornou um fenômeno no Reino Unido. Eu amo Garota Exemplar, é um grande livro, e também a protagonista, Amy, mas ela é muito diversa da Rachel, a minha protagonista. Amy é forte, tem controle sobre tudo, orquestra tudo, enquanto Rachel é desesperançosa, caótica, frágil, incapaz de controlar qualquer coisa. Acho que a comparação tem a ver mais com o fato de haver a palavra “garota” no título, serem thrillers e serem escritos por mulheres.

A comparação, que tem como denominador comum o rótulo domestic thriller, a incomoda? A comparação não me ofende, e foi até boa para mim. E eu até entendo por que jornalistas e profissionais de marketing precisam criar rótulos. É útil colocar coisas em caixa e fazer indicações do tipo, “Se você gostou desse livro, pode gostar daquele”. Esses dois livros têm uma protagonista inconfiável e contam histórias de casamento com muito suspense. Mas eu sinceramente não sei se funciona bem. O adjetivo doméstico remete a algo íntimo, próximo do coração, e tem tanta coisa que pode ser relacionada com isso. Mesmo A Garota no Trem e Garota Exemplar têm muitas diferenças entre si.

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Você acredita que haja mais livros com histórias sobre casamentos hoje ou é um tema recorrente da literatura? Provavelmente, sempre houve livros sobre casamento. Mas nos tornamos mais atentos a eles agora, que se tornaram tendência e têm ganhado espaço no noticiário e nas lojas, estamos cercados por eles. Não é estranho que a gente se interesse por esse tipo de livro. Afinal, boa parte das pessoas é casada e tem essa sensação de não conhecer de verdade o parceiro ou a parceira. É por isso que essas histórias devem ser contadas.

Você acha que as mulheres são mais representativas na literatura hoje? É difícil dizer. Tenho certeza de que há mais mulheres publicando no Reino Unido hoje do que há cinquenta anos. As mulheres estão competindo em um campo mais planificado, ao menos no mercado britânico. Em termos de histórias criminais, no entanto, o Reino Unido tem uma forte tradição feminina, com Agatha Christie, PD James, Ruth Rendall, que sempre foram muito respeitadas. Eu sou sortuda de contar com esse lastro. Mas, de fato, há mais foco em histórias sobre mulheres agora.

Seu segundo livro se passa em uma pequena cidade fictícia e trata de mulheres que são vítimas de violência. Na sua opinião, o problema é universal ou tende a ser mais dramático em localidades pequenas? Acredito que seja universal, mas nas pequenas cidades há um esforço maior para esconder as coisas, porque é mais fácil saber o que o seu vizinho fez ou está fazendo. Nas grandes cidades, os objetos e as pessoas se perdem com facilidade, desaparecem e não deixam pistas.

Sobre o que será seu terceiro livro? Espero trabalhar nele assim que voltar a Londres. Não posso dar detalhes, mas, sim, vai ser outro thriller psicológico, e de novo sobre uma mulher a quem acontecerá algo terrível.

A escritora britânica Paula Hawkins
A escritora britânica Paula Hawkins em entrevista ao site de VEJA, no Hotel Maksoud Plaza (Ivan Pacheco/VEJA)
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