Borges está na biblioteca. Não poderia, aliás, ser outro o lugar. O argentino Jorge Luis Borges (1899-1986), considerado um dos maiores escritores do século XX em todo o mundo, é protagonista de uma descoberta feita na Biblioteca Nacional da Argentina, onde foi diretor por 18 anos. Estão ali, ainda agora, cerca de 1.000 livros marcados a mão pelo escritor, além de um poema desconhecido que, na opinião de um dos descobridores, é uma peça do “primeiro Borges, o mais íntimo, quase erótico”.
“A esperança/como um corpo de menina…”, diz o texto, incluído no livro Borges, Livros e Leituras, uma obra de 400 páginas editada pela própria Biblioteca Nacional, e ainda sem previsão de lançamento no Brasil. Os versos e as anotações que compõe o livro foram garimpados por mais de cinco anos da coleção de 2.000 títulos que Borges doou à instituição, depois de deixar sua direção e seguir para o exílio. Opositor do governo de Juan Perón, que julgava um demagogo, o escritor passou quase vinte anos fora da Argentina, entre 1955 e 1973.
Outros títulos do acervo da instituição também foram objeto de análise dos pesquisadores. Fã de livros e de bibliotecas – para ele, a ideia de um conjunto de livros distribuídos em estantes era uma das melhores metáforas possíveis de conceber -, Borges poderia ter deixado sua digital em qualquer página que tivesse tocado.
Vale dizer que essa é uma notícia capaz de ecoar mundo literário afora. Eleito pelo poderoso crítico Harold Bloom um dos 26 autores que marcaram a literatura universal, Borges é lido e conhecido em toda parte. Em matéria recente sobre o legado da escritora Agatha Christie, a revista The New Yorker cita o argentino – chamando-o apenas de Borges, na maior intimidade, assim como os brasileiros chamam Clarice Lispector somente de Clarice. É que Borges, além de um apaixonado por bibliotecas, livros, metáforas e pela academia, foi também um fã – subversivamente criativo – do gênero detetivesco.