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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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O oito de janeiro, as instituições e o abismo da sociedade brasileira

O cientista político Rodrigo Silva faz uma análise para a coluna um ano após a tentativa de golpe orquestrada pela extrema-direita

Por Rodrigo Silva
Atualizado em 10 jan 2024, 00h28 - Publicado em 7 jan 2024, 14h19

8 de janeiro completa um ano. As teses são variadas sobre o que se passou de lá pra cá, mas três delas seguem firmes – ao menos em teoria. A primeira é a de que as instituições foram e se mantiveram fortes. Em segundo lugar está a ideia de que a democracia resistiu e o golpismo foi estancado. Por fim, a de que a sociedade continua polarizada e “calcificada” em suas posições. Uma delas parece seguir quase intacta.

A ideia de que as instituições estejam fortes talvez seja difundida mais por elas próprias do que pela opinião pública ou pelos especialistas.

O conceito de instituição é complexo, mas alguns pontos são fundamentais, mesmo que extensivamente simplificados: instituições políticas definem as regras do jogo, mediam conflitos, procuram criar uma cultura para os atores políticos envolvidos, na mesma medida em que criam um sistema de freios e contra pesos para evitar excessos e manter uma certa ordem. Obviamente que tudo isso perpassa outros conceitos como os de poder, de governança etc.

Se são fortes? Não sei. Instituições políticas no Brasil parecem aquele amigo que a gente encontra, pergunta se está bem – normalmente você já sabe a resposta porque outros amigos também já disseram que ele não estava tão bem assim – mas você acredita que uma hora ele vai ficar. Até porque a vida é assim, difícil mesmo. Ou seja, não está tão bem, mas está ali, continua resistindo e segue tentando. Vai que uma hora fica. Importante é estar ali.  

A eterna pergunta de que “as instituições são fortes?” remete à pergunta retórica ao amigo, e cria a dúvida se de fato elas são tão fortes assim.

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De concreto, as instituições aguentaram 4 anos  de  Bolsonaro (um intensivo e tanto), resistiram ao 8 de janeiro (intensivão forte) e seguimos por aqui. Até aí merecem méritos, porque andam resistentes, vigilantes e resilientes, mesmo que cambaleando entre idas e vindas – haveria um mar de objeções da última década quando elas faltaram ou foram coniventes com situações nada republicanas. E mais: teríamos de entrar na própria pluralidade do termo “instituições”, ou seja, são várias, ora umas cumprem com sua função, ora não. A conversa seria longa.

Sobre a democracia, a questão é complexa tanto quanto a primeira. Democracias são frágeis, umas mais do que outras. Até porque o conceito de democracia é amplo e igualmente extenso. Resumidamente: democracias permitem competição, inclusão e contestação pública, bem como garantem direitos individuais. A lista, claro, também seria longa e o debate mais ainda.

Se somos uma democracia? Estamos elencados como tal, embora tenhamos caído no ranking (Considerando o V-dem publicado no começo do ano de 2023 e levando em conta os anos de 2015 até 2022, portanto do impeachment de Dilma Rousseff até o ápice com a eleição de Bolsonaro em 2019). O mesmo instituto elenca a guinada que poderia se dar com a eleição de Lula, mas o processo certamente é e será complicado. Por quê? Daí voltamos à tal polarização.

Está aí a tese inabalada: a sociedade de fato se polarizou e está arraigada em suas posições. De tudo sobre o que se discute sobre o 8 de janeiro, essa marca terrível da história recente do Brasil, parecem ser os dados trazidos por Felipe Nunes e Thomas Traumann (Biografia do abismo) os mais complexos para olhar para os próximos anos.

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Vale um dado para ver como o problema é bem difícil: o índice de polarização afetiva é o maior desde 2002 quando era 4,36 e em 2022 chegou a 6,92. O índice varia de 0 a 10 e quanto mais próximo de 10, mais intolerante é. De resumo da obra, algo é latente e exemplifica esse número: o debate de valores está colocado e uma visão de mundo se impõe sobre a visão do outro, sem que ninguém ceda.

Sobre o golpismo, ele parece ter sido estancado, ao menos em parte, mas continua  vivo, bem vivo. Os dados estão aí. Porque se vencido os arroubos antidemocráticos do bolsonarismo, sobram dois lados (nada equivalentes, claro) de pessoas que pouco querem falar. Estão calcificados, para usar a expressão dos autores.

Democracias e instituições precisam de clima, de uma cultura para sobreviver, até porque elas precisam criar condições de incluir, contestar, mediar, permitir que disputas sejam possíveis e saudáveis. Os altos escalões parecem convencidos disso – parte deles. Os números não mostram que isso seja possível na sociedade brasileira, que está diante de um abismo em termos de diálogo. Resta saber se isso será reversível.

* Rodrigo Silva é cientista político e historiador, doutorando e mestre em Ciência Política (UFPR).

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