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Matheus Leitão

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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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A crise Yanomami e as novas ações do governo Lula

A Rodolfo Capler, porta-voz do Ministério dos Povos Indígenas diz que genocídio contra a etnia está sendo apurado e descreveu as ações da gestão petista

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 17 fev 2023, 21h15

A crise sanitária e humanitária dos Yanomami resultou – segundo o governo federal – na morte de ao menos 570 crianças. Vitimadas por desnutrição, malária, pneumonia, verminose e, sobretudo, por omissão de socorro por parte do governo Bolsonaro, o povo yanomami clama por justiça. Mais de 50% das crianças indígenas estão subnutridas, correndo sérios riscos de vida. Conforme Eloy Terena, secretário executivo do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), “houve uma fragilização do sistema de saúde nas comunidades indígenas, com o abandono de postos de saúde em regiões sob controle dos garimpeiros, bem como a ocupação de pistas de pouso comunitárias pelo garimpo.”

Terena, que além de antropólogo, também é doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), alega que há forte possibilidade de ter havido crime de genocídio contra os yanomami, o qual está sendo apurado com celeridade pelo governo federal. “O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, já determinou a abertura de inquérito policial para apurar o crime de genocídio e crimes ambientais na Terra Indígena Yanomami, em Roraima. Quatro deputados federais do PT ainda protocolaram uma representação criminal na Procuradoria-Geral da República contra Jair Bolsonaro, a ex-ministra Damares”, sustentou. Em entrevista à coluna, o porta-voz do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) deslindou alguns pontos importantes sobre a crise dos yanomami e descreveu as ações do governo federal para solunioná-la.

Leia abaixo:

Rodolfo Capler – O governo decretou situação de emergência em saúde por conta da situação dos indígenas yanomami. Que medidas concretas serão tomadas a partir de agora pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI)?

Eloy Terena, do Ministério dos Povos Indígenas – O principal papel do ministério dos povos indígena é articular e promover a política indigenista. Então, desde a primeira semana de governo, a ministra Sonia Guajajara envidou esforços para articular uma força tarefa em prol do povo Yanomami. Num primeiro momento,  foi articulado junto ao ministério da saúde a decretação da situação de emergência sanitária e envio de força tarefa do SUS. Quando a equipe de saúde chegou ao local, constatou a situação de extrema vulnerabilidade. Quando recebemos as primeiras fotos enviadas vimos que a situação necessitava de uma ação enérgica do Estado e que deveria envolver mais de um ministério. Foi então que a ministra Sonia Guajajara levou ao conhecimento do presidente Lula e solicitou a criação de um Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária das populações em território Yanomami, coordenado pela Casa Civil  da Presidência da República e com a participação do Ministério dos Povos Indígenas, Ministério da Saúde, Ministério da Defesa, Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome e Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. A primeira ação concreta foi a visita ao território onde começaram a ser entregues cerca de cinco mil cestas básicas aos indígenas, além da assistência médica de emergência. Além disso, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, já determinou a abertura de inquérito policial para apurar o crime de genocídio e crimes ambientais na Terra Indígena Yanomami, em Roraima. Quatro deputados federais do PT ainda protocolaram uma representação criminal na Procuradoria-Geral da República contra Jair Bolsonaro, a ex-ministra Damares, os ex-presidentes da FUNAI Franklimberg Ribeiro de Freitas e Marcelo Xavier por suspeita de crime de genocídio contra os povos yanomami.

Rodolfo Capler – Como o MPI sente toda essa situação?

Eloy Terena – É triste ver nossos parentes Yanomamis numa situação tão cruel de abandono total por parte do poder público. Nós, indígenas, temos uma relação de reciprocidade com a natureza, usamos o rio para banho, pesca e precisamos da mata para nossa medicina e caça. A      contaminação dos rios pelo mercúrio utilizado nos garimpos ilegais provoca uma série  de  doenças e impactos sanitários aos povos indígenas e saber que a negligência e incentivo do governo anterior fez com que essa situação chegasse a este ponto, é revoltante. É urgente a retirada de invasores de terras e a desintrusão de garimpeiros para a proteção dos nossos territórios, perpetuação da nossa cultura e manutenção do nosso bem viver. 

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Rodolfo Capler – Qual é o grau de culpabilidade do governo Bolsonaro no desencadeamento dessa crise humanitária?

Eloy Terena – O ex-presidente Jair Bolsonaro já disse por diversas vezes que se orgulha de ter “sangue garimpeiro”, que foi garimpar na Bahia ainda em seus tempos de Exército e que seu pai esteve em Serra Pelada. Com isso ele cumpriu várias de suas promessas de campanha como não demarcar nem um centímetro de terra indígena, de “dar uma foiçada” no pescoço da Funai, que em seu governo foi escalada para perseguir lideranças indígenas, e colocar o MME, o Ministério do Meio Ambiente e a Agência Nacional de Mineração a serviço de garimpeiros. Dados atualizados divulgados pelo Mapbiomas confirmam que o garimpo ilegal em terras indígenas aumentou 632% de 2010 a 2021. Em 2021 o garimpo registrou a maior expansão em 36 anos, devorando 15 mil hectares num único ano. As três terras indígenas mais afetadas ocuparam exaustivamente as manchetes nos últimos anos: Kayapó, com 11.542 hectares invadidos, Munduruku, com 4.743 hectares, ambas no Pará e a TI Yanomami, com 1.556 hectares garimpados, em Roraima. Lideranças indígenas dessas TI’s e organizações como a APIB se reuniram com o governo anterior e fizeram diversas denúncias solicitando ajuda do governo federal para coibir e punir o crime organizado, no entanto, todas as  denúncias foram ignoradas pelo ex-presidente. Além disso, é preciso lembrar que a responsabilidade de Jair Bolsonaro está fartamente documentada, bastando lembrar que em 2020, o STF determinou a elaboração de um plano de contenção de invasores para a terra Yanomami, em 2021 a Comissão Interamericana de Direitos Humanos deferiu cautelar determinando a proteção desses povos e o caso chegou ao Tribunal Penal Internacional (TPI).

Rodolfo Capler – Quais são as principais necessidades do povo Yanomami?

Eloy Terena – Houve uma fragilização do sistema de saúde nas comunidades indígenas, com o abandono de postos de saúde em regiões sob controle dos garimpeiros, bem como a ocupação    de pistas de pouso comunitárias pelo garimpo. Neste momento de crise, as necessidades urgentes são a assistência médica com qualidade e segurança, pois hoje a TIY vive a escassez de mão de obra especializada. Foram mapeadas cerca de 60 vagas em aberto nas unidades de assistência médica da aldeia (33 vagas para técnicos de enfermagem, 12 vagas para enfermeiros e 19 vagas para médicos), porém há dificuldade em ocupar estas vagas devido à insegurança causada pela presença de garimpeiros. Além do atendimento hospitalar emergencial, há ainda os casos de desnutrição, que devem ser atendidos através da garantia de alimentação aos parentes.

Rodolfo Capler – O problema com os Yanomami já acontece há alguns anos. Por que ele ganhou essa dimensão nacional só agora? 

Eloy Terena – O povo indígena Yanomami, um dos primeiros a ter os direitos sobre seus territórios reconhecidos pelo Estado após a aprovação da Constituição em 1988, atravessa o que pode ser considerada a pior ameaça desde a homologação da Terra Indígena, que completou 30 anos em 2022. Nós temos um caso de uma crise humanitária com repercussão no Brasil e no mundo que agravou-se por omissão, leniência e irresponsabilidade das autoridades brasileiras      em diferentes níveis e isso precisa ser investigado. Nos últimos 4 anos o número de casos de malária no DSEI Yanomami passou de 9.928 em 2018, para 20.393 em 2022, o que representa um aumento de mais de 105%. Em relação aos óbitos, entre 2018 e 2022, o maior registro de óbitos ocorreu em 2020, total de 332

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Rodolfo Capler – De que modo o garimpo ilegal infundiu essa crise?

Eloy Terena – Nos últimos anos o garimpo vem sendo favorecido por políticos e empresários que investem no garimpo próximo a terras indígenas. A presença desses garimpeiros por si só já é  uma violação ao direito dos indígenas que devem usufruir de seus territórios de maneira livre e sem ameaças. Mas é preciso lembrar que esses territórios contam com a presença de povos isolados e de recente contato e, que estes agentes criminosos, são disseminadores de doenças nas comunidades, haja vista a vulnerabilidade epidemiológica desses indígenas. Além disso, a atividade do garimpo leva todo tipo de malefício para as terras indígenas como contaminação da água, doenças como malária e violência contra mulheres e crianças indígenas.

Rodolfo Capler – Qual mensagem a situação dos Yanomami emite para o Brasil e para a comunidade internacional?

Eloy Terena – A exploração desses territórios, que ocorreu pela leniência do governo Bolsonaro nos últimos anos, evidenciou a falta de comprometimento com sustentabilidade ambiental, com danos sanitários às comunidades e a escalada de violência e morte nos territórios. Agora o Brasil precisa recuperar sua imagem perante a comunidade internacional, que foi tão desgastada com a péssima política do governo anterior.

* Rodolfo Capler é colaborador desta coluna, autor do livro “O páis dos evangélicos (2022)” e pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo/PUC-SP

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