“O futebol ficou manchado”, diz presidente de time vítima de quadrilha
Fábio Pizzamiglio, do Juventude, viu quatro de seus jogadores integrarem grupo que manipulava jogos
Após ver quase metade de um time titular envolvido com a quadrilha que manipulava partidas de futebol para lucrar com apostas esportivas, o presidente do Esporte Clube Juventude, de Caxias do Sul (RS), Fábio Pizzamiglio, cuja equipe disputa a Série B do Brasileirão, é hoje um homem que se sente frustrado e enganado. Os jogadores Paulo Miranda, Moraes, Vitor Mendes e Gabriel Tota, que estiveram na campanha de 2022 na Série A, são alguns dos investigados pelo Ministério Público de Goiás. Desses, Miranda e Moraes se tornaram réus e vão responder a uma ação penal.
Desde que o caso eclodiu, com a divulgação por VEJA de conversas e detalhes da investigação, Pizzamiglio diz que seu clube, vítima na história, estava em vias de assinar um patrocínio, que viria em boa hora. Mas o negócio fez água. A alegação da empresa para colocar o assunto no banco de reservas foi que o segmento ficou abalado com as denúncias. A reportagem apurou no mercado que o acordo seria de cerca de 1 milhão de reais por oito meses de exposição da marca.
Confira a entrevista com Fábio Pizzamiglio.
Como o senhor se sentiu ao saber que quatro de seus jogadores estavam envolvidos no maior esquema ilegal dos últimos anos no futebol brasileiro? Sinto uma revolta pelo trabalho que venho fazendo, por tudo a que eu me dedico. O que aconteceu é revoltante. Começo a repensar se vale a pena estar no meio. O futebol ficou manchado, não por culpa nossa, das empresas de aposta ou da CBF. Mas ficou. E mais uma vez.
Quando o clube descobriu o esquema? Tudo o que sabemos é pela imprensa. Não temos informações oficiais. De todos os envolvidos, temos vínculo com um jogador apenas, o Totta, que está no Ypiranga (RS). Parte do passe dele é nosso, o restante é do Mirassol (SP).
O Juventude foi rebaixado no ano passado. O senhor acredita que se não houvesse a participação de quatro jogadores no esquema a história poderia ser outra? O ano passado foi muito sofrido. É sempre muito difícil se manter na Série A. Passamos quase todo o campeonato na beira. Houve alguns casos de pênaltis e cartões duvidosos. Isso poderia nos ter dado um final diferente. O fato é que estamos colhendo as derrotas do ano passado até hoje.
Quais outros prejuízos o Juventude colhe com a manipulação dos resultados de diversos jogos? Não só nós, como vários outros times. No nosso caso, assinaríamos um contrato de patrocínio ontem, mas a empresa, em cima da hora, pediu para esperar mais um pouco, para saber como o mercado vai se portar. Seria nosso segundo patrocínio mais importante.
Pretende buscar a Justiça? No caso de condenação dos jogadores, sim. Até pelo patrocínio que perdemos e podemos perder adiante. Nossa imagem ficou muito vinculada ao escândalo.
Ficou vinculada mesmo a instituição sendo vítima na história? Quem entende e vai a fundo, vê que o clube é vítima. Mas quem pega a notícia por cima acaba misturando as coisas. Acaba tudo sob suspeita. Se for acompanhar as redes sociais, um mundo sem lei, tem torcedor que acha que o clube participou, ou as casas de apostas.
Como o senhor tratou com os jogadores atuais depois da divulgação das denúncias? Quando o assunto começou a surgir, havíamos reunido os atletas e deixado clara a posição do clube. Pregamos tolerância zero de casos assim e falamos que se houvesse suspeita o atleta seria afastado. A maioria se sente revoltada e os jogadores são vítimas também.
Os árbitros, pelo menos por ora, não estão vinculados aos esquemas. Acredita que eles ficarão com medo de errar daqui em diante? Não só eles, como todos. Qualquer erro de jogador, de passe, um cartão necessário que precisa ser feito para frear uma jogada, vai passar a ser visto com desconfiança. Vai gerar dano, com certeza.