Justiça manda três ex-agentes da ditadura pagarem R$ 1 milhão por tortura
Decisão foi proferida pela 7ª Vara Cível Federal de São Paulo contra ex-delegados do DOI-Codi -- ainda cabe recurso
Em uma decisão pouco comum na Justiça, a juíza Diana Brunstein, da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo, acolheu o pedido do Ministério Público Federal (MPF) e condenou os ex-delegados Aparecido Laertes Calandra, David dos Santos Araújo e Dirceu Gravina, acusados de tortura e mortes durante a ditadura militar, a pagar indenização de 1 milhão de reais, cada um, a título de dano moral coletivo.
Na sentença, a juíza destaca que o pedido do MPF apresenta um relato detalhado da atuação comprovada dos três em atos de tortura e homicídio que aconteceram no Destacamento de Operações e Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo, “bem como as graves violações de direitos humanos supostamente praticadas pelos corréus pessoas físicas em relação a cada uma das vítimas citadas”.
Entre as vítimas dos delegados estavam, por exemplo, o jornalista Vladimir Herzog, morto em 1975, e Aluizio Palhano Pedreira Ferreira, cujos restos mortais foram desenterrados em dezembro de 2018, na vala de Perus — até hoje, ele é o caso mais recente de desaparecido político encontrado.
Além disso, Calandra, Araújo e Gravina estão na lista de acusados de crimes na ditadura elaborada pela Comissão Nacional da Verdade em seu relatório final, de 2014.
Em sua decisão, Brunstein também usou o argumento de que crimes contra a humanidade são imprescritíveis. A justificativa corrobora com decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), mas ainda encontra resistência no Judiciário brasileiro.
Dá para dizer que a juíza faz parte de uma minoria que considera contra a humanidade os crimes cometidos na ditadura. Na grande maioria dos casos julgados, a prescritibilidade prevalece porque o crime não se encaixaria nessa categoria. Além disso, também são vários os processos em que os réus são absolvidos com base na Lei da Anistia, de 1979, por mais que ela seja considerada inconstitucional pela CIDH e questionada pelo MPF. O STF já teve a chance de revisá-la, em 2012, mas preferiu mantê-la.
É por isso que nunca um acusado de crime na ditadura foi condenado em última instância. Em todos os casos onde houve condenação em primeira instância (como este determinado por Brunstein), o réu entrou com recurso e foi absolvido por uma instância superior.
O único processo envolvendo um acusado de crime na ditadura que chegaria na condenação em última instância foi o de Átila Rohrsetzer, que correu na Justiça italiana. No entanto, Rohrsetzer morreu meses antes da sessão que o condenaria, o que encerrou o processo.
No caso do trio de ex-delegados, ainda cabe recurso de ambas as partes, o que sugere que o processo irá se arrastar a instâncias superiores.