A Justiça Terapêutica pede espaço no Brasil
A Justiça Terapêutica, que busca dar atendimento adequado a presos com doenças mentais ou dependência química dentro do sistema carcerário, ainda é rara
Recentemente, o país ficou chocado com as notícias de crimes sexuais que ocorreram em São Paulo. Um deles é o do ajudante geral Diego Ferreira de Novais, de 27 anos, preso após se masturbar e ejacular em uma mulher dentro de um ônibus na capital paulista. O criminoso foi solto no dia seguinte pela justiça, após a realização de uma audiência de custódia. Porém, Diego foi preso novamente dias depois e indiciado por estupro, acusado de esfregar o pênis no ombro de uma mulher e impedir sua fuga. O delegado responsável pelo caso requisitou a instauração de incidente de insanidade mental e afirmou em entrevistas que Diego representa um risco para a sociedade.
Neste caso, estamos falando de um homem com 17 passagens pela polícia, incluindo quatro prisões por estupro e outras 13 por importunação ofensiva ao pudor e ato obsceno, fato que nos obriga a refletir sobre o seguinte assunto: a justiça brasileira lida da melhor forma possível com este tipo de criminoso? Lembremos que Diego foi liberado após cometer o primeiro ato citado acima, mesmo com diversas passagens pela polícia por motivos similares.
O exemplo americano
Sem eximir de forma alguma o criminoso ou minimizar a gravidade de seu ato, do ponto de vista de saúde é preciso paralelamente avaliar também o que está por trás de seu comportamento. Será que esse infrator realmente apresenta algum tipo de doença mental, como acredita a polícia? Se sim, como proceder? Este é um tema polêmico, sem sombra de dúvidas. Para lidar com esse tipo de ocorrência, diversos países, como os Estados Unidos, já adotaram as Mental Health Courts e Drug Courts, algo como Tribunais de Saúde Mental e Tribunais de Drogas.
Nos casos encaminhados aos Tribunais de Saúde Mental, são realizadas avaliações médicas para a definição da pena e, caso seja necessário, de um plano de tratamento e monitoramento judicial dos criminosos. Uma medida que prioriza a segurança da sociedade, ao mesmo tempo em que avalia a saúde mental dos infratores, procurando tratar também problemas que contribuam para a ocorrência da conduta criminal.
Os Tribunais de Drogas têm objetivo similar. Também contando com avaliações de profissionais de saúde, eles oferecem a possibilidade de uma sentença combinada com tratamento para infratores usuários de drogas, com possíveis transtornos mentais.
Estes projetos são exemplos claros de como a justiça pode agir para evitar o simples encarceramento de portadores de doenças mentais ou dependentes químicos e tornar a sociedade mais segura em um futuro próximo, ajudando os transgressores em sua reabilitação e ressocialização, ao tentar identificar e tratar possíveis causas de comportamentos criminosos. Para isso, a união entre os sistemas de saúde e judiciário é fundamental.
Como funciona no Brasil
No Brasil, possuímos uma medida similar, conhecida como Justiça Terapêutica, aplicada, principalmente, para infratores com dependência química. Após uma criteriosa seleção de casos, a iniciativa prevê a inclusão destes em programas de tratamento, determinados após audiências individuais com os usuários, que são monitorados e têm sua reabilitação acompanhada pela justiça. Tal medida é viabilizada pela lei dos Juizados Especiais Criminais, que possibilita acordos propostos por promotores de justiça.
O que projetos como esses promovem é o devido destino aos infratores portadores de doenças mentais ou dependência química dentro do sistema de justiça criminal, com tratamento e serviços de recuperação adequados, ao mesmo tempo em que busca garantir a segurança da população de forma mais resolutiva e duradoura.
Desafios
O problema é que, apesar de ser prevista por lei, tal ação ainda é rara em nosso país. O parágrafo 7 do artigo 28 da lei federal 10.216, de 2001, prevê que “o juiz determinará ao Poder Público que coloque à disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado”. Porém, quantos encaminhamentos do tipo realmente acontecem na prática? Este é o x da questão, no caso do Brasil.
Pela perspectiva da saúde, apenas prender este tipo de criminoso não soluciona o problema, já que ao sair da prisão, a chance de voltar a cometer o mesmo tipo de crime é enorme. Já uma pena que, além das sanções previstas por lei, também preveja tratamento, reabilitação do cidadão e permita assim sua reinserção na sociedade se mostra uma solução muito mais eficaz, inclusive a longo prazo.
O caso de Diego Novais aparenta ser mais um, dentre tantos outros, que poderia ter um final diferente: com o tratamento e ao menos a chance de reabilitação de um infrator acometido por uma doença mental, e uma sociedade mais segura, protegida por suas instituições públicas.
Quem faz Letra de Médico
Adilson Costa, dermatologista
Adriana Vilarinho, dermatologista
Ana Claudia Arantes, geriatra
Antonio Carlos do Nascimento, endocrinologista
Antônio Frasson, mastologista
Artur Timerman, infectologista
Arthur Cukiert, neurologista
Ben-Hur Ferraz Neto, cirurgião
Bernardo Garicochea, oncologista
Claudia Cozer Kalil, endocrinologista
Claudio Lottenberg, oftalmologista
Daniel Magnoni, nutrólogo
David Uip, infectologista
Edson Borges, especialista em reprodução assistida
Fernando Maluf, oncologista
Freddy Eliaschewitz, endocrinologista
Jardis Volpi, dermatologista
José Alexandre Crippa, psiquiatra
Ludhmila Hajjar, intensivista
Luiz Rohde, psiquiatra
Luiz Kowalski, oncologista
Marcus Vinicius Bolivar Malachias, cardiologista
Marianne Pinotti, ginecologista
Mauro Fisberg, pediatra
Miguel Srougi, urologista
Paulo Hoff, oncologista
Paulo Zogaib, medico do esporte
Raul Cutait, cirurgião
Roberto Kalil, cardiologista
Ronaldo Laranjeira, psiquiatra
Salmo Raskin, geneticista
Sergio Podgaec, ginecologista
Sergio Simon, oncologista