Prazo costuma ser fonte de inspiração. Líderes do MDB, PSDB e Cidadania intensificaram viagens e reuniões no eixo São Paulo-Brasília, nos últimos dias, à procura da saída do labirinto em que se meteram na construção de candidatura alternativa às de Lula e de Jair Bolsonaro, líderes nas pesquisas eleitorais.
À espera desse lampejo, combinaram um jantar em Brasília, ontem, com João Doria, ex-governador paulista que venceu as prévias para a candidatura presidencial do PSDB.
Muitos veem Doria como candidato-problema, porque patina em quarto lugar nas pesquisas, ainda distante do patamar desejado — em torno de 10%.
Ele tenta convencê-los de que é o candidato-solução, com propostas coerentes para um eleitorado empobrecido e insatisfeito com o governo de dois dígitos (10,5% de inflação, 11,1% de desemprego e 12,7% de juros).
O trunfo de Doria, por enquanto, é a vitória nas prévias. A dificuldade comum do PSDB, Cidadania e MDB é o prazo para construir a idealizada candidatura alternativa, da terceira via ou do centro democrático. Sobram identidades, faltam intenções de votos nas pesquisas que indicam uma disputa apertada.
O tempo corre. Seis em cada dez eleitores, informam as pesquisas, já teriam escolhido um candidato — Lula na frente, Bolsonaro em segundo e Ciro Gomes em terceiro.
A disputa ocorre num ambiente contaminado por uma retórica política destrutiva, combinada ao estímulo à descrença no processo eleitoral e à desobediência civil, fomentadas por Bolsonaro.
O relógio marca o prazo, cada dia mais curto. Há quem entreveja um fiasco logo adiante. É o caso de Antonio Brito, ex-governador do Rio Grande do Sul.
Semana passada, numa diante de uma plateia do MDB, PSDB e Cidadania, pegou o microfone e foi direto na autocrítica: “Estamos a algumas semanas de cometer um ato de vilania, covardia e estupidez, que é deixar o país sem opção.”
“Lembro de quando era constituinte [em 1988]” — prosseguiu. “A gente sonhou, sonhou apanhando, em construir democracia. A gente avançou como democracia. Depois, a gente sonhou que democracia trazia justiça. Erro grave, porque ela sozinha não traz justiça. Falhamos e fracassamos terrivelmente, porque a gente virou essa expressão horrorosa chamada centro democrático, que, pra mim, no mundo da gastronomia, é sopa de chuchu. Eu não sei o que quer dizer centro democrático.”
Acrescentou: “Só houve uma vez na nossa geração onde a gente conseguiu falar a linguagem do brasileiro: foi na hora do [Plano] Real [em 1994]. Em todas as outras horas, a gente falou uma linguagem intelectualizada, racional, correta, patriótica, honesta, séria, sensível, mas que não era popular. E o que a gente está colhendo agora é o fracasso em ter opções populares sensatas, ou opções populares racionais, ou opções populares não fanatizadas. Nós erramos. Todos.”
O ex-governador gaúcho se expôs na angústia comum à centena de políticos e ativistas que o escutavam em apertado auditório. Foi aplaudido por ter posto o dedo na ferida.
Há meses, quatro em cada dez eleitores repetem nas pesquisas que ainda não escolheram candidato. E três deles persistem na rejeição a Lula e Bolsonaro. No entanto, os líderes políticos da candidatura alternativa, da terceira via, do centro democrático ou da sopa de chuchu, não conseguem entrar em sintonia com esse bloco de eleitores.
O tempo voa no calendário eleitoral. O prazo é curto, e o fracasso vai custar caro. Para todos.