Grandes novidades na reunião eleitoral do PT de Lula
Depois de 17 meses de campanha e de 346 dias do terceiro governo, o PT fez uma opção preferencial na lista das suas razões existenciais
Depois da Conferência Eleitoral do PT, no fim de semana em Brasília, um dirigente do partido telefonou a um amigo. Antes que conseguisse dizer qualquer coisa, escutou a provocação:
— E aí, novidades?.
— Claro que sim — ele retrucou, salivando o habitual cinismo. — No PT nunca falta novidade
— Tá, e qual é?
— São duas. E das grandes.
— Conte tudo.
– A primeira é a questão interna. O PT de Lula não gosta do governo do PT de Lula.
— Ah, mas isso é coisa antiga — disse o outro, rindo. — Você sabe, é assim desde 2003, ou melhor, desde a campanha de 2002. Que mais?
— Jair Bolsonaro.
— Como?
— É isso mesmo: Bol-so-na-ro — repetiu com ênfase nas quatro sílabas. Até ensaiou a pronúncia do nome ao contrário (“Oranoslob”). Atropelou-se, desistiu e explicou:
— Na maior parte do tempo só se falou dele. Quase nem sobra tempo pro PT de Lula falar mal do governo do PT de Lula. Quem salvou foi o [Fernando] Haddad.
O ministro da Fazenda foi duramente criticado pela condução da política econômica, pelos acordos com o Centrão e por todos os pecados que, originalmente, seriam atribuíveis a Lula, reconhecido no PT como verdadeiro ministro da Fazenda e negociador das alianças com partidos do Centrão. Porém, Lula no PT tem fama de infalível, então… sobrou Haddad.
Desligado o telefone, o amigo do dirigente petista deu-se por satisfeito com as explicações sobre a primeira “novidade”, a do PT de Lula não gostar do governo do PT de Lula. Mas continuou intrigado com a segunda, “Oranoslob” na tentativa trôpega de pronúncia reversa.
Resolveu analisar duas peças relevantes da Conferência Eleitoral do PT: a proposta de resolução do grupo “Construindo um Novo Brasil”, hegemônico no partido, e o discurso da presidente Gleisi Hoffmann. Eis as principais conclusões:
1) O grupo produziu um documento político concedendo a “Oranoslob” quase tanta atenção quanto atribuiu a Lula.
Num texto com pouco mais de 1.800 palavras destacou o adversário — que está inelegível — com nada menos que sete citações nominais, e outras dez indiretas (“ultraliberal”, “extrema-direita”, “governo anterior”).
Lula comanda o grupo “Construindo um Novo Brasil” há décadas. Dele, mereceu dez referências nominais, acompanhadas dos habituais elogios em profusão por liderar tudo, todos e todas sempre “com muito êxito”;
2) Gleisi Hoffmann, presidente do partido e integrante dessa fração petista, usou 1.400 palavras. Nomeou Bolsonaro oito vezes, sem contar as citações indiretas. Reservou seis menções a Lula, sempre laudatórias à “sua capacidade de dirigir”.
Em resumo, depois de 17 meses de campanha eleitoral (contados desde a segunda-feira 8 de março de 2021, quando o STF tornou Lula elegível), e de 346 dias do terceiro governo, o PT fez uma opção preferencial: fixou “Oranoslob”, nascido Jair Messias Bolsonaro, no topo da lista das suas razões existenciais.