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Crise da ditadura venezuelana deixa Lula imobilizado e sob forte pressão

O colapso da cleptocracia chavista e o risco de uma guerra civil mostram a Lula que esperança não é estratégia. Principalmente, na política externa

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 ago 2024, 03h57 - Publicado em 6 ago 2024, 08h00
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  • A dimensão da crise da Venezuela incomoda e surpreende Lula, que está sob pressão inédita e crescente. Isso ficou claro em três momentos desta segunda feira, 6.

    Num telefonema, o presidente da França, Emmanuel Macron, pediu-lhe ênfase na contenção do regime ditatorial venezuelano, que não admite a derrota nas urnas e avança na repressão aos adversários — a ONG Foro Penal, de Caracas, contabilizou 1.010 prisões e 23 mortos em sete dias, desde a eleição presidencial (no domingo, 28).

    Na sequência, divulgou-se uma carta subscrita por trinta ex-chefes de Estado e de governo da Espanha e de países da América Latina. Eles incentivaram Lula a “reafirmar seu inquestionável compromisso com a democracia e a liberdade, as mesmas de que gozam seu povo, e a fazê-las prevalecer também na Venezuela”.

    Lula estava em Santiago, onde passou o dia na companhia do presidente chileno, Gabriel Boric. O Chile foi um dos alvos da ditadura da Venezuela, que resolveu romper relações com o país governado por Boric e outras sete nações latino-americanas que cobraram transparência nos resultados eleitorais (nesta segunda-feira, o ditador Nicolás Maduro anunciou “rompimento de relações” com o WhatsApp; ele não esclareceu se pretende continuar a manter “relações” com os aplicativos Windows e Safari).

    Boric tem 40 anos a menos que Lula — nasceu em 1986, quando o petista organizava sua primeira campanha presidencial. Integra um movimento de renovação da esquerda avesso aos dogmas da Guerra Fria, ainda preservados por segmentos de partidos latino-americanos como o PT.

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    Numa reunião em Brasília, em maio do ano passado, Boric contestou Lula, que acabara de estender tapete vermelho e louvar o ditador Nicolás Maduro com honras de Estado. O presidente brasileiro, na época, relativizou o regime venezuelano. Abstraiu uma década de prisões de opositores e a adoção de tortura e assassinato como sistema de repressão, assim como o desastre social que levou milhões ao êxodo — o Chile recebeu mais de 50 mil imigrantes. “Narrativa”, minimizou Lula. Boric retrucou: “Não é narrativa, é realidade”.

    Nesta segunda-feira, Boric ouviu Lula mencionar a Venezuela em discurso: “O respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados (da eleição presidencial). O compromisso com a paz é o que nos leva a conclamar as partes ao diálogo e promover o entendimento entre governo e oposição”. O presidente do Chile preferiu adiar seus comentários para depois da visita do presidente brasileiro.

    Lula está numa situação delicada. Atravessou as últimas duas décadas jogando seu peso, influência e credibilidade num esforço permanente para resgatar a ditadura chavista do isolamento. Era presidente eleito, em dezembro de 2002, quando fez a primeira intervenção, a pedido de Fidel Castro, que viria à sua posse: apelou ao então presidente Fernando Henrique Cardoso para socorrer Hugo Chávez com uma carga de combustível da Petrobras.

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    Foi a forma que encontrou para garantir protagonismo na mediação com Chávez e, depois, com Maduro. O bônus projetado seria o do reconhecimento externo da sua liderança regional, com reflexos naturalmente favoráveis na política doméstica.

    Durante esses 20 anos, aparentemente, não se preparou para a possibilidade de uma crise extrema, um colapso do regime em cenário de rebelião como está acontecendo, com consequências políticas, econômicas e de segurança potencialmente graves para o Brasil e toda a América do Sul.

    A pressão inédita e crescente, dentro e fora do país, incomoda e surpreende Lula porque se vê imobilizado diante de fatos consumados — o derretimento da ditadura e o risco de uma guerra civil. Resta-lhe torcer e esperar que a crise desague em alguma forma de paz, ainda que na instabilidade.

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    Diante de Boric, em Santiago, ele mostrou confiança de que, miraculosamente, algo bom acontecerá. E citou Pablo Neruda em 1971 ao receber o Nobel de Literatura: “Nossas estrelas primordiais são a luta e a esperança, mas não há lutas nem esperanças solitárias”.

    O colapso da cleptocracia chavista está mostrando a Lula que esperança não é estratégia. Principalmente, na política externa.

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