Paulo Guedes, ministro da Economia, entendeu que foi posto na frigideira, acham seus aliados dentro e fora do Congresso.
Os cozinheiros em destaque são Arthur Lira, presidente da Câmara, e Ciro Nogueira, chefe da Casa Civil de Jair Bolsonaro.
Vista das janelas do Congresso, a paisagem mostra um presidente refém dos chefes do partido que é a locomotiva de um agrupamento com duas centenas de votos no plenário da Câmara e guardião de 136 pedidos de impeachment mantidos na gaveta de Lira.
Dos janelões do Palácio do Planalto, o panorama é um pouco diferente: Bolsonaro cooptou a dupla Lira e Nogueira, deu-lhes relativa autonomia sobre uma fatia bilionária do Orçamento (cerca de R$ 17,5 bilhões), garantiu apoio e imunidade no jogo parlamentar, e os tornou sócios na campanha à reeleição.
Nessa empreitada sobrou Guedes, ministro-conselheiro, talvez o único brasileiro em 2017 a apostar nas chances de eleição de Bolsonaro, numa fase em que o candidato imaginava se candidatar para ajudar a eleger os filhos parlamentares, perder e curtir a vida com dupla aposentadoria, como capitão do Exército e deputado federal.
Bolsonaro não moveu palha em defesa do seu ministro da Economia, convocado à Câmara para dar explicações sobre uma empresa que mantém no paraíso fiscal das Ilhas Virgens britânicas.
O investimento foi exposto uma semana atrás pelos repórteres Allan de Abreu e Ana Clara Costa, na revista Piauí, na série de reportagens coordenadas pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), com participação do Poder360, Metrópoles e a Agência Pública.
Bolsonaro sabia desde 2018, assim como a Comissão de Ética da Presidência da República. Líderes do Centrão também sabiam. Por razões diferentes, alguns deles até desfrutam de intimidade com negócios em paraísos fiscais, como indicam múltiplos inquéritos sobre corrupção na Petrobras e transações obscuras com empreiteiras.
Guedes percebeu a temperatura subindo. Sobre ele, Bolsonaro tem se limitado a mencionar, em público, conversas nas quais o teria aconselhado considerar “o viés político” — como disse na sexta-feira em Campinas. Faltou definir o “viés político”.
O presidente, na prática, deixou os associados do Centrão sitiarem o seu ministro da Economia. Por coincidência, isso aconteceu na sequência de conversas de Bolsonaro com o presidente da Câmara e o chefe da Casa Civil sobre a campanha eleitoral de 2022.
Lira e Nogueira ofereceram, e Bolsonaro aparentemente aceitou, a candidatura presidencial pelo Progressistas (PP), com uma fatia do fundo eleitoral (R$ 140 milhões) e uma agenda econômica alternativa para 2022, com um “Custo Bolsonaro” além dos limites imaginados no Ministério da Economia.
Nela está embutido o “viés político” que Bolsonaro gostaria que Guedes aceitasse: uma intervenção de Lira e Nogueira na condução política econômica com foco na reeleição.