Boatos nas escolas impulsionam a regulação das redes sociais
A manipulação anônima do horror coletivo, via internet, está produzindo inédita cobrança de respostas dos governos, do Legislativo e do Judiciário
Vai ser uma quinta-feira tensa, com expectativa de alta na abstenção escolar em vários estados. É o resultado de uma onda de boatos difundidos em redes sociais, nos últimos quinze dias, anunciando para hoje hipotéticos atos de barbárie nas escolas.
É novidade relevante. A manipulação anônima do horror coletivo via internet, a partir da tragédia no início do mês numa creche em Santa Catarina, está produzindo inédita reação social e política, em crescente mobilização de organizações civis na cobrança de respostas dos governos, do Legislativo e do Judiciário.
Governantes não escondem a aflição, porque não se conhecem fórmulas para lidar com ondas de pânico criadas na lógica do mundo virtual.
“Eu não tenho solução definitiva para esse caso”, disse Lula na terça-feira em reunião sobre segurança nas escolas com representantes do Congresso, do Judiciário, governadores e prefeitos.
Dias antes, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, chamara a atenção para a necessidade de construção de alternativas a partir do ambiente escolar e comunitário, em ações organizadas com os governos.
Uma dimensão do problema está refletida em dados coletados pelo Ministério da Justiça.
Um canal criado exclusivamente para receber denúncias de ameaças de atentados em escolas recebeu 7.473 informes nos últimos dez dias. Equivale a 747 por dia, ou 31 por hora — uma denúncia a cada dois minutos.
Foram 1.595 registros específicos (Boletins de Ocorrência) em delegacias policiais nesse período, quase 160 por dia.
Até o início da semana, 225 pessoas haviam sido presas ou “apreendidas”, no jargão policialesco para distinguir suspeitos menores de idade, sob suspeita de abusos nas redes sociais com boatos de atentados em escolas.
Não há necessidade de novas leis criminais, alertou o juiz Alexandre de Moraes, do STF, durante a reunião no Palácio do Planalto. Resumiu: “Tudo que não pode na vida real não pode no mundo virtual.”
O êxito relativo na contenção das fábricas de notícias falsas nas campanhas eleitorais de 2020 e 2022 indica a possibilidade de mudanças.
O governo federal convidou um grupo de especialistas para coletar sugestões de iniciativas político-institucionais.
Há notável sintonia entre Congresso e Judiciário no avanço da regulação das proprietárias de plataformas de redes sociais, que passariam a ser responsabilizadas pelo conteúdo divulgado, como já são as empresas de comunicação.
No Brasil, como no resto do mundo, as companhias donas de plataformas de redes sociais cultivam uma espécie de alergia institucional à regulação e à responsabilidade social. Agora estão numa encruzilhada: ou se engajam nos debates nacionais ou serão reguladas à revelia, o que tende a redundar em prejuízos.
Na quarta-feira (19), por exemplo, lobistas do Google, Meta, Twitter e TikTok batalhavam no Congresso para a adiar a urgência na votação do projeto para uma Lei das Fake News. O texto é inspirado em legislações aprovadas ou em andamento na União Europeia, Austrália, Canadá e nos Estados Unidos.