Landry de Lauzon, nobre cavaleiro templário que está na rota de promoção para grão-mestre do Templo de Paris, vive aquele velho dilema entre carne e espírito: sua ordem exige o voto de castidade, mas ele está apaixonado por Joana, a mulher de Felipe, que é seu melhor amigo. O que complica ainda mais as coisas é que Felipe é rei da França – e Joana é a rainha de quem há tempo ele se desinteressou e que anda meio, digamos, solitária. No meio disso tudo, há cruzadas, a busca pelo Santo Graal, conselheiros ardilosos que sussurram maledicências nos ouvidos reais, papas arrogantes, uma princesa que é uma bisca, um templário invejoso e até um Jedi (Mark Hammill, instrutor dos noviços templários, faz o maior estrago com uma espada de aço mesmo). Há também a inevitável descoberta, no fim da primeira temporada, da traição conjugal, que põe em marcha uma segunda temporada, agora disponível na Netflix, em que o rei apronta horrores porque a testa lhe dói de maneira insuportável. (Para dizer a verdade, a mim pareceu que Felipe estava com ciúme era de de Landry, e não de Joan, mas o roteiro não sabe tirar partido da deixa do ator Ed Stoppard.) Sobre os templários mesmo, a série se resume a retratá-los como homens devotos, heróicos e castos, a serviço de Jesus e nada mais, cuja honestidade impoluta torna-os cegos para as desonestas maquinações alheias. Produzida pelo History, Templários, enfim, é uma aula – de como pegar um ótimo assunto e então fazer dele um programa que, nos melhores momentos, não passa de mediano. No papel de Landry, Tom Cullen não ajuda: é um ator monótono, de quem os espectadores de Downton Abbey devem se lembrar como o partidão que Lady Mary dispensa quando começa a suspeitar que morreria de tédio casando-se com ele.
Criada inicialmente como uma força de proteção aos cruzados que iam a caminho de Jerusalém, no século 11, a ordem dos Cavaleiros Templários foi tão mitificada – pelos próprios Templários, pela imaginação medieval e por romances bons (O Pêndulo de Foucault, de Umberto Eco) e bem menos bons (O Código Da Vinci, de Dan Brown) – que outro mito cimentou-se sobre esse: o mito de que é extremamente difícil separar fato de ficção na história da ordem. Nem tanto assim. Embora os cronistas medievais costumassem ser criativos e com frequência misturassem aos seus registros superstição, adulação aos poderosos e diz-que-diz, há suficiente conhecimento objetivo acerca dos Templários para evitar tanta bagunça com séculos, personagens e fatos como se faz aqui (a certa altura, um personagem cita A Arte da Guerra, de Sun Tzu, que demoraria ainda 500 anos para se tornar conhecida no Ocidente. Errar por pouco é uma coisa; por cinco séculos, é abuso). Sabe-se muito bem, por exemplo, que a ordem rapidamente se tornou uma organização financeira poderosa, e que foi para não ter de pagar as fortunas que devia a eles que Felipe IV perseguiu os templários com tanta fúria, afinal aniquilando-os na sexta-feira 13 outubro de 1307 – consta que é daí que vem a fama de mau agouro das sextas-feiras 13.
Mas, com sua preguiça, Templários primeiro finge não saber tanto quanto poderia. Segundo, e mais grave no caso de uma série que pretende ser empolgante, não raro ela oferece episódios sonolentos. A produção tenta disfarçar os poucos recursos, mas a certa altura não há como esconder que os personagens não saem daqueles mesmos cenários porque não há outros. Para quem quer ação bem bolada e não se importa com uma ou outra invencionice, recomendo então as quatro primeiras temporadas de Vikings, também produzida pelo History (mas com muito mais suingue) e disponível na Netflix. Melhor mesmo, porém, é optar por The Last Kingdom, igualmente na Netflix. Passada na Inglaterra saxônica sob assédio das invasões vikings, The Last Kingdom é adaptada de um escritor que conhece a fundo o assunto de que está falando – o inglês Bernard Cornwell –, é produzida com critério (e com mais dinheiro na segunda e terceira temporadas) e é verdadeiramente empolgante. De quebra, não se desaprende nada ao assisti-la.