Gosto de pensar em intuição como aquilo que no fundo sabemos, sem saber como sabemos. Somos intuitivos quando ouvimos aquela voz interior que, nem sempre pautada só pela lógica, nos diz o que devemos ou não devemos fazer. Ou quando permitimos que aquele friozinho na barriga, que sentimos antes de entrarmos numa trilha inexplorada, se sobreponha à razão ditada pelo cérebro. A intuição assertiva, mais do que dom natural, é uma conquista individual que resulta da experiência acumulada ao longo da vida. E, no entanto, essa nossa faculdade preciosa, lapidada pelo conhecimento, parece perder força num mundo que delega a algoritmos e métricas o poder de tomar decisões.
Sir Alexander Fleming poderia ter desprezado aquele fungo que de repente apareceu em seu laboratório quase um século atrás. Seria o mais racional a fazer. Mas não. Ele preferiu seguir sua intuição, que lhe dizia para estudar aquela colônia de micro-organismos de aparência um tanto asquerosa. O resultado, atribuído ao acaso, foi a descoberta, em 1929, da penicilina, antibiótico que representaria um dos grandes saltos da história da medicina. Muito tempo depois, Steve Jobs, inovador nato e bem-sucedido, percebeu essa dimensão da intuição ao lançar um olhar retrospectivo sobre sua carreira e aconselhar os mais jovens: “Tenha a coragem de seguir seu coração e sua intuição. Eles de alguma forma já sabem o que você realmente quer se tornar”.
Para afastar qualquer associação indevida, é bom esclarecer o que está além, ou aquém, da intuição. Ser intuitivo está mais para a habilidade de abrir espaço no campo da razão para um insight de origem não cerebral. A pessoa intuitiva não age de forma intempestiva. Ela apenas confia na coleção de seus saberes inconscientes, demonstrando capacidade de discernir independentemente do raciocínio, e não em oposição a ele. A relação entre ambos é mais de complementaridade.
Como tudo que é bom, a intuição é algo que deve ser cultivado. Somos todos, em algum grau, intuitivos. Empresários, executivos, artistas, chefs, não há quem considere dispensar, de antemão, a fagulha intuitiva que faz a diferença na hora de optar por um plano de investimento, produzir uma nova obra ou imaginar uma inédita mistura de ingredientes. A diferença é que enquanto alguns se permitem levar a vida estimulados sobretudo por esse conhecimento imediato, outros procuram neutralizar tais ímpetos. Não há certo e errado. Talvez a melhor conduta esteja no meio termo, em que uma pitada de lógica e outra de devaneio levarão ao equilíbrio desejável.
O elogio à intuição também não deve ser confundido com uma crítica à ponderação. Deliberar de maneira impensada, irrefletida, pode ter consequências. Não pode haver mal algum em analisar realisticamente as alternativas disponíveis antes de dar um passo importante. A velha e racional listinha de prós e contras é sempre bem-vinda. A questão é não transformá-la em camisa-de-força, é evitar que o receio natural diante da incerteza do novo comprometa a alegria possível de fazer o que realmente se quer.